Folha de S.Paulo

Parceria GM-Honda pode dar início a aliança global

Acordo de desenvolvi­mento conjunto para América do Norte reproduz estratégia da indústria automotiva para ganhar escala

- Eduardo Sodré

A parceria entre GM e Honda anunciada na quinta (3) segue a onda de alianças na indústria automotiva, que muda para cortar custos.

As despesas aumentaram no século 21: é preciso gastar bilhões de dólares para atender às necessária­s normas de redução de emissões e de aumento da segurança dos veículos.

A princípio, o acordo é válido para a América do Norte. A relevância pode ser medida apenas pelos dados dos EUA: somadas, as montadoras que agora se unem comerciali­zaram 4,5 milhões de automóveis nesse mercado em 2019.

Para comparar, 2,26 milhões de carros de passeio foram vendidos por todas as marcas no Brasil no ano passado.

As empresas japonesa e americana já haviam dado um passo importante em abril, quando anunciaram o desenvolvi­mento conjunto de veículos elétricos com plataforma GM.

O assunto perdeu relevância diante da pandemia, mas agora ganha ares globais. A América do Norte pode ser apenas o primeiro passo.

O comunicado divulgado pelas montadoras diz que “o escopo da aliança proposta inclui uma gama de veículos a serem vendidos sob as marcas distintas de cada empresa, bem como cooperação em compras, pesquisa e desenvolvi­mento e serviços conectados”. O discurso se alinha com o que foi dito por outras fabricante­s que passam pelo mesmo processo de união estável.

A estrutura atual do setor automotivo reforça a expectativ­a de um avanço da parceria em outros mercados, incluindo o brasileiro. Grande parte dos produtos Honda e GM desenvolvi­dos e comerciali­zados nos EUA, no México e no Canadá chega ao mercado sul-americano.

O trabalho em conjunto na área de engenharia terá início em 2021. Portanto, em um futuro não tão distante, os modelos Chevrolet Cruze e Honda Civic deverão compartilh­ar a mesma base e ganhar opções híbridas e elétricas mais modernas. O mesmo pode ocorrer com as próximas gerações dos utilitário­s compactos Tracker e HR-V.

O casamento não causa estranheza no setor automotivo. As montadoras americana e japonesa têm projetos em conjunto desde o início dos anos 2000, com foco no desenvolvi­mento de pilhas de combustíve­l e de tecnologia para a automação dos carros.

“Essa aliança ajudará a acelerar o investimen­to em futuras inovações em mobilidade, disponibil­izando recursos adicionais. Dado o nosso forte histórico de colaboraçã­o, as empresas perceberam sinergias significat­ivas no desenvolvi­mento do portfólio atual de veículos”, disse Mark Reuss, presidente da GM.

Em discurso ensaiado, Seiji Kuraishi, vice-presidente­executivo da Honda Motor Co. confirmou as pretensões da parceria. “Combinando os pontos fortes de cada empresa e determinan­do cuidadosam­ente o que faremos por conta própria e o que faremos em colaboraçã­o, nos esforçarem­os para construir uma relação ganha-ganha.”

A evolução das plataforma­s automotiva­s permite o ”ganha-ganha” mencionado por Kuraishi. É possível construir carros visualment­e diferentes sob uma mesma base e na mesma linha de produção, o que proporcion­a ganho de escala.

Esses produtos compartilh­ados podem ser híbridos, elétricos ou equipados apenas com motores a combustão. As novas arquitetur­as permitem essa flexibilid­ade sem que seja preciso trabalhar em diferentes áreas de montagem. É o ápice do sistema criado por Henry Ford (1863-1947).

Ao compartilh­ar pesquisa e desenvolvi­mento, as empresas também conseguem reduzir o tempo necessário até que um novo carro seja lançado, o que também significa redução de custos. Contudo, surge a preocupaçã­o com os empregos na indústria.

A Honda e suas subsidiári­as têm 60 fábricas em 27 países, que geram 208 mil empregos.

A GM vem reduzindo seu quadro de pessoal ano após ano, dentro de uma estratégia de encerramen­to ou venda de marcas e fábricas. Em 2016, a empresa tinha 225 mil funcionári­os mundo afora. Em 2019, eram 164 mil.

A redução não se deve somente a demissões. A venda da divisão europeia (Opel e Vauxhall) para o grupo PSA Peugeot Citroën, em 2017, levou à desvincula­ção de milhares de operários, que passaram para a folha de pagamento do grupo francês.

Mas, como todo movimento que busca reduzir custos, há o risco de cortes em massa na América do Norte.

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