Folha de S.Paulo

É possível fazer política sem ódio, afirma Covas no discurso da vitória

Prefeito, que diz que cidade não terá ‘distritos azuis e vermelhos’, pode mudar plano anti-Covid já nesta 2ª

- Artur Rodrigues, Carolina Linhares e Thiago Amâncio

As urnas falaram e eu saberei ouvir o recado das urnas no dia de hoje. São Paulo, você pode contar comigo

Não existe distrito azul ou distrito vermelho, existe a cidade de São Paulo

Meu avô dizia que é possível conciliar política e ética, política e honra, política e mudança. Eu agora acrescento: é possível fazer política sem ódio

Eu queria aqui fazer uma homenagem ao meu vice, Ricardo Nunes. Sofreu muito durante esta campanha. Mas esteja certo, Ricardo, que a partir de 1º de janeiro nós vamos governar e vamos mostrar para São Paulo quem nós somos e qual é a nossa visão de mundo

São Paulo mostrou que restam poucos dias para o negacionis­mo e para o obscuranti­smo. São Paulo disse sim à democracia. São Paulo disse sim à ciência. São Paulo disse sim à moderação. São Paulo disse sim ao equilíbrio Bruno Covas prefeito de São Paulo

são paulo “É possível fazer política sem ódio”, disse na noite deste domingo (29) o prefeito reeleito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), em discurso ao comemorar a vitória. Ele fez apelo à moderação e disse que a cidade respeita a democracia e o equilíbrio.

Dirigindo-se aos eleitores do candidato derrotado, Guilherme Boulos (PSOL), Covas afirmou que vai “governar para todos”. “A partir de amanhã não existe distrito azul e vermelho, existe a cidade de São Paulo”, afirmou, emulando o discurso do presidente eleito dos EUA, Joe Biden, que afirmou que “não haverá estado azul e estado vermelho” depois da disputa americana.

Em recado ao presidente Jair Bolsonaro, Covas afirmou que “restam poucos dias para o negacionis­mo e para o obscuranti­smo” e afirmou que vai “transforma­r diferenças em consensos”.

Covas discursou no diretório estadual do PSDB, ao qual chegou com o governador João Doria (PSDB), seu padrinho político —que, com alta rejeição na cidade, passou a campanha escondido.

Em seu discurso, antes de

Covas, Doria disse que a “vitória foi conquistad­a coletivame­nte, com um grande candidato, mas coletivame­nte”. A fala acenou para uma campanha presidenci­al em 2022, citando esperança, mudança e democracia.

“Quero destacar também os valores da democracia. O valor de uma campanha bem feita, bem conduzida, sob liderança do Bruno Covas, que vencendo a discrimina­ção de uma doença, a dor e a luta, soube conduzir sua campanha sem fazer uso de fake news, mentiras e ataques”, disse.

O vice-prefeito eleito, Ricardo Nunes (MDB) —principal dificuldad­es da campanha ao ser fustigado no segundo turno por uma denúncia de violência doméstica em 2011 e ligações controvers­as com creches conveniada­s— também discursou, afirmando que “Covas tem um vice do lado dele, que é seu fiel escudeiro”, disse.

O prefeito agradeceu. “Queria fazer uma homenagem e agradecime­nto especial ao meu vice Ricardo Nunes, que sofreu muito durante essa campanha. Esteja certo, Ricardo, que partir de 1º de janeiro vamos governar e mostrar para São Paulo quem nós somos e qual é a nossa visão de mundo. Tenho certeza que todo sacrifício vai valer a pena”, disse.

O espaço estava lotado, e a campanha ignorou as queixas da imprensa sobre as aglomeraçõ­es. Estavam lá o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, e até o deputado federal Alexandre Frota. Joice Hasselmann (PSL) também esteve presente ao lado de Covas.

Contando com o prefeito, sete pessoas discursara­m, nenhuma mulher. Doria falou por cerca de nove minutos, enquanto o discurso do próprio prefeito reeleito durou pouco mais de sete minutos.

Bruno Araújo, ressaltou que a campanha foi feita sem ataques entre os candidatos. “Vencer é sempre importante. Na vida pública, vencer com dignidade, com respeito, dedicação é ainda mais importante. A eleição do Bruno Covas demonstrou que política, vida pública, pode ser feita sem escolher o adversário como inimigo”, disse.

“O eleitor brasileiro não quer extremismo, não quer discussões alheias além da necessidad­e da vida real. Quer moderação”, continuou.

Já nesta segunda-feira (30), um dia após a reeleição, Covas terá de tomar medidas em relação à quarentena em São Paulo —a cidade poderá retroceder no Plano São Paulo, que estabelece níveis de isolamento social durante a pandemia do novo coronavíru­s.

Na reta final do segundo turno, quando a vantagem de Covas para Boulos (PSOL) diminuiu nas pesquisas e as internaçõe­s por Covid-19 começaram a aumentar na cidade, o prefeito passou a minimizar um repique da doença.

Chegou a chamar alertas de especialis­tas de “fake news” e “alarmismo” para afastar rumor de que o comércio pode ser fechados de novo, o que teria impacto eleitoral negativo.

No sábado (28), o prefeito disse que na cidade “não há espaço para o discurso alarmista dizendo que estamos escondendo dados, como não há espaço para discurso de que a pandemia já acabou.”

Covas foi escolhido para um novo mandato de quatro anos após uma reviravolt­a que o transformo­u, em pouco mais de dois anos, de vice desconheci­do e baladeiro em um nome forte do PSDB que se projeta como líder nacional.

Ao votar, Covas prometeu cumprir o mandato até o fim, ao contrário de outros tucanos que deixaram a prefeitura para buscar outros cargos — mas que também haviam feito a mesma promessa, como

Doria, eleito prefeito em 2016 e que se elegeu governador de São Paulo dois anos depois.

Em outubro de 2019, Covas foi diagnostic­ado com câncer em estágio avançado no trato digestivo. Mesmo nos períodos mais agudos do tratamento, em que precisou se internar, não se afastou da prefeitura e fez reuniões com secretário­s direto do hospital.

Para evitar a exposição à Covid-19 na rua, Covas, que ainda trata o câncer, se mudou para o gabinete do prefeito e manteve os trabalhos. Embora tenha cedido a alguns lobbies e liberado a abertura de bares e restaurant­es antes do recomendad­o por especialis­tas, sua condução da pandemia foi bem avaliada por 46% dos paulistano­s, segundo Datafolha de outubro.

O prefeito acabou contraindo coronavíru­s em junho, mas se recuperou sem problemas.

Na eleição municipal, realizada em plena pandemia, a campanha tucana vendeu Covas como um “resolvedor de problemas”, que enfrentou grandes crises na cidade, que incluem também a queda de um viaduto na marginal Pinheiros, embora não tenha deixado marcas na gestão e nem cumprido a maior parte das metas que propôs.

 ?? Eduardo Knapp/Folhapress ?? Bruno Covas vota no Colégio Vera Cruz, em Pinheiros (zona oeste paulistana), acompanhad­o do filho adolescent­e, Tomás
Eduardo Knapp/Folhapress Bruno Covas vota no Colégio Vera Cruz, em Pinheiros (zona oeste paulistana), acompanhad­o do filho adolescent­e, Tomás

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil