WhatsApp desativa contas do PT por disparos em massa
Partido pede esclarecimentos à plataforma e a acusa de agir com falta de transparência e ‘hipocrisia’
O PT teve nove de suas contas no WhatsApp desativadas nas duas últimas semanas por envio automatizado de mensagens, em um processo que envolveu denúncias de spam político.
As duas ações são proibidas pelos termos de uso da plataforma. O partido confirmou ao UOL que esses eram todos os canais que tinha no WhatsApp e que eles foram tirados do ar a partir de 25 de junho. Desde então, quatro foram restabelecidos.
Procurada pela reportagem para comentar a suspensão, a presidente do partido, Gleisi Hoffman, disse que a punição acontece dentro de um contexto maior: a batalha em torno do projeto de lei das fake news —apoiado pelo PT, mas duramente criticado pela empresa em alguns pontos.
“Não dá para a gente afirmar que seja uma represália, mas com certeza o Facebook tem lado, um posicionamento político e um posicionamento em relação ao PL. Não devem estar contentes com ele”, afirmou ela, referindo-se à empresa dona do aplicativo desde 2014.
O projeto, no entanto, foi votado dia 30 de junho, cinco dias depois do bloqueio das contas.
Aprovado no Senado na semana passada, com o voto favorável dos seis senadores petistas, o texto barra contas automatizadas, popularmente conhecidas como robôs, que não estejam identificadas como tal para o público e para os provedores.
Um de seus pontos mais polêmicos, que exigia o fornecimento de documento de identidade para criação de uma conta em rede social, caiu durante as negociações.
O partido acusa o Facebook de não ser transparente. Para Hoffman, “o bloqueio desses canais ocorreu justamente dias depois que iniciamos o abaixo-assinado pelo impeachment [do presidente Jair Bolsonaro], com muitos apoiadores e entidades.”
Facebook e Instagram já apagaram posts do presidente por julgar que o conteúdo ia contra sua política.
“Temos muita desconfiança do que está acontecendo”, falou. O partido está migrando sua comunicação para o Telegram e desenvolvendo plataforma própria para não depender de outras companhias.
Em carta encaminhada na segunda-feira (6) ao Facebook, a presidente do PT ameaça processo judicial caso a empresa não responda aos questionamentos sobre a desativação das contas.
“É importante sabermos do que estão nos acusando. Até agora, Facebook e WhatsApp não mandaram. Se há hipocrisia aqui é da parte deles, que acobertaram milhões de fake news na campanha de 2018, não denunciaram, fizeram vistas grossas a um monte de coisas e agora vêm querer dar uma de lisura total. Acho que eles é que têm de explicar a lisura deles. Acho que são pouco confiáveis”, disse ela.
O envio de spam não é proibido pela lei brasileira, mas pelas regras do WhatsApp, que desativa quem “enviar mensagens em massa ou automatizadas que violam nossos termos de serviço” —2 milhões de contas são banidas por mês em todo o mundo.
A atividade de parte dos canais do PT foi classificada como suspeita pelos sistemas de aprendizado de máquina usados para detectar essas práticas pelo WhatsApp.
“Se você está enviando mais de cem mensagens por segundo, obviamente não é um ser humano que está por trás. Isso é automaticamente banido pelos sistemas”, explicou uma fonte próxima ao caso, que não quis se identificar.
Quando realiza essas remoções automáticas, o aplicativo não registra de quem é a conta. Mas, como alguns usuários denunciaram que recebetram ram conteúdo repetidas vezes, o comportamento foi classificado como spam. Neste caso, as pessoas precisam encaminhar capturas de tela e, por isso, o WhatsApp passou a acompanhar as contas que dispararam as mensagens.
Detectou, então, que elas faziam uso de algum sistema semi-automatizado. Por entender que elas estavam espalhando spam político, decidiu removê-las.
Para pessoas de dentro do WhatsApp, tratava-se de um movimento coordenado. Cerca de 30 contas, também removidas, foram detectadas direcionando usuários para os perfis do PT. Na mesma semana, outro comportamento estranho de centenas de contas administradas por uma só empresa foi notado.
O PT disse que contratou mesmo uma companhia especializada em disparo em massa de mensagens pelo WhatsApp, a LEADWhats, de Curitiba, e isso já ocorre há pelo menos quatro meses.
De acordo com Hoffman, os envios não são feitos indiscriminadamente, masco mo objetivo de distribuir conteúdos para a base de filiados —são eles, segundo o partido, que formam as várias listas gerenciadas pela LEADWhats.
A presidente do PT afirma que os participantes das listas não só aceitam receber as mensagens como cadaso número do WhatsApp da legenda em seus celulares. “Eles têm de provar que é fake news. Isso é comunicação oficial do PT, e nós temos responsabilidade com o partido. Fake news, que eu saiba, não é feita oficialmente, as pessoas fazem no submundo da internet. Se o PT está fazendo fake news, a pessoa tem que nos processar e requerer direitos sobre danos de imagem”, afirmou.
Ainda segundo Hoffman, quando o PT pediu informações a respeito das denúncias, a rede social disse não poder compartilhá-las para não infringir a privacidade dos usuários. Já o WhatsApp afirmou que avalia processar a LEADWhats: “Continuaremos a banir contas usadas para enviar mensagens em massa ou automatizadas e avaliaremos mais profundamente as nossas opções legais contra empresas que oferecem esses serviços, como fizemos no passado no Brasil.”
O uso das “máquinas de spam”, nascidas para espalhar conteúdo publicitário, foi associado a campanhas políticas durante as eleições de 2018. Reportagens de UOL e Folha mostraram que as campanhas de Bolsonaro e Fernando Haddad recorreram a essas empresas para espalhar propaganda eleitoral. A do presidente eleito também espalhou desinformação sobre adversários —coisa que o PL das fake news, por sinal, pretende proibir.
O WhatsApp passou a processar empresas que fazem disparo em massa.
Na semana passada, o UOL revelou que uma delas tem adotado manobras para driblar decisão judicial que a proibiu de atuar. Também noticiou que a Justiça condenou a SallApp com multa.