A minha lei e o espaço
O desafio hoje para a Lei Brasileira de Inclusão é que ela ganhe espaço social
Nesta semana, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) completou cinco anos. Ainda é uma criança que clama por atenção o tempo todo, ainda não tem segurança de fazer quase nada sozinha e, aos poucos, entende que o mundo pode ser duro quando se guarda alguma diferença física, sensorial ou intelectual.
O governo de Jair Bolsonaro, até agora, afogou as demandas por cidadania do documento. Embora o presidente tenha o mérito de ter difundido a importância dos intérpretes de Libras, mimo que cedeu à primeira-dama, Michelle, nenhuma marca inclusiva digna de nota ele começou a desenhar, muito pelo contrário.
A Secretaria Nacional da Pessoa com Deficiência tem visibilidade zero e ações irrelevantes. É órgão meramente protocolar e pouco representativo.
O MEC quis acabar com a conquista histórica de cotas na pós-graduação e acabou com a educação como um todo.
O Ministério da Economia não poupou ou protegeu minimamente as pessoas com deficiência das medidas de enfrentamento à pandemia.
O Ministério da Saúde desenhou um rascunho interessante de apoio a pessoas com doenças raras, que já rareou em seu avanço.
Cultura não existe e a Damares... bem, a Damares tem dó povo “malacabado”, a velha tática da exclusão dissimulada.
Mas desapontamento com o rumo da humanidade vindo do governo federal não é algo que comova os plebeus.
O que é mais desafiador para o destino da lei é que ela ganhe espaço social como instrumento de defesa da igualdade e não como um conjunto de dizeres vistos como regalias ou chororô de um grupo capenga e pidão.
As veias que regam o coração da LBI são voltadas para que se construam pontes entre os isolamentos sociais seculares de parte das pessoas que fogem ao padrão de ser em movimentos, sentidos e maneiras de se expressar e o mundo dos certinhos, dos convencionais, dos que juram que não babam pelo canto da boca.
Dessa forma, cabe às empresas, aos comércios, às rodas de amigos, às internets, aos banqueiros, aos jornalistas, aos médicos, aos influenciadores, aos donos da rua, às ruas compreender que um montão de gente ainda aguarda para curtir os sabores de levar a vida como bem quiser, aqui, neste mundo mesmo.
Mais do que isso, cabe aos múltiplos agentes sociais a movimentação necessária de seus pares em busca de mais cores, além do preto, do arco-íris e do rosa, todos absolutamente legítimos, mas que não formam a aquarela humana completa.
Digo isso porque até minha filha biscoita, de cinco anos, já entendeu que é uma labuta gigantesca fazer com que este planeta abrigue as demandas do papai, que é cadeirante, de uma maneira mais natural e não por meio de protestos, situações frequentemente desgastantes em que se tem de explicar o óbvio para quem tem dificuldade de ver além da própria máscara.
“Pai, vamos brincar de ir para o espaço? Lá é muito legal e você não vai mais precisar de sua cadeirinha porque não tem gravidade e você vai conseguir ficar em pé, fazer o que você quiser e brincar bem livre comigo. Vai dar até para jogar adoleta porque esse seu braço que é mais fraco [o esquerdo, em decorrência de sequela da paralisa infantil] vai ficar mais leve e erguer direitinho.”
Tudo bem enquanto minha pequena enxerga meus apontados limites como ação da gravidade, apenas.
Há de haver tempo para a construção de um ambiente que possibilite que toda pessoa consiga desfrutar a infância de seus filhos de maneira completa. Uma lei para isso já existe.