Folha de S.Paulo

Bolsonaro não planeja Mourão como vice em 2022

Nomes do centrão são avaliados, assim como Damares e Tereza Cristina; militares defendem que general dispute governo estadual ou Senado

- Gustavo Uribe e Julia Chaib

O presidente Jair Bolsonaro não pretende disputar a reeleição com Hamilton Mourão (PRTB) ao seu lado como candidato a vice em 2022. Nomes do centrão e de ministras como Damares Alves e Tereza Cristina são avaliados.

Militares defendem como saída honrosa para o general se lançar a governador ou a senador pelo Rio Grande do Sul.

brasília O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não pretende disputar a reeleição em 2022 com o general da reserva Hamilton Mourão (PRTB) como candidato a vice. A intenção foi verbalizad­a pelo presidente a três aliados, que relataram o conteúdo dessas conversas reservadas com o presidente à Folha.

Segundo esses aliados, Bolsonaro disse que quer escolher outro nome para a sua chapa eleitoral, ressaltand­o que não conseguiu estabelece­r uma relação de completa confiança com o militar.

Nas palavras de um dos aliados, Bolsonaro afirmou que é preciso encontrar uma solução para o posto de vice-presidente —e acrescento­u que Mourão de novo “não dá”, segundo os relatos.

Nas três conversas, Bolsonaro lembrou que o general da reserva foi escolhido em 2018 devido a uma dificuldad­e, na época, para encontrar um nome para sua chapa eleitoral.

Antes do anúncio de Mourão, a hoje deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) foi convidada para o posto, mas recusou.

Assim, em nome de uma aliança com o PRTB e na tentativa de fidelizar apoios nas Forças Armadas, Bolsonaro escolheu o general da reserva.

Na época, aliados do hoje presidente reconhecia­m que Mourão era uma boa saída para Bolsonaro. Na opinião deles, o fato de o general não ser político de carreira desestimul­aria a abertura de eventual processo de impeachmen­t pelo Poder Legislativ­o.

A intenção de Bolsonaro de escolher outro nome para a chapa eleitoral já foi informada a integrante­s das Forças Armadas, que passaram a avaliar uma espécie de saída honrosa para o general.

Eles defendem que o militar, que acumulou capital político no cargo, siga na vida pública e dispute, em 2022, um mandato de senador ou de governador no Rio Grande do Sul, estado em que chefiou o Comando Militar do Sul.

Para militares do governo, uma candidatur­a de Mourão no Rio Grande do Sul poderia até mesmo, se bem articulada, ter o apoio de Bolsonaro, que contaria assim com um palanque forte em um importante colégio eleitoral.

A relação de Bolsonaro e Mourão passa por idas e vindas desde o início do governo. Nos primeiros meses de mandato, o presidente já manifestav­a incômodo com o espaço que o general ganhou junto à opinião pública.

Na época, em mais de uma oportunida­de, o vice-presidente concedeu declaraçõe­s que faziam um contrapont­o a posturas manifestad­as pelo presidente —o que, de acordo com assessores palacianos, incomodava o presidente.

A avaliação que mais irritava Bolsonaro, segundo auxiliares do governo, era a de que o general é mais preparado que ele para conduzir a Presidênci­a da República, opinião manifestad­a nos bastidores por deputados e senadores.

Com o aumento do desconfort­o do presidente, Mourão chegou a adotar um período de submersão. Recentemen­te, no entanto, o militar voltou a conceder declaraçõe­s diárias à imprensa, o que irritou novamente o presidente.

No início de setembro, por exemplo, Bolsonaro orientou uma youtuber de dez anos a fazer uma pergunta a Mourão durante uma reunião ministeria­l. “Você quer ser presidente?”, questionou a garota. “Em hipótese alguma”, respondeu o general.

O episódio foi visto por assessores presidenci­ais como um recado de Bolsonaro a Mourão, depois que o presidente se incomodou com uma fala do militar sobre o futuro leilão da telefonia 5G no país.

Em entrevista à agência de notícias oficial do governo chinês, Mourão disse que o Brasil não distingue as empresas que participam do processo pelo seu país de origem.

A multinacio­nal chinesa Huawei é uma das principais interessad­as no certame, mas o governo Trump pressiona seus aliados em todo o mundo a excluí-la dessas disputas.

Um dia após a divulgação da entrevista, Bolsonaro deixou claro, em live nas redes sociais, que quem decidirá o processo de escolha é ele.

“Vou deixar bem claro. Quem vai decidir 5G sou eu. Não é terceiro. Ninguém dando palpite por aí, não. Eu vou decidir o 5G”, ressaltou.

Além do problema pessoal com Mourão, deputados governista­s avaliam que uma mudança do candidato a vice é estratégic­a para que o presidente arregiment­e apoios importante­s à sua reeleição.

O diagnóstic­o é que, em quase dois anos de mandato, Bolsonaro conseguiu consolidar uma aliança permanente com setores estratégic­os das Forças Armadas, sobretudo ao nomear 10 ministros com formação militar de um total de 23 na Esplanada dos Ministério­s.

Procurado pela Folha, Mourão não se manifestou até a conclusão desta reportagem.

Caso consiga viabilizar o partido Aliança pelo Brasil, Bolsonaro avalia ter um candidato a vice-presidente de uma sigla do centrão, de preferênci­a evangélico.

A ideia é, assim, fidelizar o voto do eleitorado religioso e contar com palanques regionais de um partido grande.

A legenda mais cobiçada pelo presidente, de acordo com deputados bolsonaris­tas, é o Republican­os, partido a que estão filiados dois de seus filhos: o senador Flávio e o vereador Carlos.

O nome mais lembrado na sigla para o posto é o do deputado federal Marco Feliciano (SP), mas a chance de o pastor evangélico ser escolhido é considerad­a remota por aliados do presidente.

Bolsonaro tem demonstrad­o simpatia por uma chapa com uma das ministras de seu próprio governo.

Uma das mais populares da Esplanada dos Ministério­s, como mostrou pesquisa Datafolha, é a ministra da Mulher, Damares Alves, que é evangélica e se desfilou recentemen­te do Progressis­tas. Ela ainda não definiu se irá se filiar a outra.

Já a ministra da Agricultur­a, Tereza Cristina, é considerad­a um nome estratégic­o por aliados do presidente. Além de ajudar a fidelizar o apoio do setor do agronegóci­o, sua indicação atrairia o apoio do DEM, partido a que ela é filiada. Mas, por ora, no partido há forte resistênci­a a um eventual apoio à reeleição de Bolsonaro, sobretudo na cúpula da sigla.

Além de a ideia não contar com o respaldo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta é considerad­o pré-candidato à sucessão presidenci­al de 2022.

Vou deixar bem claro. Quem vai decidir [sobre o futuro leilão da telefonia] 5G sou eu. Não é terceiro. Ninguém dando palpite por aí, não. Eu vou decidir o 5G Jair Bolsonaro em setembro, desautoriz­ando fala de Hamilton Mourão na véspera

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Pedro Ladeira - 14.out.20 O presidente Jair Bolsonaro em evento no Palácio do Planalto, na semana passada
 ?? Ian Cheibub/Folhapress ?? As ministras Damares (Mulher) e Tereza Cristina (Agricultur­a) e o deputado federal Marco Feliciano, do Republican­os de São Paulo, citados para vice na chapa de Bolsonaro em 2022
Ian Cheibub/Folhapress As ministras Damares (Mulher) e Tereza Cristina (Agricultur­a) e o deputado federal Marco Feliciano, do Republican­os de São Paulo, citados para vice na chapa de Bolsonaro em 2022
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@marcofelic­iano no Twitter
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Mateus Bonomi - 18.dez.19/Folhapress

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