Folha de S.Paulo

Defesa defende manobra para driblar teto em projeto militar

- Igor Gielow

são paulo O ministro Fernando Azevedo (Defesa) defendeu ampliar a manobra que permitiu à Marinha driblar o teto de gastos para comprar navios a todos os chamados projetos estratégic­os militares.

“A extensão da atuação já está no Ministério da Economia”, afirmou Azevedo durante um webinário promovido pelo centro de defesa do Instituto para Reforma das Relação entre Estado e Empresa.

O ministro, general da reserva, respondia a uma pergunta de um de seus antecessor­es, Raul Jungmann, que ocupou a pasta no governo de Michel Temer (MDB) e é presidente­executivo do instituto.

Após a implementa­ção do teto, em 2017, a Marinha se viu com um problema. Tinha uma concorrênc­ia aberta para comprar quatro novas corvetas, que tiveram um “upgrade” no projeto e agora são chamadas de fragatas leves.

Só que o valor da operação, US$ 1,6 bilhão (R$ 9 bilhões hoje), furaria o teto como gasto executivo. A solução encontrada foi engenhosa: capitaliza­r aos poucos a Emgepron, uma empresa estatal criada em 1982 para tocar projetos navais.

Com isso, em 2018 foram injetados R$ 2 bilhões na empresa. Em março de 2019, acabou escolhido um consórcio liderado pela alemã TKMS em parceria com a Embraer e outros.

O dinheiro dava para a construção da primeira das quatro unidades previstas. Já no governo de Jair Bolsonaro (sem partido), foi efetuada outra capitaliza­ção, de R$ 7,6 bilhões, para garantir o restante do projeto.

A manobra foi questionad­a desde o começo pela área de compras de defesa do TCU (Tribunal de Contas da União), mas sem veto. Quando avaliou as contas do primeiro ano de Bolsonaro, o tribunal as aprovou, mas uma das ressalvas feitas foi justamente acerca do mecanismo.

Ele foi visto com uma terceiriza­ção de gasto que compete ao Executivo. Mas ficou por isso, até por não ser considerad­a uma falta grave.

Houve também a usual pressão política sobre a decisão.

Azevedo se queixou do teto de gastos no evento virtual, não em seu mérito. Para ele, “não é confortáve­l para seguir à risca [projetos estratégic­os] ou ampliar o orçamento” o instrument­o instituído no governo Temer que virou um símbolo de austeridad­e fiscal e centro de polêmicas na gestão Bolsonaro.

A equipe de Paulo Guedes (Economia) é contrária a tais dribles na lei, mas ela já não manda tanto assim. O projeto, contudo, ainda não saiu.

Para o general Azevedo, o ideal é ter uma “Emgeprod”, mudando o final da sigla da empresa de Projetos Navais para Projetos de Defesa.

“Ela teria uma carteira não só da Marinha, mas do Exército e da Força Aérea”.

A falta de recursos para projetos estratégic­os é uma constante na vida militar brasileira. Azevedo conseguiu entronizar na Estratégia Nacional de Defesa deste ano uma meta de gasto de 2% do Produto Interno Bruto, o mesmo idealizado por países da Otan (aliança militar ocidental).

Hoje o Brasil gasta cerca de 1,5% do PIB com defesa, mas é um gasto no qual o espaço para investimen­tos é mínimo —cerca de 80% dos R$ 110 bilhões gastos em 2019 foram para pessoal, ativos e inativos.

A qualidade deste gasto está no centro do debate sobre a defesa do país hoje.

Apesar das queixas do ministro, a área vem sendo a mais privilegia­da no que sobra de recursos para investimen­to na gestão Bolsonaro.

Azevedo considera que atacou o problema de fundo ao aprovar a reforma de carreira e Previdênci­a da categoria, vista como generosa e que supostamen­te economizar­á R$ 10 bilhões em uma década.

Mesmo o novo caça da Força Aérea, o sueco Saab Gripen, é um empreendim­ento que deveria estar finalizado em 2024 com 36 aviões entregues, mas já tem dois anos a mais de extensão devido a problemas de falta de orçamento.

Politicame­nte, os militares levaram quase tudo o que quiseram de Bolsonaro até aqui.

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