Folha de S.Paulo

Agruras da esquerda

Siglas vão às eleições com menos prefeitos do que em 2016 e sem capitaliza­r desgaste de Bolsonaro

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Acerca de saída de prefeitos e oposição a Bolsonaro.

As eleições municipais deste ano representa­rão o primeiro encontro dos partidos de esquerda com as urnas depois do tsunami político que, em 2016 e 2018, impôs ao então dominante PT e a seus aliados uma sucessão de derrotas.

Além de saudável, a alternânci­a no poder faz parte do jogo democrátic­o. Nesse sentido, nada haveria de propriamen­te traumático nos reveses experiment­ados pelo petismo —fora, claro, o impeachmen­t de Dilma Rousseff e as condenaçõe­s de Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção passiva.

Chama a atenção, no entanto, que tais reveses —reflexos de uma onda conservado­ra que não se limitou ao Brasil— continuem provocando estragos para as forças mais identifica­das com a esquerda.

É o que se observa, por exemplo, nas trocas de legenda por parte de prefeitos preocupado­s com a reeleição ou em fazer o sucessor.

Levantamen­to realizado pela Folha apontou que, entre 2017 e 2020, PT, PC do B, PDT, PSB e PSOL amargaram baixas no comando das prefeitura­s do país, de 1.084 para 907.

Enquanto isso, agremiaçõe­s mais ao centro e à direita, casos de DEM, PSD e PP, registrara­m aumento, de 1.307 para 1.760, no número de prefeitos em seus quadros.

Decerto que tais migrações podem ser explicadas, em grande parte, pela atrativida­de do poder. É natural que as forças municipais busquem alinhament­o às estaduais ou ao governo federal, em busca de mais verbas e chances eleitorais.

Há, todavia, evidência maior de que a esquerda não conseguiu superar seus últimos malogros —a incapacida­de de se agigantar em meio ao desgaste acelerado do governo Jair Bolsonaro, especialme­nte com a gestão ruinosa da crise sanitária do novo coronavíru­s.

O presidente mantém o apoio de um terço do eleitorado, mas sua reprovação subiu neste ano de 36% para 44%. A queda do apoio nos estratos mais afluentes e escolariza­dos da sociedade foi compensada por novos simpatizan­tes entre os eleitores mais pobres.

É notável que, em tal cenário, os antagonist­as mais destacados de Bolsonaro tenham sido o Supremo Tribunal Federal, os governador­es de São Paulo, João Doria (PSDB), e do Rio, Wilson Witzel (PSC) e líderes centristas do Congresso, como o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Do lado petista, Lula não reconquist­ou protagonis­mo na cena nacional depois de deixar a prisão. Mais recentemen­te, recebeu críticas merecidas por não endossar movimentos em favor da democracia que buscam congregar forças de diferentes preferênci­as.

Agarrados a teses econômicas que levaram o país à ruína e ao discurso rancoroso do golpe, o PT e seus satélites mostram dificuldad­es em formar alianças e ir além dos tradiciona­is nichos esquerdist­as.

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