Folha de S.Paulo

Revés é ápice de derrota bolsonaris­ta em sua principal base eleitoral

- Catia Seabra e Italo Nogueira

rio de janeiro A tentativa de reeleição frustrada de Marcelo Crivella (Republican­os) com uma larga vantagem do prefeito eleito Eduardo Paes (DEM) é o selo da derrota do bolsonaris­mo em sua base eleitoral, o Rio de Janeiro.

A diferença significat­iva de votos na capital expõe não apenas o teto baixo do apoio do presidente Jair Bolsonaro na capital, mas também simboliza o fracasso de quase todas as apostas da família presidenci­al no estado.

Ao mesmo tempo em que viu Crivella naufragar, a família Bolsonaro viu derrotados seus aliados em toda a região metropolit­ana e principais colégios eleitorais.

Em Niterói, Allan Lyra (PTC) teve apenas 9,4% dos votos válidos no primeiro turno. Em Cabo Frio, o deputado Dr. Serginho (Republican­os), forte aliado do senador Flávio Bolsonaro (Republican­os) e que também contou com manifestaç­ão de apoio do presidente, perdeu com 33,8% dos votos válidos.

Em São João de Meriti, o policial rodoviário federal Charlles Batista (Republican­os), também forte aliado do senador, ficou em quarto lugar, com 12,6% dos votos.

Em São Gonçalo, segundo maior colégio eleitoral do estado, o candidato preferido da família, Roberto Sales (PSD), não foi ao segundo turno, ao obter apenas 2,5% dos votos válidos. No segundo turno, para tentar evitar a vitória do petista Dimas Gadelha, o presidente se engajou pessoalmen­te na candidatur­a de Capitão Nelson (Avante), gravando um vídeo para o vereador. Tiveram uma vitória apertada.

A vitória em São Gonçalo representa o único suspiro do bolsonaris­mo, ao evitar o cresciment­o da esquerda que faz uma oposição mais frontal ao governo federal.

Gadelha contou com o apoio dos prefeitos das cidades vizinhas Rodrigo Neves (PDT), de Niterói, e Fabiano Horta (PT), de Maricá, e formaria um “cinturão vermelho” na região, com pretensões de articulaçã­o para a disputa estadual.

A atuação dos representa­ntes da família Bolsonaro foi discreta no estado. Principal articulado­r político do grupo, Flávio se recolheu em razão da denúncia de que foi alvo pelo caso da “rachadinha” em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativ­a.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL) assumiu o papel de representa­nte do clã e gravou vídeos para os candidatos de Niterói, São Gonçalo e Cabo Frio.

As apostas que deram certo fazem parte da articulaçã­o pragmática de Flávio com nomes do MDB sem apoio ideológico ao bolsonaris­mo.

Na pré-campanha, o senador caminhou com o prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis (MDB), reeleito e que tomará posse com base num efeito suspensivo de inelegibil­idade dado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Flávio também se aproximou do prefeito reeleito de Belford Roxo, Waguinho (MDB), e de Angra dos Reis, Fernando Jordão (MDB).

Os três, porém, são prefeitos que podem se alinhar em 2022 ao sabor do vento, sem representa­r uma aliança fiel.

O estafe de Crivella avalia que a presença de Bolsonaro foi importante para garantir a presença do prefeito no segundo turno. Era uma base suficiente para superar os demais adversário­s.

No segundo turno, o prefeito radicalizo­u o discurso bolsonaris­ta, com doses de proselitis­mo religioso.

O discurso não atraiu nem sequer a base evangélica de eleitores de Crivella. As três pesquisas realizadas pelo Datafolha não mostraram qualquer variação neste grupo após a adoção da estratégia.

A derrota acachapant­e do bispo licenciado da Igreja Universal não pode ser atribuída apenas ao fracasso de Bolsonaro. O atual prefeito tem uma gestão mal avaliada há ao menos dois anos.

Não é também uma reflexo exato das eleições presidenci­ais, em 2022. Representa, contudo, um teto baixo na transferên­cia de votos do presidente para aliados.

O naufrágio dos neófitos que contaram com o apoio da família também mostra que o toque mágico de 2018, que elegeu Wilson Witzel (PSC) apenas com um aceno de Flavio e sem qualquer declaração do presidente, é uma miragem do passado.

Mas o sinal mais eloquente da queda de prestígio do presidente em sua base eleitoral é a queda de 30% na votação de Carlos Bolsonaro (Republican­os) para o sexto mandato como vereador.

O filho do presidente também perdeu o título de vereador mais votado da cidade para Tarcísio Motta (PSOL).

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