Declaração de Salles de ‘passar a boiada’ provoca guerra de anúncios
Depois de ONGs ambientais repudiarem ministro, entidades da indústria e do agro criticam burocracia
são paulo Nos últimos dias, uma espécie de guerra de anúncios tomou conta das páginas dos jornais em razão da declaração do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante a reunião ministerial do dia 22 de abril, que foi divulgada na sexta-feira (22).
“Precisa haver um esforço nosso aqui, enquanto estamos neste momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”, disse Salles, como registrado em vídeo.
No domingo, entidades como Greenpeace e WWF afirmaram em um anúncio de uma página que, “para o ministro do Meio Ambiente, mais de 20 mil mortos são uma oportunidade”.
Nesta terça-feira (26), foi a vez de cerca de 90 entidades, como a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) e a CNI (Confederação Nacional da Indústria), dizerem, também em uma página, que, “no meio ambiente, a burocracia também devasta”.
“Coloquei nos grupos de WhatsApp da Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), que conta com mais de 90 associados, e perguntei quem gostaria de participar”, disse José Carlos Martins, presidente da entidade.
Segundo ele, a adesão ao apoio se deu porque a burocracia do país acaba facilitando a corrupção. “Se tem uma coisa de que eu cansei, é desse povo que vive de parasita em cima de meio ambiente.”
O ministro Ricardo Salles diz que foi consultado pelas entidades na segunda-feira (25) para saber se ele se opunha ao anúncio.
“Obviamente fiquei contente em saber que nós temos apoio, e esse apoio se deve ao reconhecimento de uma necessidade que é inegável, que é uma maior eficiência no Brasil”, diz Salles.
Para ele, as regulamentações brasileiras são irracionais. “É um inferno desde o pequeno, que precisa de licença para ser pipoqueiro, até as grandes obras de infraestrutura. Todo o mundo sofre com essa falta de racionalidade.”
As entidades de ambientalistas discordam da afirmação de Salles.
“O que ele chama de simplificação é um desmonte. Fragiliza a proteção e facilita que obras que tenham prejuíz ao ambiente passe de forma mais fácil”, diz Mariana Mota, especialista de Políticas Públicas do Greenpeace. são paulo Um dos principais articuladores do anúncio desta terça-feira (26), o presidente do Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), José Carlos Martins, diz que a fala de Salles foi “mal dita” e que o foco do ministro era a simplificação.
Por que decidiu apoiar a fala do ministro?
Resolvemos nos manifestar porque não se justifica regressão de tudo o que está andando por causa de uma palavra mal dita do ministro.
Não tem cabimento eu ter uma estrada de paralelepípedo e precisar tirar licenciamento ambiental para asfaltar. É só burocracia e burocracia favorece a corrupção.
O que está andando?
O licenciamento ambiental está dentro do congresso, e com essas palavras do ministro os congressistas podem tentar barrar a votação. A importância no momento é não voltar atrás. Hoje tem uma agenda evoluindo na desburocratização. E, com clareza nas regras, é muito mais fácil. É muito pior deixar uma legislação em área cinzenta. O que tem por trás disso é a preocupação de uma coisa demorada, é vender a dificuldade para cobrar a facilidade.
Qual o impacto da legislação ambiental brasileira na área da construção civil?
O Brasil tem lei, lei complementar, decreto. Tem jurisprudência nas três esferas: municipal, estadual e federal. Sempre haverá alguma coisa conflitando com a outra. Se não simplificar, é impossível trabalhar. Vocês são contra as regras? Não. Nossa crítica é com relação ao tempo, a burocracia. Tem que simplificar os processos sem perder qualidade dentro do objetivo, que é proteger o ambiente. Onde já se viu demorar anos para licenciar tratamento de esgoto? Nem deveria ter que licenciar, estou tratando esgoto. Tudo o que for feito em prol do ambiente tem que ser aprovado muito rápido.
O senhor sabe dizer quanto tempo demora uma licença desse tipo?
Anos. Se uma cidade resolve fazer uma estação de tratamento de esgoto, demora anos para aprovar o licenciamento. Tem cabimento um negócio desse?
O povo se esconde atrás de boas práticas, mas o mundo real é bem diferente. Questionam coisas sem necessidade, para aprovar a construção.
Um loteamento, por exemplo, pode demorar até cinco anos para aprovar o licenciamento. Sempre é enrolado.
Fala foi mal dita, foco é simplificar, diz órgão da construção ENTREVISTA JOSÉ CARLOS MARTINS