Uma em cada dez Câmaras do país terá vereadores de apenas dois partidos
Fim das coligações para a escolha no Poder Legislativo reduziu a fragmentação partidária em pequenas cidades pelo país
salvador e são paulo Em Anguera, na Bahia, PL e Podemos vão travar as disputas políticas dentro da Câmara Municipal. Na alagoana Murici, MDB e PSDB dividirão os nove assentos do Legislativo. Em Mata Roma, no Maranhão, DEM e PC do B vão polarizar as disputas a partir de 2021.
As eleições municipais definiram um cenário de bipartidarismo replicado em uma de cada dez Câmaras do país. De acordo com levantamento da Folha, 550 municípios brasileiros terão só dois partidos com representação no Legislativo a partir do próximo ano.
O cenário é resultado do fim das coligações nas eleições proporcionais. A medida, aprovada na reforma eleitoral de 2017, teve como principal consequência a redução no número de partidos representados por vereadores nas pequenas cidades.
Os dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), compilados pelo professor e pesquisador Fernando Meireles, da Universidade Federal de Minas Gerais, apontam diminuição substancial da fragmentação partidária nas cidades com até 20 mil eleitores.
A maior parte das que terão só dois partidos na Câmara está no Nordeste —são 381 cidades ao todo. O Piauí é o estado em que mais municípios terão esse perfil: 87 de 224.
Legendas com perfil fisiológico como PP, MDB e PSD serão as mais representadas nas Câmaras bipartidárias. A polarização entre MDB e PP é a mais comum e se repetirá em 51 cidades, 23 delas no Rio Grande do Sul.
Em geral, as duas principais forças políticas dos municípios se dividiram em duas siglas já no registro das candidaturas.
Em Anguera, cidade de 11 mil habitantes no sertão da Bahia, todos os candidatos a vereador se filiaram ao PL ou ao Podemos, as legendas dos dois candidatos a prefeito. Foram só 25 candidatos disputando as nove vagas.
“Política em cidade do interior não tem muito esse negócio de ideologia, né? Foi fácil convencer todo mundo do grupo a vir para o meu partido. Quem não viesse ia ter dificuldade de se eleger”, diz o prefeito eleito da cidade, Mauro Vieira (PL).
A legenda acabou servindo como guarda-chuva para grupos heterogêneos. O vereador reeleito Reginaldo Figueiredo (PL) veio do PT, partido ao qual era filiado desde 2011.
“Eu era o único candidato do PT na cidade. Sem a coligação, ia precisar do dobro de votos para me eleger. A alternativa foi mudar de partido, fiquei no PT até onde deu”, diz.
Entre os demais vereadores eleitos em Anguera pelo PL, Regininha de Zé Luís veio do MDB, Crispim da Caçamba era do PSB e Felipe Vieira, do Podemos —que hoje abriga o grupo político adversário.
Ironicamente, o único vereador que tinha sido eleito pelo próprio PL em 2016 e disputou a reeleição nele, Carlinhos Sampaio, acabou ficando na primeira suplência.
Mas nem sempre as siglas que polarizam a disputa majoritária são os mesmos na proporcional.
Em Mata Roma, cidade de 17 mil habitantes do Maranhão, o prefeito eleito Besaliel venceu pelo PDT, mas toda a sua base de vereadores disputou pelo PC do B. A estratégia, contudo, parece não ter dado muito certo: ele terá apenas quatro dos 11 vereadores.
A estratégia foi adotada em Telha (SE), mas com sucesso. O prefeito Flávio Dias se reelegeu pelo PSD, mas sua base terá cinco dos nove vereadores, todos eleitos pelo MDB.
Outra cidade que terá apenas dois partidos na Câmara a partir de 2021 é Murici, principal reduto eleitoral da família Calheiros em Alagoas.
Sobrinho do senador Renan Calheiros (MDB), o prefeito Olavo Neto (MDB) se reelegeu com margem apertada: teve 52% contra 48% de Caubi de Freitas (PSDB). Mas terá sete dos nove vereadores, todos eleitos pelo MDB. A bancada tucana terá os outros dois assentos.
Em outras 14 cidades, o afunilamento partidário foi ainda mais drástico: apenas um partido ocupará todas as cadeiras da Câmara Municipal.
É o caso, por exemplo, de São Pedro dos Crentes (MA), cidade com maior proporção de evangélicos do Nordeste e uma das 42 onde o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) venceu na região em 2018.
Com cerca de 5.000 habitantes, a cidade surgiu a partir de uma fazenda da Assembleia de Deus, maior denominação evangélica do país.
Na década de 1940, a propriedade foi dividida em lotes doados para famílias evangélicas que vieram de fora colonizar a região.
Na eleição deste ano, São Pedro dos Crentes elegeu todos os nove vereadores pelo PSL e reelegeu com 90% dos votos o prefeito Lahesio Bonfim, da mesma sigla, que governará sem oposição.
A pax são-pedrense começou a ser desenhada ainda no primeiro mandato de Lahesio, quando ele costurou um acordo com os derrotados na eleição de 2016, que migraram para sua base.
Há quatro anos, os nove vereadores foram eleitos por quatro partidos diferentes, sendo dois vereadores da oposição. Ainda assim, o prefeito conseguiu aprovar por unanimidade todos os projetos enviados à Câmara Municipal.
No único projeto polêmico da legislatura, a criação da Previdência municipal, o prefeito venceu na Câmara com seis votos a favor e três abstenções.
“A expectativa agora é um mandato ainda mais tranquilo”, afirma Lahesio, que já anunciou que vai deixar o cargo em 2022 para disputar o Governo do Maranhão, alinhado a Bolsonaro.