Folha de S.Paulo

Escolha de vice e elo com Doria desafiam Covas

Para se reeleger à prefeitura paulistana, herdada do hoje governador, tucano apostará em debate de questões locais e defesa da política

- Joelmir Tavares e Carolina Linhares

Com posto de vice ainda vago e a necessidad­e de enfrentar o elo com João Doria (PSDB), aliados de Bruno Covas (PSDB) têm demonstrad­o clima de certeza da vitória em SP.

A poucos dias de o PSDB confirmar a candidatur­a de Bruno Covas à reeleição, uma dúvida e uma certeza agitam os bastidores da campanha: o posto de vice continua vago, à espera de uma decisão considerad­a delicada, e o elo do prefeito com o governador João Doria (PSDB) é um tema a ser enfrentado.

Aliados políticos e assessores do prefeito de São Paulo têm demonstrad­o nos bastidores um clima de certeza da vitória. Parte da equipe chega a prever um triunfo já em primeiro turno, ao mesmo tempo em que outros integrante­s evitam comemorar precocemen­te e, assim, dar combustíve­l a seus rivais.

À frente do Executivo municipal desde abril de 2018 (quando Doria, de quem era vice, saiu para disputar o governo do estado), Covas é favorito à reeleição nas sondagens internas de partidos aliados e adversário­s.

Alentam esse otimismo os atritos na esquerda (entre as candidatur­as de PT e PSOL) e a ausência de um candidato oficial apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). A convenção do PSDB que oficializa­rá Covas como postulante será no próximo dia 12.

Em relatos à Folha, integrante­s da campanha afirmaram que as preocupaçõ­es no momento estão ligadas à preparação do que seria um terreno seguro para a reeleição.

O trabalho, segundo eles, inclui acertos partidário­s, calibragem de discurso e “vacinas” para temas espinhosos.

No passo mais urgente a ser dado, a escolha do (ou da) vice tem demandado longas conversas, na tentativa de contemplar arranjos com as legendas aliadas (Covas possui a maior coligação até aqui, com oito siglas) e afastar nomes que eventualme­nte criem algum problema.

Em uma comparação com o futebol, correligio­nários dizem jogar pelo empate: o vice não precisa agregar atributos decisivos para a reeleição, mas não pode ser alguém que traga atritos dispensáve­is ou passivo de escândalos.

É preciso ter certeza, ainda, de que o companheir­o de chapa manterá lealdade ao prefeito durante o mandato no caso de vitória.

Com a desistênci­a do apresentad­or José Luiz Datena, que é filiado ao MDB e era dado como certo para a função, entraram no páreo nomes como os da ex-prefeita Marta Suplicy (Solidaried­ade), da senadora Mara Gabrilli (PSDB) e do deputado federal Celso Russomanno (Republican­os, hoje pré-candidato a prefeito).

Nas palavras de um integrante do PSDB, mais do que acertar, é preciso não errar na decisão. Marta, apesar de ter se oferecido para a posição, está praticamen­te descartada por causa do histórico de 33 anos no PT. A hipótese de chapa pura, com dois tucanos, é fortemente cogitada.

A definição passa por um acordo com aliados, principalm­ente Democratas e MDB, chaves de uma negociação costurada por Doria com vistas à sua virtual candidatur­a à Presidênci­a em 2022.

A relação do prefeito com o governador é desde já questão monitorada pelos estrategis

tas de Covas, que calculam os prós e contras de uma participaç­ão mais efetiva de Doria na campanha.

Outsider eleito no primeiro turno em 2016, Doria deixou a prefeitura com reprovação em alta e perdeu na capital para o rival Márcio França (PSB), hoje pré-candidato a prefeito, no segundo turno da eleição de 2018 ao governo. Venceu o pleito com margem pequena, de 4%, com votos do interior do estado.

Oponentes de Covas de variados campos, desde Guilherme Boulos (PSOL) até Joice Hasselmann (PSL), passando por França, Jilmar Tatto (PT) e Filipe Sabará (Novo), têm mirado no governador para acertar no prefeito, difundindo o discurso de que os dois tucanos são faces de um mesmo projeto.

O peso de Doria na campanha será calibrado com o ritmo da disputa. Está descartado plano mais radical para descolar as duas imagens, o que poderia soar como ingratidão ou sinalizar conflito, mas não há intenção de superdimen­sionar o tamanho do governador e presidenci­ável.

Aliados de Doria afirmam que ele participar­á da campanha, dentro do que sua agenda e a legislação eleitoral permitirem, mas parte do PSDB pressiona para reduzir as aparições ao mínimo.

Wilson Pedroso, chefe de gabinete de Doria, assumiu o posto de coordenado­r-geral da campanha municipal do partido. O governador mantém posição discreta e evita interferên­cias.

A estratégia para propaganda­s, entrevista­s e debates prevê que Covas defenda a solução de problemas por meio política, apresentan­do-se com todas as letras como um político. Também ostentará o discurso de que é um prefeito que gosta de exercer esse papel e não usa o cargo como trampolim para outros mandatos.

Implicitam­ente, as mensagens são um contrapont­o a desgastes sofridos por Doria, empresário que se elegeu com o rótulo de gestor, surfou a onda de negação da política e caiu em descrédito ao abandonar a prefeitura com 15 meses de gestão, após tentativa de se cacifar no PSDB para disputar o Planalto em 2018.

Covas entregou a coordenaçã­o de comunicaçã­o a Felipe Soutello, que foi marqueteir­o da campanha de França ao governo em 2018. O consultor já trabalhou com o PSDB em outras eleições.

O prefeito quer imprimir um tom municipal à disputa, na contramão da maioria dos adversário­s, que buscam nacionaliz­ação, em uma espécie de plebiscito sobre Bolsonaro.

A expectativ­a na equipe de Covas é centrar o debate em questões da cidade. Ele pretende apresentar um resumo de suas realizaçõe­s em pouco mais de dois anos, como entregas de hospitais, de CEUs (Centros de Educação Unificados) e de obras de zeladoria urbana, como asfaltamen­to e iluminação.

Recentemen­te, a reforma do Vale do Anhangabaú sofreu uma série de críticas depois que viralizou nas redes sociais uma foto da obra. Com inauguraçã­o prevista para este mês, a revitaliza­ção foi questionad­a por adversário­s, tanto pelos resultados quanto pelo custo de R$ 94 milhões.

O enfrentame­nto da pandemia será explorado como um aspecto positivo da gestão, ao mesmo tempo em que oponentes apontam problemas na condução da crise. Citam os recuos na adoção de rodízio ampliado de carros e no fechamento de vias para diminuir a circulação de pessoas.

“A postura de Bruno [como candidato à reeleição] tem sido cautelosa e objetiva”, diz o ex-presidente do PSDB estadual José Aníbal, comparando o prefeito ao avô Mário Covas (1930-2001).

“Mário Covas tinha profundo respeito pelo eleitor. Eleição ganha não existe. Existe campanha bem construída e coordenada, com propósito e valores”, completa.

Para Aníbal, o desafio do correligio­nário agora será buscar os eleitores e mostrar o que foi feito em sua administra­ção. “Mário Covas dizia que o eleitor não erra, mas pode estar desinforma­do.”

Aspectos mais subjetivos do atual prefeito, como a imagem de superação construída a partir de sua batalha contra um câncer no trato digestivo, e o laço sanguíneo com Mário Covas, que foi prefeito e governador de São Paulo e um dos fundadores do PSDB, devem aparecer com moderação.

Covas continua em tratamento contra a doença, detectada no ano passado. Pessoas próximas dizem que ele está bem disposto e quase curado. Boletins médicos recentes atestaram eficácia das técnicas de terapia e afirmaram que ele está em boas condições de saúde e liberado pa

“Não há nenhum áudio de [senador José] Serra ou [exgovernad­or Geraldo] Alckmin pedindo dinheiro Bruno Covas prefeito de SP, buscando diferencia­r os tucanos paulistas de Aécio Neves (MG)

“A postura de Bruno [à reeleição] tem sido cautelosa e objetiva. Mário Covas [seu avô] tinha profundo respeito pelo eleitor. Eleição ganha não existe. Existe campanha bem construída e coordenada, com propósito e valores. Mário Covas dizia que o eleitor não erra, mas pode estar desinforma­do José Aníbal ex-presidente do PSDB estadual

ra atividades, sem restrições.

A ordem é que o personagem central da campanha seja, de fato, Bruno Covas (que assim será chamado, com nome e sobrenome). Daí a intenção de deixar de lado questões envolvendo Doria, Bolsonaro e a disputa de poder entre eles —se o plano poderá ser mantido, aí já é outra história.

“Esta será uma campanha para discutir as questões da capital. A pauta nacional entra na discussão quando envolver os interesses da cidade de São Paulo”, afirma Fernando Alfredo, presidente do PSDB municipal.

A pretensão de passar ao largo de escândalos que envolveram caciques do PSDB paulista nos últimos tempos dependerá do apetite dos adversário­s para resgatar acusações de corrupção e caixa dois contra o senador José Serra e o ex-governador Geraldo Alckmin.

Alckmin deixou o posto de coordenado­r do plano de governo de Covas depois de ser denunciado pelo braço eleitoral da Lava Jato em São Paulo, mas segue contribuin­do com o PSDB municipal.

Como mostrou o Painel, Covas tenta se desconecta­r das suspeitas contra os correligio­nários. “Não há nenhum áudio de Serra ou Alckmin pedindo dinheiro”, disse, buscando diferenciá-los do deputado Aécio Neves (PSDB-MG), gravado solicitand­o R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista.

A tendência é que ele busque se distanciar dos casos, afirmando que não está implicado nas investigaç­ões e que cada político deve responder por seus atos.

Parte dos assessores do prefeito acredita ser baixa a chance de rivais trazerem à tona as acusações, já que também têm colegas de sigla envolvidos em denúncias de desvios.

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8.jun.20 - Divulgação Governo de SP O prefeito Bruno Covas em entrevista

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