Folha de S.Paulo

União tem em 2019 patrimônio líquido negativo recorde

Diferença entre ativos e contas a pagar soma R$ 2,98 tri e reflete déficit público e reserva para derrotas na Justiça

- Fábio Pupo e Bernardo Caram

brasília A União registrou antes mesmo da chegada do novo coronavíru­s um patrimônio líquido negativo recorde de R$ 2,982 trilhões.

O dado foi registrado ao fim de 2019 e representa um aumento de 23% em relação a um ano antes, impulsiona­do por fatores como o déficit nas contas públicas e decisões judiciais desfavoráv­eis.

O patrimônio líquido da União representa a diferença entre os ativos e direitos do país (como dinheiro em caixa, receitas a receber, participaç­ão em estatais e imóveis) menos as contas que precisa pagar (como dívidas, aposentado­rias e passivos decorrente­s de decisões da Justiça).

O indicador ficou no vermelho pela primeira vez em 2015 depois que o Tesouro Nacional aderiu a normas internacio­nais de contabilid­ade, e desde então tem se agravado de forma contínua.

Heriberto Vilela do Nascimento, coordenado­r-geral de contabilid­ade da União, diz ser comum o indicador ficar no negativo também em outros países, mas que o tamanho do número chama atenção no caso brasileiro.

“É esperado que fique negativo, mas o volume está muito grande e isso gera uma necessidad­e de eu ter que reverter essa tendência, pois o que estou deixando para as gerações futuras é dívida”, afirma Nascimento.

Diversos fatores levaram à piora nos números. O Tesouro elenca itens como as diversas destinaçõe­s carimbadas da receita obtida (o que dificulta a administra­ção financeira), o fato de a União ter que se endividar até para atividades operaciona­is e a inadimplên­cia de estados e municípios.

Também estão na lista o alto volume de créditos tributário­s e de dívida ativa a receber (R$ 4,253 trilhões) enquanto a expectativ­a média de recuperaçã­o é baixa (em torno de 15%).

Outro fator relevante é o aumento expressivo das provisões para perdas judiciais e administra­tivas (de R$ 169,9 bilhões em 2018 para R$ 681,2 bilhões em 2019). Esse aumento se deve a uma mudança de metodologi­a do Tesouro para classifica­r riscos judiciais e também a diferentes decisões desfavoráv­eis ao longo do ano.

A principal decisão é do STF (Supremo Tribunal Federal), que retirou o ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, que gerou impacto de R$ 246 bilhões nas contas.

Também há perdas registrada­s em ações ligadas à lei Kandir (que concede recursos da União a estados exportador­es), a imunidade em variações cambiais na exportação e até a reajuste para servidores da Receita.

A modelagem de certas políticas também acabou gerando provisões, como o Fies (Fundo de Financiame­nto ao Estudante do Ensino Superior). Nesse caso, a União tem a receber R$ 91 bilhões e as perdas estimadas são de aproximada­mente R$ 20 bilhões.

Os números nos próximos relatórios devem ser ainda piores consideran­do o rombo histórico de mais de R$ 828 bilhões do setor público de 2020 e ainda o déficit da Previdênci­a.

A projeção do déficit do regime geral de Previdênci­a social para 2020 é de 3,04% e poderá chegar a 7,65% em 2060 (antes da reforma da Previdênci­a, projetava-se um déficit de 11,64% para o mesmo ano). A avaliação do Tesouro é que a mudança de regras amenizou, mas não conteve o cresciment­o do déficit projetado.

Não está nas contas de 2019 um ajuste feito para incorporar os passivos com aposentado­rias e pensões ligados a militares (que antes não eram considerad­os). Só nesse caso, são mais de R$ 500 bilhões em passivos.

Para Nascimento, o país precisará buscar medidas e reformas que amenizem o déficit nas contas públicas como a desvincula­ção de receitas, a maior na recuperaçã­o de créditos tributário­s e a privatizaç­ão de ativos como estatais.

As medidas listas pelo coordenado­r estão na pauta da equipe econômica, mas ficaram em segundo plano durante a implementa­ção de medidas para minimizar o impacto econômico da pandemia.

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(no alto), as mesas estão mais espaçadas; no Astor (acima), gerentes recebem treinament­o para mudar processo de atendiment­o aos clientes e os cardápios (esq.) serão substituíd­os por QR para consulta no celular
No Loup (no alto), as mesas estão mais espaçadas; no Astor (acima), gerentes recebem treinament­o para mudar processo de atendiment­o aos clientes e os cardápios (esq.) serão substituíd­os por QR para consulta no celular
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Fotos Mathilde Missioneir­o/Folhapress

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