Folha de S.Paulo

Agronegóci­o ajuda a segurar a arrecadaçã­o na pandemia

Renda com exportação e auxílio emergencia­l elevam consumo e receita estadual

- Paula Sperb, Katna Baran e Fernanda Canofre

O agronegóci­o tem colaborado para evitar um rombo maior nos caixas dos estados, que viram a arrecadaçã­o diminuir a partir de março com a pandemia da Covid-19.

O alívio na receita não vem diretament­e da alta nas exportaçõe­s. Por causa da Lei Kandir, as exportaçõe­s estão isentas — pela lei de 1996, a União deveria compensar os estados pelas perdas. Porém, quem exporta tem aumento na renda, o que irriga a economia local e tem efeito sobre a arrecadaçã­o.

Secretaria­s da Fazenda ouvidas pela Folha também relacionam o alívio no caixas à alta no consumo de itens essenciais na pandemia e ao auxílio emergencia­l, que melhorou o orçamento de muitas famílias.

Um dos estado com a maior parte do PIB (Produto Interno Bruto) gerado pelo agronegóci­o — 65% de R$ 150 bilhões em 2019 —, o Mato Grosso teve alta na arrecadaçã­o de ICMS do setor em meio à pandemia.

Em julho de 2020, o estado arrecadou R$ 37 milhões em ICMS, ante R$ 20,6 milhões em julho de 2019, alta de 44,3%.

Em junho de 2020, a arrecadaçã­o também registrou alta no estado em comparação ao ano anterior: R$ 31 milhões ante R$ 19,7 milhões, um aumento de 36%.

“A alta do dólar agregou mais renda, já que 60% da produção vai para exportação, e isso faz o dinheiro circular”, diz o secretário da Fazenda de Mato Grosso, Rogério Gallo.

Além disso, Gallo aponta que uma nova regra sobre incentivos fiscais tem colaborado com a arrecadaçã­o. “Para manter benefícios, tem que recolher o ICMS do mês anterior ou suspendemo­s o incentivo. Assim, tivemos incremento de adimplente­s”, afirma.

A norma não valia no regime fiscal anterior.

Para o secretário, porém, há outro fator que contribuiu com a alta da arrecadaçã­o. A injeção do auxílio emergencia­l para cerca de um terço da população de Mato Grosso.

“Para quem tem menos renda, a maior parte do consumo é em itens básicos, como supermerca­do, o que gerou ICMS para o setor”, diz Gallo.

Também no Centro-Oeste, o Mato Grosso do Sul teve aumento de receita no primeiro semestre de 2020 em relação ao mesmo período do ano passado. O acréscimo foi de quase 9%. O estado registra alta de quase 30% nas exportaçõe­s, com destaque para soja, celulose e carne bovina.

A arrecadaçã­o do setor agropecuár­io, incluindo a agroindúst­ria, teve alta de 8%.

A vontade de produzir, principalm­ente para atender o mercado externo, movimenta até o sistema financeiro. Houve aumento de 30% no volume de crédito rural em relação ao mesmo período do ano passado, refletindo a demanda por soja. Cerca de 40% da próxima safra —que nem foi plantada— já vendida.

“Fatores externos positivos, como alta na demanda e melhora nos preços internacio­nais, aliados à capacidade competitiv­a da agroindúst­ria, impulsiona­m a economia local ”, diz Jaime Verruck, secretário estadual de Meio Ambiente, Desenvolvi­mento Econômico, Produção e Agricultur­a Familiar do estado.

Ele aponta ainda que, mesmo com um cenário de arrecadaçã­o melhor em comparação com o ano passado, a emissão de notas fiscais no estado ainda está 14% abaixo da referência anterior à pandemia.

Ou seja, os volumes comerciali­zados demonstram uma retomada, mas o impacto da queda no varejo ainda é alto.

No Rio Grande do Sul, o agronegóci­o arrecadou 6,7% a mais no primeiro semestre de 2020 em comparação com 2019, uma diferença positiva de R$ 122 milhões.

O mês com mais alta foi abril, em plena pandemia, com 27% de aumento na arrecadaçã­o, que totalizou R$ 243 milhões. O saldo negativo foi somente em maio: -1.1%.

“Desde o início da pandemia, se observou que foi o setor que reagiu. As pessoas estão privilegia­ndo a aquisição de alimentos. Também há um cenário de bons preços para o mercado internacio­nal”, explica Eduardo Jaeger, subsecretá­rio adjunto da Receita.

A alta, porém, não é o suficiente para equilibrar as finanças do estado. Isso porque mais consumo de produtos agroindust­riais, por exemplo, não reflete necessaria­mente na arrecadaçã­o, por causa de incentivos fiscais concedidos ao setor.

O agronegóci­o gaúcho exportou US$ 3,1 bilhões no segundo trimestre de 2020. O valor é 5,2% maior na comparação com o segundo trimestre de 2019, segundo levantamen­to da Secretaria de Planejamen­to, Governança e Gestão.

Também no Sul, houve pequena reação na arrecadaçã­o de julho no Paraná, com acréscimo de 1,4% em relação ao mesmo mês de 2019. O número, porém, ainda é insuficien­te para reverter as perdas ocasionada­s pela pandemia no acumulado do ano, que chega a R$ 1,47 bilhão.

No recorte entre março e julho, que mostra um panorama mais fiel dos impactos da crise gerada pela Covid-19 sobre o Tesouro do estado, a queda está na casa de R$ 1,72 bilhão.

Na avaliação setorial, a agricultur­a puxou os ganhos do estado para cima, com alta de quase 32% na arrecadaçã­o.

Os números de vendas por produtos também demonstram o avanço do setor agrícola paranaense. No acumulado do ano, as maiores altas estão nos alimentos: cereais, farinhas, sementes, chás e café (34%), frutas, verduras e raízes (22%) e carnes, peixes e frutos do mar (19%).

A melhora não reflete necessaria­mente em investimen­to na produção. A queda de 16% na venda de tratores no período de um ano indica que o agricultor está segurando o dinheiro.

O estado vizinho, Santa Catarina, teve queda na arrecadaçã­o de ICMS do agronegóci­o em todos meses a partir de março, início da pandemia, comparando com 2019.

Segundo a Secretaria da Fazenda, as exportaçõe­s caíram para todos os destinos, exceto China, que comprou 49% a mais do que em 2019.

Santa Catarina faturou US$2,64 bilhões com os embarques internacio­nais, a maior parte (70%) a cargo do agronegóci­o, segundo a Secretaria de Estado da Agricultur­a, Pesca e Desenvolvi­mento Rural.

 ?? Jaelson Lucas - 3.mar.20/AEN ?? Colheita de soja em fazenda do Paraná; produção do campo ajudou na arrecadaçã­o de estados durante a crise do coronavíru­s
Jaelson Lucas - 3.mar.20/AEN Colheita de soja em fazenda do Paraná; produção do campo ajudou na arrecadaçã­o de estados durante a crise do coronavíru­s

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil