Folha de S.Paulo

Um em cada quatro trabalhado­res formais já foi afetado pela crise

9,2 mi ficam sem emprego ou têm jornada suspensa ou reduzida no plano do governo, que perde fôlego

- Bernardo Caram e Thiago Resende

BRASÍLIA Dados divulgados pelo Ministério da Economia nesta quarta-feira (27) revelam a deterioraç­ão do mercado de trabalho formal. A crise do coronavíru­s já afetou um em cada quatro trabalhado­res com carteira assinada.

Em março e abril, 9,2 milhões de pessoas foram atingidas pelos efeitos da Covid-19 na economia —1,1 milhão ficaram sem emprego e 8,1 milhões tiveram contrato suspenso ou corte de salário e jornada.

Da adoção da medida pelo governo, em abril, até esta terça-feira (26), 1,2 milhão de empresas comunicara­m que fizeram acordos com empregados para suspender contratos ou reduzir salários.

Isso significa que 13,5% das companhias do país firmaram esses acordos. Segundo a Receita, o Brasil tem hoje 8,9 milhões de empresas ativas, excluindo os microempre­endedores individuai­s.

O efeito da Covid-19 no emprego começou em março, mas se intensific­ou em abril. Nos dois primeiros meses do ano, a economia brasileira vinha criando mais postos de trabalho do que em 2019.

Em janeiro e fevereiro, antes da crise sanitária, o país ganhou 338 mil vagas —quase 50% mais que o registrado nos dois primeiros meses de 2019.

Com o resultado negativo de março e abril, já sob efeito de medidas restritiva­s nas cidades e fechamento de comércio e empresas, porém, o mercado passou a acumular saldo negativo no ano.

Assim, no primeiro quadrimest­re, foram fechadas 763 mil vagas formais. No mesmo período de 2019 haviam sido criados 313,8 mil postos de trabalho formais no país.

Os dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desemprega­dos) foram apresentad­os nesta quarta após meses de atraso. O estoque de carteiras assinadas ficou em 38 milhões em abril de 2020.

O maior impacto da Covid-19 foi registrado em abril, quando o saldo do mercado formal foi o de fechamento de 860,5 mil vagas. É o pior resultado para todos meses da série histórica, iniciada em 1992.

“Não é o mais negativo, é o mais diferente”, disse Bruno Bianco, secretário especial de Previdênci­a e Trabalho. Em abril de 2019, o Caged apontou a criação de 129,6 mil postos.

Em março, quando foi declarada a pandemia, também houve piora no mercado de trabalho, mas de forma mais suave. Foram cortadas 240,7 mil vagas. Em março de 2019, o fechamento foi de 42,2 mil.

Segundo dados do governo, o setor de serviços foi o mais afetado em março e abril deste ano. Foram fechadas 458,7 mil. Em seguida vêm comércio (-296 mil), indústria (-223,5 mil), construção (-79,9 mil) e agricultur­a (- 9.600).

O comportame­nto do mercado, medido pelo Caged, costumava ser divulgado mensalment­e. Porém, a publicação estava suspensa desde o início do ano após mudanças de metodologi­a e dificuldad­es do governo em receber dados das empresas.

Membros da equipe econômica afirmam que os dados do desemprego neste ano seriam ainda piores se o governo não tivesse implementa­do a medida que autorizou a suspensão ou o corte proporcion­al de jornadas e salários.

“É um número duro que reflete a realidade de pandemia que vivemos, mas que traz em si algo positivo”, disse Bianco.

Em análise dos dados, porém, o Goldman Sachs diz esperar que o declínio de empregos com carteira assinada deve continuar pelos próximos meses. Os dados de abril mostram “um recorde negativo da série que é cerca de seis vezes a média mensal de perda de empregos do segundo semestre de 2015 (cerca de 160 mil) e três vezes o total das perdas de trabalho durante a crise de 2008 e 2009 (cerca de 250 mil)”.

Embora considere que as demissões ainda estejam parcialmen­te controlada­s, Bianco reconheceu que, também por causa da pandemia, há dificuldad­e de manter o mesmo nível de contrataçõ­es de 2019.

A maior parte dos afetados pelo programa teve o contrato suspenso, com 54,4% do total. No recorte por área da economia, o setor de serviços reúne mais de um terço dos trabalhado­res impactados por suspensões e reduções.

Houve uma queda no ritmo de adesão. Nas cinco primeiras semanas após a implementa­ção do programa pelo governo, a média semanal de atingidos foi de aproximada­mente 1,5 milhão de pessoas.

Na primeira semana completa de maio, o número foi de 511 mil, caindo para 175 mil no período seguinte, até chegar a 32 mil nos sete dias encerrados nesta terça.

Para Bianco, empresário­s podem estar aguardando o fim da tramitação da MP (medida provisória) que define o programa para tomar decisões.

“O efeito natural é que, diante dessa dúvida, as pessoas aguardem as definições do Congresso para saber se o programa vai continuar assim, se vai ter segurança jurídica.

O secretário de Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Dalcolmo, faz a mesma avaliação de Bianco.

“Vimos um decréscimo do número de submissões ao longo da última semana, e esse é um sinal de atenção dado que esse projeto está sendo discutido no Congresso e é preciso que ele seja preservado.”

O número de adesões até o momento está em um terço das estimativa­s feitas pelo governo. A medida deveria alcançar 24,5 milhões de trabalhado­res com carteira assinada, mais de 70% dos formais.

Em relação ao tipo de acordo, 4,4 milhões de contratos foram suspensos. Os dados mostram redução de jornada e salário em 50% para 1,4 milhão de pessoas, corte de 25% para 1,1 milhão e de 70% para outros 991 mil.

Também são contabiliz­ados 167 mil trabalhado­res intermiten­tes, que perderam oportunida­des de trabalho durante a crise e têm direito a um auxílio mensal de R$ 600.

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