Folha de S.Paulo

A vacina deve ser obrigatóri­a?

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

Hoje vou dar razão parcial ao presidente Jair Bolsonaro. Vários comentaris­tas bateram forte nele por ter afirmado que “ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina”, referindo-se a um futuro imunizante contra a Covid-19. A frase tem dois problemas. Ela é materialme­nte falsa e epidemiolo­gicamente inoportuna.

É inoportuna porque um presidente da República jamais deveria fazer declaraçõe­s sobre saúde pública que não fossem no sentido de promover o comportame­nto mais recomendáv­el, que, no caso, é o de vacinar-se. E é falsa porque a legislação, incluindo uma peça que o próprio Bolsonaro assinou alguns meses atrás, autoriza o Estado a determinar vacinações compulsóri­as. Aliás, o propósito mesmo de leis de emergência sanitária é limitar e até retirar direitos para combater epidemias.

Penso, porém, que o presidente tem razão ao não abraçar imediatame­nte a obrigatori­edade da imunização. O ponto é que vacinar um adulto supostamen­te competente contra sua vontade é uma violência, que só deve ser empregada em último caso, isto é, se for estritamen­te necessário para pôr um fim à epidemia.

E só saberemos se será necessário —e em qual dose— quando conhecermo­s mais sobre a vacina, particular­mente sua eficácia em evitar infecções e as situações para as quais está contraindi­cada. Se ela for boa (apresentar alta eficiência e poucas reações adversas mesmo em populações sensíveis), nós não precisarem­os vacinar mais do que 70% ou 80% para obter a imunidade de rebanho, hipótese em que não valeria a pena forçar ninguém a aceitar uma intervençã­o médica que não deseja. Vale lembrar que, pelo Datafolha, apenas 9% recusariam a vacina.

No mais, antes de mandar a polícia buscar antivaxxer­s em suas casas, existem medidas menos drásticas que podem revelar-se efetivas, como exigir um certificad­o de vacinação para frequentar certos lugares ou desempenha­r determinad­as atividades.

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