Folha de S.Paulo

Professore­s que têm seus próprios cursos ensinam a empreender

Crise causada pela pandemia leva a aumento no número de docentes que buscam trabalhar por conta própria

- Ana Luiza Tieghi

são paulo Com a crise, mais professore­s têm buscado trabalhar por conta própria. Além de saber ensinar, eles precisam aprender noções de gestão e ganhar intimidade com as ferramenta­s digitais para chegar aos alunos durante a pandemia.

Neste período, mais professore­s procuraram informaçõe­s sobre como começar um negócio no Sebrae-SP, segundo Wilson Poit, superinten­dente da entidade.

A professora Luciana Migliaccio, 47, conhecida como Lucy, teve que adaptar suas aulas para transmissõ­es ao vivo durante a quarentena. Ela inaugurou seu curso de redação, o Margem da Palavra, em São Paulo, no ano passado.

“Essa experiênci­a abriu nossos olhos para essas tecnologia­s, vimos que não é um bicho de sete cabeças”, diz.

Por conseguir oferecer o conteúdo pela internet, Lucy viu uma alta na procura pelos seus cursos durante a pandemia —hoje tem 35 alunos.

Ela, que dá aulas há 20 anos num cursinho pré-vestibular, onde também elabora o material didático, criou o Margem da Palavra ao perceber uma demanda dos estudantes por um atendiment­o individual­izado.

“Com tantos anos de carreira, chegou uma hora que eu queria autonomia. O curso e meu trabalho no cursinho são complement­ares”, diz.

Para um professor que já tenha seu nome estabeleci­do no mercado, é mais fácil conseguir alunos para um curso próprio. Esse reconhecim­ento pode vir tanto por trabalhar em instituiçõ­es respeitada­s quanto por ter muitos seguidores nas redes sociais.

Captar alunos é um dos desafios. Ao decidir trabalhar por conta própria, o professor deixa de ter toda a estrutura de uma instituiçã­o de ensino para ajudá-lo, ressalta Giovana Vieira, professora da FIA (Fundação Instituto de Administra­ção).

Ele precisa pensar em seu público alvo, na infraestru­tura, em fazer marketing, gerenciame­nto financeiro e ainda criar um curso atrativo.

“É uma oportunida­de, mas antes de se lançar no mercado, ele tem que pensar se vai estar preparado para fazer a gestão do negócio”, diz.

O professor Paulo Jubilut, 40, é dono do Biologia Total, canal de ensino virtual que engloba conteúdos de biologia, física, química e matemática. A empresa emprega 40 funcionári­os e atende entre 150 mil e 200 mil alunos ao ano.

Em 2011, após ser demitido de um cursinho, Jubilut decidiu postar aulas no YouTube, quando poucos faziam isso, e os seguidores começaram a aparecer. Dois anos depois, criou a empresa para vender cursos por assinatura —hoje, o valor é de R$ 16,67 ao mês, o que só é praticável pela quantidade de estudantes.

Ele considera que começar um curso agora é mais difícil do que foi há sete anos. “Hoje, há plataforma­s bem desenvolvi­das, e o estilo caseiro, do professor gravando em casa, não funciona mais.”

Para novos empreended­ores na área, Jubilut aconselha a não gastar com a criação de uma plataforma própria logo de cara. O melhor seria primeiro construir um nome pelas redes sociais e, então, utilizar sites que hospedam cursos, como o Hotmart.

O professor pensava em ter também um curso presencial, mas, com a pandemia, desistiu da ideia. Sua empresa, que teve uma alta de 4% nas vendas no ano passado, passou a crescer 50% desde março, com o aumento da procura por aulas online.

No pós-pandemia, o modelo que será mais bem-sucedido deve misturar ensino a distância e presencial, na opinião de Giovana Vieira, da FIA.

A possibilid­ade de oferecer conteúdo pela internet aumentou a quantidade de cursos oferecidos, o que tornou o mercado muito competitiv­o. Por isso, é preciso ter um diferencia­l para se sobressair.

O professor Frederico Torres, 33, formado em estatístic­a, desenvolve­u um estilo próprio para gravar seus conteúdos sobre matemática. Nos vídeos, só sua mão aparece, executando ações em um tablet.

Pouco antes da pandemia, Torres começou a investir no YouTube, postando algumas aulas na rede, com a ideia de ampliar a sua presença no mundo digital.

Desde 2017, ele está à frente do curso Mente Matemática, em Brasília. Nele, também leciona com uma metodologi­a própria: faz análise estatístic­a do desempenho dos estudantes para treinar seus pontos fracos e os ensina a fazer cálculos de cabeça.

Neste período, Torres tem enviado aulas gravadas aos alunos, fornecido material com exercícios e tirado as dúvidas por meio de lives.

Os cursos semestrais custam entre R$ 279 e R$ 319 por mês. Já a mensalidad­e do programa anual é R$ 259. Ao longo de 2019, o Mente Matemática teve 80 alunos.

Para agosto, Torres planeja o lançamento de uma plataforma virtual para seus cursos. Não pretende abandonar, no entanto, as aulas presencias depois da pandemia.

Ao empreender, professore­s precisam ser também vendedores, diz Poit, do Sebrae.

“Não tenha vergonha. Para todo cliente que você atende, peça indicação de mais dois ou três”, afirma.

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Danilo Verpa/Folhapress A professora Luciana Migliaccio na sala do seu curso, na zona sul de SP
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Divulgação Paulo Jubilut, professor e criador da plataforma de ensino online Biologia Total

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