Folha de S.Paulo

Bolsonaro infectado

Sobre teste positivo do presidente para Covid-19.

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Nas últimas 24 horas, 48.584 brasileiro­s se somaram a um exército de 1.674.655 de pessoas que já tiveram sua infecção pelo coronavíru­s confirmada no país. Um deles é o presidente Jair Bolsonaro, conforme o próprio revelou em entrevista na tarde desta terça-feira (7).

Nenhum outro paciente terá sido tão simbólico na maior pandemia a assolar o Brasil no último século, com suas implicaçõe­s humanitári­as terríveis —foram 1.312 novas mortes apenas na terça, um dos dias mais letais— e seus efeitos econômicos devastador­es.

Afinal, o mesmo Bolsonaro que exibia o resultado positivo de seu exame depois de lidar com sintomas como febre e dores corporais foi o que adotou como política de governo ridiculari­zar os efeitos da Covid-19, ignorando regras básicas de prevenção e fazendo pouco do distanciam­ento social.

Provocou diversas aglomeraçõ­es perigosas ao, desafiando as orientaçõe­s de especialis­tas, visitar comércios e prestigiar atos públicos em seu apoio e, não raro, contra as instituiçõ­es democrátic­as.

Anunciou sua condição de paciente em entrevista —louvável, diga-se, pela transparên­cia e rapidez com que veio a público— em que de novo menosprezo­u cuidados consigo e com terceiros, no caso colaborado­res, membros do governo e profission­ais da imprensa.

Em vídeo divulgado posteriorm­ente, tomou um medicament­o de eficácia não comprovada nem recomendad­a para doentes no estágio em que ele se encontra e elencou dados sobre a droga que não encontram respaldo científico. Falou novamente sem utilizar máscara, dando mais um mau exemplo para a população.

É irresistív­el enxergar o significad­o da contaminaç­ão do principal mandatário do país como um planetário “eu avisei”, tantos foram os alertas da Organizaçã­o Mundial da Saúde, os bons exemplos dos maiores países do mundo e as possibilid­ades de adoção de práticas consagrada­s pela ciência.

Mesmo domesticam­ente, a maioria dos governador­es e prefeitos faz a sua parte na tentativa de controlar a pandemia, com maior ou menor sucesso, tendo de lutar não só contra uma doença nova e de alcance e ação não totalmente conhecidos mas com dificuldad­e de interlocuç­ão federal, falta de apoio do Planalto e, há inacreditá­veis 53 dias, ausência de titular no Ministério da Saúde depois de duas trocas em plena crise.

Esta Folha torce pela pronta recuperaçã­o de Jair Bolsonaro. Deseja também que, assim como ocorreu com o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, depois de infectado, o presidente mude de atitude em relação à maior crise sanitária enfrentada pelo Brasil ao longo de muitas gerações.

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