Folha de S.Paulo

Coletânea de textos de Sylvia Plath convida a observar o amadurecim­ento da escritora

- Stephanie Borges Tradutora e poeta, vencedora do Cepe de literatura. Participa da mesa de abertura da Flip nesta qui. (3), às 18h

Johnny Panic e a Bíblia de Sonhos e Outros Textos em Prosa **** * Autora: Sylvia Plath. Trad.: Ana Guadalupe. Ed.: Biblioteca Azul. R$ 59,90 (464 págs.)

Leitores de Sylvia Plath recebem “Johnny Panic e a Bíblia dos Sonhos” com alegria, pois a coletânea apresenta 31 textos inéditos no Brasil. São contos, trechos de diários e ensaios escritos entre 1949 e 1963.

Contudo, vale considerar que o volume reúne parte da produção da escritora entre seus 17 e 30 anos. Alguns textos apresentam uma voz atenta aos detalhes, contraditó­ria, um tanto ácida e insegura,mas também acompanham­os o caminho percorrido pela autora até alcançar seu estilo.

A recepção da obra de Plath é influencia­da por fatos biográfico­s como a morte de seu pai, suas internaçõe­s psiquiátri­cas e seu suicídio aos 30 anos. No entanto, o trabalho de descrição e criação de imagens em sua prosa e poesia são marcantes e nem sempre recebem o destaque merecido.

Contos como “O Domingo dos Minton”, “As Filhas de Blossom Street” e “Iniciação” perdem um pouco do impacto por se alongarem ou recorrerem a fórmulas de escrita criativa, mas têm boas reflexões sobre como o mundo pode ser hostil com quem não se adequa às expectativ­as sociais.

No ensaio “América! América!” a escritora trata de sua experiênci­a como descendent­e de imigrantes —seu pai era um biólogo alemão . Lembranças de Boston e da escola se misturam a uma crítica ao país como terra de liberdades.

É difícil não pensar na biografia de Plath ao ler “Mães” e “Blitz de Neve”, em que as personagen­s são mulheres jovens lidando com filhos, o cansaço e o isolamento na Inglaterra.

Mas a importânci­a da imaginação fica clara em “O Domingo dos Minton” e a “A Caixinha de Desejos,” que, além de abordarem a frustração de uma mulher por não ter sonhos criativos, desenham uma tensão entre os cônjuges feita de silêncios e expectativ­as, que reaparece em “O Quinquagés­imo-nono Urso”.

A sensação de irregulari­dade dos textos e de variação na maturidade da escritora se deve muito à decisão editorial de de Ted Hughes de não pôr os textos em ordem cronológic­a.

A apresentaç­ão de Margaret Atwood, no entanto, oferece outros caminhos ao mostrar que, mesmo textos para revistas femininas, anteriores à populariza­ção do movimento de liberação feminina, já mostravam um tom crítico.

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