Folha de S.Paulo

Jornalista da CNN é interrompi­da ao vivo por apoiador do presidente

- Daniel Carvalho

brasília A repórter Julliana Lopes, da CNN Brasil, foi interrompi­da por um apoiador de Jair Bolsonaro (sem partido) em uma entrada ao vivo nesta quarta (27) na entrada do Palácio da Alvorada.

A jornalista falava sobre decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), de determinar o depoimento de Abraham Weintraub.

O ministro da Educação tem prazo de cinco dias para ser ouvido pela Polícia Federal sobre o fato de ter afirmado em reunião ministeria­l que botaria todos na prisão, “começando pelo STF”.

Moraes disse que há “indícios de prática” de seis delitos. Weintraub pode ser enquadrado por difamação e injúria e em outros artigos da lei que define os crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social.

“Abraham Weintraub tem razão!”, gritou um homem no bolsão reservado a apoiadores do presidente. O espaço é separado da área da imprensa por uma grade.

“Larissa, eu vou voltar agora com você no estúdio. Está difícil a gente falar. Daqui a pouquinho eu volto”, disse Julliana, ao chamar a apresentad­ora Larissa Alvarenga.

“Tá bom, Ju. A gente entende. Muitas vezes, apoiadores do presidente acabam atacando a imprensa. Até por questão de segurança, depois ela volta”, disse Larissa.

Em seguida, o apresentad­or Reinaldo Gottino apoiou a repórter, que não voltou a entrar ao vivo.

Jornalista­s são hostilizad­os diariament­e por apoiadores de Bolsonaro no Alvorada, mas a situação se agravou na segunda. Folha, UOL e Grupo Globo suspendera­m a cobertura no local na terça.

A Folha decidiu pela suspensão até que o governo ofereça segurança aos profission­ais. A mesma decisão foi tomada pelo Grupo Globo, abrangendo os jornalista­s de suas emissoras de televisão, os jornais O Globo e Valor Econômico e o portal G1.

A cobertura tem sido feita a distância, por transmissõ­es pela internet pela equipe de Bolsonaro e por apoiadores.

Além da CNN Brasil, nesta quarta, Record TV, SBT, Jovem Pan e Poder 360 enviaram profission­ais ao local —eles foram hostilizad­os.

Segundo relatos à Folha, antes de interrompe­r a repórter, o apoiador foi até a grade afirmando que a imprensa mentia ao dizer que jornalista­s estavam inseguros no local. Após a interrupçã­o, agentes da Secom (Secretaria de Comunicaçã­o) e do GSI conversara­m com ele. Depois que o presidente saiu, os apoiadores xingaram os jornalista­s e foram abordados pelo pessoal do GSI.

À Rádio Gaúcha nesta quarta, o vice-presidente, general Hamilton Mourão, disse que os jornalista­s estão trabalhand­o e que é uma questão de educação.

No dia anterior, ao perceber a ausência desses profission­ais , Bolsonaro disse que eles estão se vitimizand­o.

“A Folha não está mais aqui, não? O Globo não está? Estadão também não”, disse em transmissã­o no Facebook, arrancando risos de militantes. O jornal O Estado de S. Paulo também não compareceu nesta terça-feira.

Em seguida, atacou esses veículos. “Estão se vitimizand­o. Quando eu levei a facada, eles não falaram nada. Não via Folha falando quem matou o Bolsonaro”, disse.

Ao contrário do que afirmou o presidente, a Folha se manifestou editorialm­ente de maneira imediata, condenando o ato. No editorial “Repúdio geral”, afirmou, em 7 de setembro de 2018, que o “atentado contra Bolsonaro não tem acolhida num país que está comprometi­do com a democracia”.

Em seguida, o presidente disse que nunca promoveu ato contra a mídia e que defende uma imprensa livre. “Nunca persegui ninguém, mas o ditador sou eu”, disse.

Em rede social, escreveu que “Globo, Folha e semelhante­s decidiram não ir mais ao Alvorada para, em seguida, distorcer o que falo. Que pena!”. “A partir de agora apenas inventarão.”

O ministro Gilmar Mendes, do STF, afirmou em rede social que “é chocante” a decisão de suspender a cobertura no Alvorada “diante de riscos à integridad­e moral e física dos jornalista­s”. “O Ministério Público e o Judiciário devem investigar esses atos que, se existentes, configuram atentado grave à liberdade de imprensa.”

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também comentou o assunto. “Episódios como esse que tiram a Folha e o sistema Globo da porta do Alvorada, quando o presidente fala para os brasileiro­s através dos meios de comunicaçã­o, são um ataque à imprensa, à liberdade de imprensa, à nossa democracia e, mais do que isso, dá uma sinalizaçã­o errada e que prejudica os brasileiro­s e o próprio governo.”

Na terça (26), o GSI informou em nota que continuará aperfeiçoa­ndo a segurança da entrada do Alvorada.

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