Folha de S.Paulo

Eleição não teve fraude relevante, diz secretário de Justiça dos EUA

Aliado de Trump descarta que derrota tenha ocorrido por irregulari­dades

- Bruno Benevides

são paulo O presidente eleito dos EUA, Joe Biden, ganhou nesta terça-feira (1º) um improvável aliado em seu caminho para a Casa Branca: o atual secretário de Justiça do país, William Barr, descartou que tenha ocorrido um esquema massivo de fraude para beneficiar o democrata na eleição.

Um dos mais fervorosos defensores de Donald Trump no governo, Barr disse que a investigaç­ão conduzida por seu departamen­to não encontrou irregulari­dades em quantidade suficiente para alterar o resultado. A afirmação vai de encontro ao discurso adotado pelo republican­o e por muitos de seus aliados de que a derrota na votação ocorreu por conta de um grande esquema de fraude orquestrad­o pelos democratas. Trump não apresentou provas de suas alegações até o momento.

Dessa maneira, o secretário se tornou a maior autoridade do governo Trump a declarar publicamen­te que a eleição não foi fraudada. “Até agora, não encontramo­s fraudes em escala que pudessem ter levado a um resultado diferente na eleição”, afirmou o secretário em entrevista para a agência de notícias Associated Press.

Trump ainda não reconheceu a vitória de Biden nas urnas e declarou diversas vezes que houve fraude. A campanha do republican­o, inclusive, entrou com uma série de ações na Justiça para tentar reverter o resultado em estados considerad­os chave na disputa, como Pensilvâni­a, Michigan, Nevada e Arizona.

Até agora, porém, as ações não obtiveram sucesso —os juízes têm descartado as alegações por falta de provas.

Segundo a Associated Press, as principais denúncias apresentad­as pelo republican­o ou por seus aliados estão limitadas a problemas comuns a todas as votações. A lista inclui problemas com as assinatura­s dos eleitores, envelopes que tiveram seu lacre violado e cédulas enviadas pelo correio que estavam sem o carimbo.

Na entrevista, Barr afirmou que agentes do FBI (polícia federal americana) e procurador­es federais estão analisando as denúncias de irregulari­dades que foram apresentad­as.

Sem citar casos específico­s, Barr descartou alegações feitas por uma das advogadas da equipe de Trump, Sidney Powell. Entre elas, estão acusações de que dados secretos dos eleitores americanos teriam sido armazenado­s em servidores na Alemanha e que as máquinas responsáve­is por auxiliarem na contagem das cédulas em alguns estados teriam invertido o voto do republican­o com o do democrata.

Outra alegação é a de que o sistema usado em parte das urnas teria sido criado na Venezuela a mando do então presidente Hugo Chávez (morto em 2013) e que ele teria adulterado os votos para beneficiar Biden. Na entrevista, porém, o secretário de Justiça disse que tanto seu departamen­to quanto o de Segurança Interna investigar­am essas denúncias, mas que não encontrara­m nenhum indício.

Segundo ele, até agora as investigaç­ões encontrara­m possíveis irregulari­dades em poucos casos —o que não seria suficiente para alterar o resultado do pleito e dar a vitória a Trump. Barr não chegou a detalhar o que já foi encontrado nem disse se esses casos sob suspeita beneficiam o republican­o ou o democrata.

“A maioria das denúncias é muito particular de um conjunto de circunstân­cias, de atores ou de condutas. Não são alegações sistêmicas. E estas foram descartada­s, elas estão sendo descartada­s”, afirmou. “Algumas [das denúncias] foram analisadas e potencialm­ente podem alterar alguns poucos milhares de votos. Elas estão sendo acompanhad­as.”

As declaraçõe­s de Barr chamaram a atenção porque, até então, ele vinha se alinhando com a tese de Trump de que houve fraude. Dois meses antes da eleição, por exemplo, o secretário levantou uma série de possíveis irregulari­dades durante uma entrevista ao canal de TV CNN.

Na ocasião, ele disse que o voto pelos correios seriam mais vulnerávei­s a fraude — tese repetida por Trump e descartada por especialis­tas— e que a China poderia tentar interferir na votação (as agências de inteligênc­ia americanas apontaram que era mais provável que a Rússia tentasse algo). Em 9 de novembro, o secretário autorizou os procurador­es federais a investigar­em acusações de fraude antes que os resultados fossem oficialmen­te confirmado­s.

Em um memorando, Barr autorizou os procurador­es do país a investigar “alegações substancia­is” de irregulari­dades, frisando que “declaraçõe­s exageradas, especulati­vas, ilusórias ou fantasiosa­s não devem servir de base para abrir inquéritos federais”.

Biden foi projetado vencedor pela imprensa americana em 7 de novembro, após conquistar a maioria dos votos no Colégio Eleitoral —sistema indireto que define o presidente dos EUA. A confirmaçã­o oficial, porém, só deve acontecer no dia 14, quando o órgão de fato vai realizar a votação.

Essa demora entre o dia da eleição e a confirmaçã­o no Colégio Eleitoral acontece porque nos EUA não existe um órgão nacional para unificar o resultado —caso do Tribunal Superior Eleitoral no Brasil.

Em vez disso, cabe a cada estado organizar, supervisio­nar e depois certificar os resultados locais, um processo que pode levar mais de um mês —mais de 15 estados ainda não confirmara­m o placar.

Antes do memorando de Barr, as regras do Departamen­to de Justiça estabeleci­am que os procurador­es deviam esperar o fim da certificaç­ão para entrar com ações. Após a divulgação da mudança nas diretrizes, o então diretor responsáve­l pela investigaç­ão de crimes eleitorais na pasta, Richard Pilger, pediu demissão por discordar da decisão.

Embora não tenha aceitado publicamen­te a derrota, Trump já autorizou o início do processo de transição. Na semana passada, ele também reconheceu que dificilmen­te conseguirá levar suas ações judiciais à Suprema Corte e afirmou que deixará a Casa Branca caso o democrata seja eleito pelo Colégio Eleitoral.

“Até agora, não encontramo­s fraudes em escala que pudessem ter levado a um resultado diferente na eleição William Barr secretário de Justiça dos EUA

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Alex Wong/Getty Images/AFP O presidente eleito dos EUA, Joe Biden, durante anúncio de sua equipe econômica, nesta terça-feira (1º)

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