Folha de S.Paulo

Ministro da Educação nega plágio, e Bolsonaro o defende

Bolsonaro diz que currículo de ministro tem ‘inadequaçõ­es’; parcela da cúpula militar já recua de apoio à nomeação

- Gustavo Uribe e Paulo Saldaña

O ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, negou que tenha cometido plágio em sua tese de mestrado e afirmou que continua à frente do cargo.

Após encontro com Jair Bolsonaro, ele não disse para quando será remarcada sua cerimônia de posse, que ontem foi suspensa.

O presidente escreveu em rede social que Decotelli sofre um processo de deslegitim­ação em razão de “inadequaçõ­es curricular­es” e que o ministro já “está ciente de seu equívoco”.

Apesar do aparente apoio, Bolsonaro pediu a deputados e assessores indicações de substituto­s.

BRASÍLIA Após encontro com o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, negou que tenha cometido plágio em sua tese de mestrado e disse que continua à frente do cargo.

Em seguida, Bolsonaro escreveu em rede social que “por inadequaçõ­es curricular­es o professor vem enfrentand­o todas as formas de deslegitim­ação para o ministério”.

“O Sr. Decotelli não pretende ser um problema para a sua pasta (Governo), bem como, está ciente de seu equívoco”, disse o presidente. “Todos aqueles que conviveram com ele comprovam sua capacidade para construir uma Educação inclusiva e de oportunida­des para todos”, afirmou.

Apesar das declaraçõe­s que indicam apoio ao ministro, o presidente pediu nesta segunda (29) a deputados e assessores indicações de substituto­s.

Constava no currículo de Decotelli um doutorado pela Universida­de Nacional de Rosario, da Argentina, mas o reitor da instituiçã­o, Franco Bartolacci, negou que ele tenha obtido o título, informação antecipada pela coluna Mônica Bergamo. Há ainda sinais de plágio na sua dissertaçã­o de mestrado.

Além disso, a Universida­de de Wuppertal, na Alemanha, informou que Decotelli não possui título da instituiçã­o, ao contrário do que constava em seu currículo, que mencionava um curso de pós-doutorado.

Em frente ao Ministério da Educação, o ministro não disse para quando será remarcada a cerimônia de posse, que foi suspensa nesta segundafei­ra. Afirmou que essa é uma questão de protocolo da Presidênci­a da República.

“Eu sou ministro e tenho trabalhos agora. Vou ficar até de noite sabe para quê? Para tentar corrigir os ajustes de Enem e de Sisu. E das demandas grandes”, disse no início da noite desta segunda-feira.

Segundo ele, Bolsonaro o questionou sobre inconsistê­ncias em seu currículo. “Não houve plágio, porque o plágio é considerad­o quando o senhor faz Cltr+C e Cltr+V. Não foi isso [que aconteceu]”, disse. “No mestrado, não houve plágio”, ressaltou.

O ministro reconheceu que se referiu em seu trabalho de mestrado na FGV (Fundação Getulio Vargas) a trechos de um relatório da CVM (Comissão de Valores Mobiliário­s), mas que respeitou o percentual permitido de citações.

Irritado com as revelações, o presidente passou a avaliar desde a tarde desta segunda uma troca na direção da pasta.

Durante a manhã, após a suspensão da cerimônia de posse, a cúpula militar, que bancou a escolha, ainda tentava reverter a demissão do novo ministro. Aliados do presidente próximos do ex-ministro Abraham Weintraub entraram em contato com Bolsonaro para convencê-lo a indicar outro nome para a pasta.

A pressão foi reforçada por deputados bolsonaris­tas, aliados dos filhos do presidente, que sugeriram que ele faça uma nova rodada de sondagens. Com o movimento de Bolsonaro, parcela do núcleo fardado, que apadrinhou a nomeação Decotelli, indicou recuar à sua permanênci­a.

Para evitar que o grupo de Weintraub emplaque o novo ministro, militares palacianos passaram a articular uma alternativ­a e sugeriram o nome de Marcus Vinicius Rodrigues, ex-presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educaciona­is).

Já o grupo próximo ao exministro voltou a defender os nomes do secretário de Alfabetiza­ção do Ministério da Educação, Carlos Nadalim, e do presidente da Capes (Coordenaçã­o de Aperfeiçoa­mento de Pessoal de Nível Superior), Benedito Aguiar.

O primeiro chegou ao cargo por indicação do escritor Olavo de Carvalho, guru dos filhos do presidente. O segundo tem forte respaldo da bancada evangélica, um dos pilares de sustentaçã­o do governo.

Apesar de já ter pedido sugestões, o presidente sinalizou que só irá oficializa­r uma troca quando for concluído pentefino feito pela Abin (Agência Brasileira de Inteligênc­ia) no currículo de Decotelli.

A cúpula militar ficou decepciona­da com as evidências de equívocos no currículo do ministro. Um general lembrou que a honestidad­e é um dos valores mais caros no código de conduta militar.

A nomeação de Decotelli foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União na quinta-feira (25), após anúncio feito pelo presidente.

O governo planejava uma solenidade de posse nesta terçafeira (30), mas a realização do evento foi adiada. Segundo relatos feitos à Folha, Bolsonaro ficou incomodado com a repercussã­o negativa das falsidades no currículo do ministro e com as acusações de plágio.

O mandatário se queixou de que não houve a repercussã­o positiva esperada com a nomeação de um nome técnico e que, nas redes sociais, o tema se converteu em novo flanco de desgaste para o governo.

Decotelli foi escolhido para suceder Weintraub, que deixou o cargo após uma série de polêmicas com o STF (Supremo Tribunal Federal).

A nova análise no currículo do ministro, ordenada por Bolsonaro, serve para apurar se há mais inconsistê­ncias. O próprio Decotelli demonstrou nesta segunda-feira (29) preocupaçã­o com sua permanênci­a e identifico­u perseguiçã­o da imprensa. A Folha solicitou entrevista com o ministro, mas não obteve retorno.

A avaliação nos bastidores é de que, mesmo que seja mantido no cargo, o novo ministro chega enfraqueci­do à pasta, palco de disputas entre grupos divergente­s do governo.

A assessoria de imprensa do MEC disse na sexta (26) que Decotelli concluiu os créditos das disciplina­s necessária­s para a obtenção do título de doutor na Universida­de Nacional de Rosário.

“Em nenhum momento a Secom confirmou o evento à imprensa e, até agora, não há previsão para essa cerimônia”, afirmou nesta segunda-feira o Planalto sobre o adiamento da posse do novo ministro.

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Reprodução/Globonews Carlos Alberto Decotelli conversa com jornalista­s em frente ao MEC

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