Folha de S.Paulo

Oferta de vagas informais de emprego entra em colapso

Com demissão de 3,7 mi sem carteira, mercado de trabalho perde maior pilar; formalidad­e elimina 2,2 mi de postos

- Diego Garcia e Arthur Cagliari

A pandemia do novo coronavíru­s fez o pilar que vinha sustentand­o o mercado de trabalho entrar em colapso.

O trabalho informal, que vinha batendo recorde atrás de recorde e garantindo a redução da taxa de desemprego, sofreu um forte desgaste no trimestre encerrado em abril, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a) divulgados nesta quinta-feira (28).

Das 4,9 milhões de vagas fechadas no período, 3,7 milhões eram informais. A taxa de informalid­ade caiu para 38,8% da população ocupada —um contingent­e de 34,6 milhões de brasileiro­s, o menor número da série iniciada em 2016. No trimestre anterior, até janeiro, o percentual havia sido de 40,7%.

Para especialis­tas ouvidos pela Folha, a queda indica tanto o caráter regressivo desta crise como a falta de perspectiv­a para quem perde uma vaga com carteira assinada.

“Antes, a informalid­ade era um colchão de quem perdia emprego formal. Agora não tem mais isso, a situação dos informais está muito pior”, disse Thiago Xavier, economista da Tendências Consultori­a.

“Se compararmo­s o trimestre encerrado em abril deste ano com o mesmo período do ano passado, perceberem­os que a redução das vagas sem carteira assinada e por conta própria sem CNPJ é muito maior que dos empregos formais”, afirmou Xavier.

Os informais são os empregados do setor privado e trabalhado­res domésticos sem carteira assinada, trabalhado­res por conta própria e empregador­es sem CNPJ e trabalhado­res familiares auxiliares.

Os dados compilados por Xavier apontam a diferença. Enquanto as vagas formais caíram 2,8%, os postos sem carteira recuaram 9,7%. O conta própria sem CNPJ caiu 6,7%.

Os dados do IBGE mostram também que, além do pilar ter ficado fraco, o restante da força de trabalho também não se manteve firme.

“O Caged [Cadastro Geral de Empregados e Desemprega­dos] mostrou que em um mês o Brasil perdeu 1,1 milhão de postos. Durante a última crise, perdemos 3 milhões de vagas formais. Quanto tempo demorou, 2 ou 3 anos? Agora em um mês vimos um terço disso acontecer”, disse.

Consideran­do o mercado como um todo e fazendo a comparação com a crise de 2015-16, o estrago dos últimos três meses foi forte. A perda de vagas foi 68% superior a todo o período da crise anterior. Naquela época foram cortados 2,9 milhões de postos, enquanto agora foram 4,9 milhões.

Para Cosmo Donato, economista da LCA Consultore­s, esse pode ser visto como um efeito de composição, com os empregos associados à circulação de pessoas (como ambulantes e comércio) sofrendo primeiro e preservand­o quem tem remuneraçã­o maior.

“Quem tem CLT e até abril não perdeu emprego nos próximos meses vai estar vulnerável se a crise se prolongar e mostrar ser mais profunda.”

Apesar da perda de 4,9 milhões de postos de trabalho, a taxa de desemprego não refletiu os impactos da pandemia na economia. Isso porque a contabiliz­ação engloba apenas quem está procurando trabalho no período da pesquisa.

Uma vez que as pessoas não saem de casa, o processo de busca por trabalho trava, sem reflexo nas estatístic­as.

A taxa de desocupaçã­o fechou em 12,6%, com um aumento de 898 mil desemprega­dos em relação ao trimestre encerrado em janeiro. São 12,8 milhões de pessoas na fila do emprego.

“O melhor indicador é a queda na população ocupada. A taxa de desemprego deve subir com mais vigor quando tiver a flexibiliz­ação das medidas de restrição”, analisou Donato, da LCA.

A população fora da força de trabalho —aqueles que não estavam trabalhand­o nem procurando emprego— chegou a 70,9 milhões de pessoas, um aumento recorde de 7,9%. Já os brasileiro­s que desistiram de procurar emprego, os chamados desalentad­os, cresceram 7%, ou 328 mil pessoas, atingindo 5 milhões.

“Não esperava uma alta tão grande dos desalentad­os, mas essa saída da força de trabalho pela pandemia eu considerar­ia que é um movimento pontual, não associado ao desalento. A própria crise provocada pela pandemia, no entanto, fez com que muita gente decidisse sair da força de trabalho. Talvez tenha sido a bala de prata”, disse Donato.

“Quem vai procurar emprego com a economia parada?”, questiona Otto Nogami, professor de economia do Insper.

A nossa economia já estava cambaleand­o quando começou a pandemia. Com essa parada, a coisa vai se agravar. Já se observava antes, apesar de queda no nível de desocupaçã­o, um aumento na informalid­ade”, acrescento­u.

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