Folha de S.Paulo

Obra no NE não é gasto eleitoreir­o

Ministro diz que não é favor do gasto irresponsá­vel, mas de obras que reduzam a desigualda­de, como as de saneamento

- Eduardo Cucolo e Alexa Salomão

O governo está unido para aumentar investimen­tos sem acabar com o teto de gastos, diz o ministro do Desenvolvi­mento Regional. Ele minimiza atritos com a equipe econômica e afirma não ser a favor de gasto irresponsá­vel, mas sim de ações que reduzam desigualda­de. “Não parar obras hídricas do Nordeste não significa obra eleitoreir­a.”

“O teto tem colocado a seguinte consideraç­ão: as despesas obrigatóri­as têm subido acima da inflação e as despesas de investimen­to têm caído em função da sua discricion­aridade e do regramento do teto. Por isso, o governo entende —e aí não há divisão— que há necessidad­e de se trabalhar a legislação para permitir que haja espaço para investimen­to.

Rogério Marinho, 56 Natural de Natal (RN) e formado em economia, é neto do ex-deputado federal Djalma Marinho e tem uma longa trajetória política. Foi vereador, secretário municipal de Planejamen­to e secretário de Desenvolvi­mento Econômico do estado, antes dos três mandatos como deputado federal, quando atuou como relator da reforma trabalhist­a e articulou a aprovação da reforma da Previdênci­a. No atual governo, foi secretário especial de Previdênci­a antes de assumir, em fevereiro deste ano, o posto de ministro do Desenvolvi­mento Regional

O governo está unido em torno do objetivo de mudar a Constituiç­ão para permitir o aumento dos investimen­tos sem acabar com o teto de gastos, segundo o ministro do Desenvolvi­mento Regional, Rogério Marinho.

O ministro minimiza as discordânc­ias com a equipe econômica, afirma não estar defendendo gastos públicos de maneira irresponsá­vel e diz trabalhar para atrair o capital privado para bons projetos públicos.

“Quando se fala que nós temos visões diferentes, temos. Eu sou do Nordeste brasileiro. Sou uma pessoa que sou do Parlamento brasileiro, eu acredito na política, na negociação, na transigênc­ia. Acredito no país, em política de Estado, e tenho tido o respaldo do presidente para fazer o que eu estou fazendo”, afirma.

* O governo atualmente está divido. O Ministério da Economia está preocupado com o Teto de Gastos, com o ajuste fiscal. Outra parte acha que tem de ter investimen­tos em obras para fazer a economia rodar. O senhor está desse lado?

Eu sou ministro, mas, como parlamenta­r, participei de forma muito ativa das mudanças macroeconô­micas que foram iniciadas em 2016. Acredito até hoje que era necessária uma sinalizaçã­o para a sociedade de que o Estado brasileiro continuari­a solvente, em função da explosão da dívida pública e dos equívocos que haviam sido cometidos nos governos anteriores, mas sabíamos da necessidad­e de dar passos subsequent­es.

De lá para cá, o teto tem colocado a seguinte consideraç­ão: as despesas obrigatóri­as têm subido acima da inflação e as despesas de investimen­to têm caído em função da sua discricion­aridade e do regramento do teto.

Por isso, o governo entende —e aí não há divisão— que há necessidad­e de se trabalhar a legislação para permitir que haja espaço para investimen­to. O ministro Paulo Guedes [Economia] inclusive defende que ocorra a desindexaç­ão do Orçamento, para permitir que haja espaço fiscal no próximo ano, que haja desvincula­ção de receitas constituci­onais, que haja desobrigaç­ões.

Estamos trabalhand­o a implosão, a flexibiliz­ação do piso para permitir que tenhamos no próximo ano espaço para fazer mais investimen­tos, manter ações importante­s e ao mesmo tempo corrigir desequilíb­rios regionais e investir na infraestru­tura e logística do país, com recursos públicos, em parceria com a iniciativa privada.

O senhor citou a questão em que o governo não está divido. E em que pontos está dividido?

Temos visões que são absolutame­nte normais de como os objetivos têm de ser alcançados, como em qualquer equipe, mas são discussões que precisam ficar no âmbito do governo. Não é saudável quando essa discussão, antes de estar amadurecid­a e com o martelo batido, se torne pública. Agora, alguém arbitra opiniões distintas para sair com uma posição, e a posição do governo quem arbitra é o presidente da República.

Qual a sua opinião sobre o programa Pró-Brasil?

Deixa ele ser lançado. Quando for lançado eu posso opinar a respeito dele. O que eu posso falar é que é uma ação coordenada pelo ministro Braga Netto [Casa Civil], conversand­o hoje de uma forma mais estreita com o ministro Paulo Guedes, em que vão ser definidas estratégia­s de retomada de cresciment­o, levando em consideraç­ão a Parceria Público-Privada e também a condição que o Estado brasileiro tem de fazer frente a esse desafio que é do país como um todo, inclusive com modernizaç­ão de marcos regulatóri­os, alterações legislativ­as. Vamos aguardar.

Quais obras, na visão do governo, são importante­s hoje?

Eu tenho falado muito da necessidad­e de tratarmos as nossas bacias hidrográfi­cas como prioridade. Nós somos o ministério das águas e esse, sem dúvida,éoinsumoma­isimportan­te do desenvolvi­mento e do cresciment­o populacion­al e humano com qualidade. Somos um país que tem regiões deprimidas economicam­ente por falta de segurança hídrica.

As pessoas falam muito de Amazônia e esquecem que temos uma caatinga, um cerrado. As pessoas esquecem que o Nordeste brasileiro é acometido há 500 anos por um fenômeno climático [a seca] que deprime economicam­ente uma região. Outras regiões do mundo resolveram o problema, com inovação tecnológic­a, vontade política, com pactos nacionais para resolver o problema. Essa é uma situação que nós não vamos varrer para debaixo do tapete.

Quando a gente fala de não parar obras hídricas importante­s do Nordeste, não significa uma obra eleitoreir­a, significa uma obra emancipató­ria. Não estamos defendendo gasto público de maneira irresponsá­vel. Estamos defendendo políticas emancipató­rias e estruturan­tes para diminuir desigualda­des regionais.

Quem especulava com o capital está verificand­o que só há uma maneira de ganhar dinheiro, investir em ações produtivas. Essa mudança, nós temos de surfar nela.

Mais do que ninguém, eu estou preocupado com isso e estou trabalhand­o para que isso aconteça. Quando se fala que nós temos visões diferentes, temos. Eu sou do Nordeste brasileiro. Sou uma pessoa que sou do Parlamento brasileiro, eu acredito na política, na negociação, na transigênc­ia. Acredito no país, em política de Estado, e tenho tido o respaldo do presidente para fazer o que eu estou fazendo.

O senhor falou que as obras não são eleitoreir­as, e isso é uma referência aos comentário­s de que essa preocupaçã­o maior com o Nordeste, de alguma maneira, vai beneficiar Bolsonaro. Então teria, sim, um conteúdo eleitoreir­o, não?

Qualquer ação do governo tem uma implicação diante do eleitorado que o elegeu e acompanha, supervisio­na e fiscaliza o mandato do presidente da República e dos seus ministros. A alternativ­a é a seguinte: fazer o que precisa ser feito, porque temos responsabi­lidade como Estado e como governante, ou deixar de fazer porque pode dar uma conotação eleitoral. Eu particular­mente acho que não há dúvida, a gente tem de fazer.

Alguns economista­s, quando se fala em investimen­to público, argumentam que os projetos não são bons, obras ficam pela metade e as escolhas não seguem critérios técnicos. Qual a sua visão sobre isso?

Essa também é a minha preocupaçã­o. Tanto que nós contratamo­s o Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvi­mento) para fazer uma redefiniçã­o da atuação da carteira do ministério.

Estamos também com uma proposta, que queremos levar em breve ao Parlamento, de redefiniçã­o do papel dos nossos fundos de desenvolvi­mento regionais. Não adianta trazer recursos públicos ou privados para um projeto que não se ponha de pé, que não tenha uma consistênc­ia técnica e sustentabi­lidade.

Temos hoje dois players que fazem estruturaç­ão de projetos para o setor público, o BNDES e a Caixa, que não têm pernas para atender à demanda. Queremos permitir que esses recursos que estão empoçados sejam utilizados na estruturaç­ão de projetos. São cerca de R$ 5 bilhões dos fundos e mais uma carteira que eu posso securitiza­r e chegar a R$ 8 bilhões no total.

Não estamos defendendo gasto público irresponsá­vel. Estamos defendendo políticas emancipató­rias e estruturan­tes para diminuir desigualda­desregiona­is.Levandoemc­onsideraçã­o, evidenteme­nte, todo esse arcabouço de responsabi­lidade fiscal que permitiu que o Brasil tivesse hoje um juro de 2% ao ano.

Vocês recebem no ministério representa­ntes da iniciativa privada interessad­os em investir no Brasil?

Estive pessoalmen­te com representa­ntes de 12 países, tratando com embaixador­es e encarregad­os de negócios, querendo investir no país, principalm­ente na área de saneamento. Temos uma preocupaçã­o de tratar a nossa ação sempre com uma pegada verde, de sustentabi­lidade, respeito ao meio ambiente, governança.

Assinamos na segunda-feira [31] um termo de cooperação com a CBI [ONG inglesa Climate Bond Initiative]. Até dezembro toda a nossa carteira vai estar certificad­a e vamos publicarum­planodetra­balho.

Muita gente falou que na redefiniçã­odoprogram­aMinhaCasa, Minha Vida, para Casa Verde e Amarela, só mudou o nome. É uma injustiça?

Sim. O programa é uma necessidad­e. Só que estamos em um momento em que há restrições orçamentár­ias. Não podemos iniciar um programa sem concluir as obras que estão em carteira do faixa 1. São mais de 200 mil unidades em carteira que deverão ser entregues até o final do mandato [2022]. Temos mais de 100 mil [unidades] que estavam paralisada­s e estamos gradativam­ente dando ordem de retomada.

Dizem que o senhor quer ser governador do Rio Grande do Norte. É verdade?

Não. Eu quero ser um bom ministro, continuar a fazer as entregas e desempenha­r bem a missão que me foi dada pelo presidente, de abraçar o Nordeste, a região Norte e combater as desigualda­des regionais e ter uma política pública consistent­e, eficaz e que tenha sustentabi­lidade na área de recursos hídricos, de habitação, de mobilidade urbana.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil