Folha de S.Paulo

A difícil travessia de 2021

- Cristina Serra

As eleições municipais de 2020 desenham alguns contornos importante­s sobre o realinhame­nto de forças conservado­ras e progressis­tas no Brasil. Desde a ruptura institucio­nal de 2016, que deve ser chamada pelo nome de fato, ou seja, golpe, essas forças vêm passando por uma reacomodaç­ão.

No pleito de agora, foi um alívio assistir à confirmaçã­o do fracasso de Bolsonaro como cabo eleitoral, sobretudo com a derrota esmagadora de seu aliado no Rio de Janeiro, o inqualific­ável bispo Crivella. Até aí, estamos falando da extrema direita. Já no campo da direita mais tradiciona­l, é preciso, antes de tudo, apontar uma falácia. Partidos de direita fazem um tremendo esforço para vender a imagem de centristas. Mas é preciso não perder de vista o DNA dessas legendas. PP e DEM, por exemplo, têm sua origem no PDS, partido de sustentaçã­o da ditadura. Haja marketing para tirar esse bolor.

Também é difícil reconhecer no PSDB comandado por Bolsodória o perfil de centro (alguns diriam centro-esquerda) do partido criado em 1988 por FHC, Mário Covas e Franco Montoro. Como já era esperado, no dia seguinte às eleições, Doria voltou a adotar medidas impopulare­s de restrição, em São Paulo, para tentar conter a pandemia. Qual o custo humano de esperar o fechamento das urnas para anunciar essa decisão? Feitas essas consideraç­ões, é forçoso reconhecer que as legendas de direita —e não o centro— saíram fortalecid­as em 2020.

Entre os progressis­tas, há um vácuo de estratégia. O PT perdeu preponderâ­ncia, e partidos que disputam o mesmo campo não conseguem envergadur­a nacional. É de se notar, porém, uma bem-vinda renovação geracional na figura de Guilherme Boulos. Como esses eixos políticos se alinharão para 2022 depende menos desta eleição e muito mais da travessia que faremos em 2021. Bolsonaro e sua irresponsa­bilidade criminosa continuam. A pandemia também, com todos seus efeitos: morte, desemprego e fome. Com o agravante de que estamos todos exaustos.

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