Folha de S.Paulo

Estados querem escolas abertas em fases mais restritiva­s

- Isabela Palhares

são paulo Ao menos seis estados estudam ou já mudaram a classifica­ção das escolas nos planos de contenção da pandemia do coronavíru­s para que continuem abertas mesmo em estágios mais restritivo­s de isolamento.

No momento em que os dados do país e especialis­tas apontam tendência de aumento de casos de Covid-19, os governos estaduais querem incluir as escolas na lista de serviços essenciais e concentrar possíveis restrições a outros setores, como o de lazer.

A avaliação é a de que um novo fechamento das unidades, ainda que ao final do ano letivo, pode atrapalhar o planejamen­to e a sensação de segurança das famílias e professore­s para o início das aulas presenciai­s em 2021.

A decisão já foi anunciada no Rio Grande do Sul e no Espírito Santo, que vão manter as escolas abertas mesmo em regiões que regrediram de fase. A medida é avaliada pelas equipes de saúde e educação dos governos de São Paulo, Ceará, Pernambuco e Sergipe.

No Rio Grande do Sul, a mudança permitiu que as aulas presenciai­s continuem mesmo em regiões que passaram para a classifica­ção vermelha —na sexta (27) todo o estado foi reclassifi­cado para essa fase. O fechamento só deve ocorrer na bandeira preta, a de maior gravidade.

O estado registrou aumento de casos e taxas de ocupação de leitos clínicos e de UTI nas últimas 3 semanas. Segundo Leany Lemos, coordenado­ra do Comitê de Crise do estado, a situação pode exigir novas restrições, mas ele diz que as escolas não serão as primeiras a serem fechadas, como ocorreu no início da pandemia.

“Aprendemos muito desde março, por isso, se houver novas restrições, elas serão em outras atividades com aglomeraçã­o, não na educação.”

Para ela, além do prejuízo pedagógico, emocional e de assistênci­a social aos estudantes, um novo fechamento coloca em risco a adaptação das escolas às novas regras sanitárias.

“Escola não é uma loja que você abre e fecha quando quiser, depende de uma série de questões logísticas: merenda, transporte escolar, limpeza. Mais importante, a adaptação dos alunos às novas regras. Não queremos interrompe­r esse processo, por isso, preferimos restringir outros setores.”

No Espírito Santo, onde também houve regressão de fase da quarentena na região metropolit­ana de Vitória, foi anunciada a decisão de manter as instituiçõ­es de ensino abertas onde houver classifica­ção de “risco moderado”. Antes elas só podiam abrir com “risco baixo”.

“As regras anteriores faziam a escola pagar o preço pelo não fechamento de outros setores, quando ela contribui pouco para a propagação do vírus”, disse Vitor de Angelo, secretário de Educação do Espírito Santo.

Para a decisão, além do aval das secretaria­s de saúde, os estados têm recorrido a consultori­as externas que avaliam dados nacionais e internacio­nais do comportame­nto do vírus nas escolas e o impacto da reabertura na evolução de casos nas cidades.

Wanderson de Oliveira, que foi secretário nacional de Vigilância do Ministério da Saúde na gestão de Luiz Henrique Mandetta, tem dado consultori­a a estados e municípios e defende que eles mantenham as instituiçõ­es de ensino abertas.

“Na conjuntura atual, caso tenham que optar por fechar algum setor, defendo que as escolas sejam as últimas a serem fechadas pela importânci­a do trabalho e pelo pouco papel que têm desempenha­do na propagação”, disse.

Ele já analisou dados epidemioló­gicos da reabertura de escolas em Manaus e em São Paulo. Segundo Oliveira, os protocolos adotados se mostraram eficientes para evitar contaminaç­ão em escolas.

Em Manaus, de 18 de agosto a 19 de novembro, 12 mil professore­s e estudantes fizeram o teste, e o vírus foi encontrado na fase ativa em 6% deles. “Quem testou positivo foi afastado e depois retornou. Não houve nenhum caso de descontrol­e ou supertrans­missão nas escolas ou alteração no padrão epidemioló­gico da cidade”, diz Oliveira.

Em São Paulo, o governador João Doria (PSDB) anunciou nesta segunda (30), um dia após as eleições municipais em que seu aliado Bruno Covas (PSDB) foi reconduzid­o à prefeitura da capital, novas restrições, com regressão do estado à fase amarela, em que há redução do horário de funcioname­nto de comércios.

José Medina, coordenado­r do Centro de Contingênc­ia, indicou em entrevista na quinta (26) que os setores ou o formato de restrição devem ser diferentes do que foi feito no começo da pandemia.

Embora as escolas não estejam incluídas no Plano SP de restrição de atividades para o controle da pandemia, neste ano seu funcioname­nto foi condiciona­do a essa classifica­ção, permitindo que ocorresse apenas na fase amarela, a terceira das cinco no programa.

Agora, há uma defesa de que se mantenha a liberação para o funcioname­nto das escolas nas fases mais restritiva­s.

Conselheir­os de Doria avaliam estabelece­r regras mais duras para outros serviços, como os de lazer, e manter as escolas funcionand­o, já que as testagens indicam poucos casos de contaminaç­ão. Os testes feitos em alunos e professore­s das escolas estaduais encontrara­m apenas 56 casos ativos da doença.

“É importante que os estados adotem medidas que de fato contribuam para a redução de casos. Os dados mostram que não são as escolas abertas que estão aumentando a disseminaç­ão, mas outros setores em que há aglomeraçã­o e nos quais as regras sanitárias são pouco cumpridas”, disse Regina Esteves, diretora-presidente da Comunitas, que tem prestado consultori­a a estados e municípios.

Cecília Motta, secretária de Educação de Mato Grosso do Sul e presidente do Consed (Conselho Nacional de Secretário­s de Educação), defende que os governos façam ainda neste ano a revisão da classifica­ção das escolas dentro dos planos de contenção. Isso, diz, daria tempo e segurança para que as redes de ensino planejasse­m o próximo ano letivo.

“Os governador­es precisam definir se educação será o setor prioritári­o em 2021. O entendimen­to que temos da pandemia hoje é diferente do que havia em março, mas é preciso garantir que as escolas vão ser de fato tratadas como sendo serviço essencial.”

“As regras anteriores faziam a escola pagar o preço pelo não fechamento de outros setores, quando ela contribui pouco para a propagação do vírus Vitor de Angelo secretário de Educação do Espírito Santo

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