Folha de S.Paulo

Congresso deve deixar caducar MP de reitores e retaliar Weintraub

Texto, que definia peso maior aos votos de professore­s e envio de lista tríplice por instituto, deve caducar

- Paulo Saldaña e Daniel Carvalho

brasília Na mira do Poder Judiciário após ataques o STF (Supremo Tribunal Federal) e defender “cadeia” para “esses vagabundos”, o ministro Abraham Weintraub (Educação) deve sofrer mais uma derrota no Congresso.

Uma MP (medida provisória) editada no fim de 2019 para mudar a forma de escolha de reitores das instituiçõ­es federais vai caducar na segunda-feira (1º), se não aprovada.

A iminente perda de validade do texto do governo Jair Bolsonaro (sem partido) —não há mais tempo hábil para a apreciação do tema— é uma retaliação da Câmara dos Deputados a Weintraub.

A estratégia reflete o relacionam­ento em ruínas do ministro da Educação com congressis­tas, sobretudo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Se caducar, será a segunda MP de interesse do MEC (Ministério da Educação) derrubada pelo Congresso Nacional. Uma MP tem força de lei, mas precisa do aval do Congresso em até 120 dias.

O primeiro texto criava uma carteirinh­a estudantil digital. O documento foi concebido para esvaziar financeira­mente entidades estudantis, como a UNE (União Nacional dos Estudantes).

Já a MP para a escolha de reitores foi entendida como um ataque à autonomia das universida­des federais. Ambos os textos envolvem pautas de interesse ideológico de Weintraub.

As universida­des têm sido o principal alvo de ataque do ministro. Ele já as associou a balbúrdia, a desperdíci­o de dinheiro e a consumo de drogas —além de manter o discurso de que são dominadas por esquerdist­as.

O texto com a mudança na forma de escolha de reitores esperava a análise do Congresso desde o dia 24 de dezembro. Porém ficou praticamen­te parado.

A comissão chegou a ser instalada. Foram apresentad­as 204 emendas. Os membros do colegiado, contudo, não foram designados, e a última movimentaç­ão na tramitação na Câmara foi em 9 de abril.

“Não houve interesse que o tema avançasse e não há nenhum sinal de que haja mudança nesse sentido”, afirma o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), escolhido para presidir o órgão.

Procurado, o MEC informou que não vai se manifestar sobre a medida provisória.

Congressis­tas e membros do meio acadêmico contrários à medida receberam sinalizaçõ­es de que Maia não patrocinar­ia o tema. A proposta causou reação negativa assim que foi editada.

Entidades científica­s e de representa­ção de reitores das federais criticaram o texto sob o argumento de perda de autonomia e também pela falta de diálogo. A MP foi editada durante o recesso parlamenta­r e nas férias das universida­des federais.

Para João Carlos Salles, presidente da Andifes (que representa os reitores das universida­des federais), aprimorame­ntos na legislação do tema podem ocorrer, mas com debate. “O problema que enfrentame­ntos [com a MP] é uma questão fundamenta­l, que é como garantir que a vontade da comunidade seja respeitada”, afirma ele, que é reitor da UFBA (Universida­de Federal da Bahia).

A MP eliminava a possibilid­ade de uma consulta paritária dentro das instituiçõ­es.

Desse modo, passaria a ser obrigatóri­a uma consulta à comunidade acadêmica em que o peso de voto dos professore­s é de 70% —os votos de servidores técnico-administra­tivos e de estudantes teriam 15% de peso.

A partir do resultado, obtido por média ponderada, uma lista tríplice seria encaminhad­a ao presidente, que tem a liberdade para nomear um dos três nomes.

Essas regras já existiam na legislação, mas várias instituiçõ­es realizam consulta paritária interna e, após a votação, os conselhos universitá­rios (que contam com maior representa­ção de professore­s) constituía­m a lista tríplice de modo a respeitar a vontade da comunidade.

A MP também prevê que o reitor escolha seu vice e os dirigentes das unidades. Até agora, cabe a cada instituiçã­o definir a forma de seleção desses cargos, e a maioria faz votações. O vice também concorria na mesma chapa do reitor, o que foi eliminado pela medida provisória.

O texto represento­u uma mudança maior para os institutos federais, que fazem as eleições e encaminham ao governo apenas um nome. A medida provisória exige que eles também enviassem lista tríplice, o que aumenta a margem de interferên­cia do governo na escolha final.

A Constituiç­ão prevê que, em caso de perda de validade, o Congresso pode editar um decreto legislativ­o para disciplina­r a continuida­de dos atos ocorridos dentro prazo de sua validade.

Caso isso não ocorra, os atos realizados na vigência da MP se conservam.

Dessa forma, os processos eleitorais iniciados desde o início do ano até dia 1º de junho devem atender ao previsto pelo governo na MP.

Enquanto vê uma nova derrota, o governo federal encaminhou ao Congresso, dez meses depois do anúncio, o projeto de lei do Future-se.

O texto, que busca fomentar o financiame­nto privado nas universida­des, teve seu envio oficializa­do no Diário Oficial desta quarta-feira (27), mas o teor ainda não foi publicitad­o.

Entre as polêmicas de Weintraub, ele é investigad­o por suposto crime de racismo em publicação nas redes sociais sobre a China.

O ministro Alexandre de Moraes vê seis crimes na fala do ministro na reunião ministeria­l do dia 22 de abril, quando ele defendeu a prisão de todos, “começando pelo STF”.

O MPF (Ministério Público Federal) ainda pediu explicaçõe­s do ministro da Educação sobre outra parte do encontro, em que ele disse odiar os termos “povos indígenas” e “povo cigano”.

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