Parcela de estrangeiros na dívida é a menor em dez anos
Investidor externo vende R$ 78,8 bi em títulos, e endividamento público cai
brasília Os investidores estrangeiros se desfizeram de R$ 78,8 bilhões em títulos púbicos brasileiros em março e abril, em meio ao cenário da pandemia do coronavírus no país. Com isso, a participação dos não residentes na dívida pública interna caiu para 9,36%, a menor desde dezembro de 2009.
Os dados foram divulgados pelo Tesouro Nacional no relatório mensal da dívida pública referente ao mês de abril. Só nesse mês, houve saída líquida de R$ 24,3 bilhões de estrangeiros.
A menor demanda de investidores fez o Tesouro reduzir emissões. Isso, somando a um mês de vencimentos de papéis, levou o estoque total da dívida a cair 1,28%, para R$ 4,16 trilhões em abril.
“Em momentos de maior incerteza e menor apetite dos investidores, é natural que o Tesouro reduza as colocações de títulos, o que evita deterioração adicional nos mercados e aumento nos custos”, afirma em nota.
O cenário de piora nas contas públicas em meio aos efeitos da Covid-19 e às incertezas no cenário doméstico e global tem gerado uma percepção de risco de investidores em relação a ativos brasileiros.
O coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Luis Felipe Vital Nunes Pereira, diz que pesa no caso brasileiro o impacto da pandemia sobre a atividade, somado à expectativa com a retomada da agenda de reformas.
O Brasil vem registrando uma percepção de risco maior que a de pares internacionais em meio à crise.
O CDS (Credit Default Swap, indicador que mede o riscopaís) do Brasil ficou mais alto que países monitorados pelo Tesouro tanto em abril como em maio.
O CDS brasileiro recuou 11%, para 274 pontos em maio (dados colhidos pelo Tesouro até o dia 26). O do Peru caiu 12,9%, para 89 pontos. O do Chile caiu 13,7%, para 91 pontos. O da Colômbia desceu 27,5%, para 176 pontos. E o do México se reduziu em 32,8%, para 171 pontos.
Além dos estrangeiros, também registraram saída líquida da dívida pública em abril as instituições financeiras, os fundos de investimento e até mesmo o governo. Por outro lado, elevaram o estoque de forma marginal entidades de previdência.
A aversão dos estrangeiros aos ativos brasileiros também tem sido registrada em outros indicadores, como na Bolsa de Valores. Dados da B3 mostram que em 2020 os não residentes tiveram venda líquida de R$ 65,6 bilhões (considerando dados até 22 de maio).
O investimento estrangeiro direto, indicador do Banco Central, caiu para US$ 234 milhões em abril, ante US$ 5,1 bilhões de um ano antes.
O Tesouro afirma que, apesar das condições ainda bastante restritivas de liquidez, os volumes emitidos em maio mostram que as condições financeiras estariam, gradativamente, caminhando em direção à normalidade.
“Ao longo do mês de maio, o cenário globalmente ficou melhor e os volumes emitidos pelo Tesouro neste mês, até o momento, têm sido significativamente maiores. O colchão de liquidez segue em níveis confortáveis, e a emissão líquida em maio contribuirá para o fortalecimento do caixa”, afirma Pereira.
Mesmo assim, o Tesouro ainda observa condições restritivas diante das incertezas relacionadas à extensão e à profundidade dos impactos adversos da pandemia de Covid-19.
Esses aspectos, afirmam os técnicos, podem repercutir também sobre questões geopolíticas internacionais e sobre a capacidade de recuperação do nível de atividade global. Um dos possíveis efeitos seriam as tensões na relação entre Estados Unidos e China.
Esses recursos do BC se referem ao resultado do primeiro semestre de 2020, que se encerra em 30 de junho. Após essa data, são elaboradas as demonstrações, e o CMN deliberará sobre o assunto. Daí a previsão de agosto e setembro.
O Tesouro informou que existe previsão legal para usar recursos do resultado do Banco Central do primeiro semestre para a administração da dívida, o que deve acontecer na segunda metade do ano.
“A destinação desse recurso depende de aprovação do CMN (Conselho Monetário Nacional) e poderá ocorrer entre os meses de agosto e setembro”, afirma o Tesouro.