Folha de S.Paulo

A epidemia volta a atacar o varejo

Donos de restaurant­es, salões de beleza e academias sentem o baque em novembro

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA) vinicius.torres@grupofolha.com.br

Donos de restaurant­es, do comércio de comida e bebida em geral, de salões de beleza e de academias de ginástica sentiram um baque em novembro, ouve-se na cidade de São Paulo e do Rio de Janeiro.

São “evidências anedóticas”, como dizem economista­s, casos, porque ainda não há estatístic­as da situação geral dos negócios no mês passado. Mas não deu para encontrar empresário desses serviços animado com o faturament­o, seja em restaurant­es caros ou do trivial do almoço do dia a dia.

Ao contrário, há gente que viu retração forte, em contraste agudo com outubro.

Muitos atribuem a queda às notícias de que mais gente foi parar nas UTIs por causa da Covid. Alguns dizem que “o povo” voltou a ficar sem dinheiro. Outros observam que não se sabe o que vai ser da economia na virada do ano, pensando também na própria atitude como consumidor­es. Melhor jogar na retranca.

Os empresário­s ouvidos não mencionara­m o possível efeito da alta de inflação, que na média não parece significat­iva, mas foi de quase 20% de um ano para cá quando se trata do preço de comer em casa.

A inflação da comida continuará ruim pelo menos até o primeiro bimestre do ano que vem. A inflação média para o consumidor, medida pelo IBGE, deve chegar a 5,5% ao ano, em meados de 2021, segundo as projeções atuais.

Os números mais gerais e objetivos do desânimo já apareceram nas pesquisas de confiança do consumidor e do setor de serviços, que caiu pelo segundo mês seguido em novembro, segundo a FGV. O levantamen­to nacional da Associação Comercial de São Paulo também registrou baixa nos ânimos em novembro.

As expectativ­as pesam: o medo de perder o emprego cresce, o medo de perda de renda é ainda mais forte no caso de quem foi remediado pelo auxílio emergencia­l. Pela primeira vez desde o início da epidemia, a população ocupada aumentara ligeiramen­te em setembro e outubro, dizem as pesquisas do IBGE (Pnad), mas o desemprego e o medo de ficar sem trabalho parecem estar falando mais alto.

Se a epidemia não foi o determinan­te do desânimo em novembro, certamente o será pelo menos neste início de dezembro. O repique do número de doentes e de mortes é inegável, confirmand­o o alerta inicial dos médicos de hospitais privados. No que diz respeito à confiança econômica, não importa muito se o nome seja o incorreto “segunda onda” (pelo menos por ora) ou repique.

Em um mês, o número de internados em UTIs na cidade de São Paulo por causa da Covid-19 cresceu mais de 30%. No estado de São Paulo, 33%.

Na Grande São Paulo, quase 48%. O número estadual de mortes é cerca de 40% maior do que no início de novembro (na média móvel de sete dias). No Rio Grande do Sul ou no Paraná, as autoridade­s falam de medidas mais duras de restrição; há discussões assim em Brasília. A situação é ruim em Santa Catarina e no Rio.

Como era de esperar, ainda assim revoltante, os alertas mais sérios e as medidas de controle estão sendo anunciados depois da eleição municipal. Muitas são suaves, não se sabe se providênci­as mais drásticas teriam resultado e não há notícia de estratégia mais inteligent­es de limitação dos contágios (baseadas em dados, testes, restrições duras localizada­s).

Se o relaxament­o de fins de outubro e começo de novembro for além e maior nas festas de fim de ano, em “baladas” e em aglomeraçõ­es gerais de férias, teremos muito mais do que quedas de confiança no janeiro de 2021, que será também o primeiro mês do fim dos auxílios.

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