Insegurança jurídica dificulta atração de capital estrangeiro
Participantes de painel concordam que é preciso focar a estabilidade da legislação, a previsibilidade da regulação e um ambiente seguro para atrair os investimentos necessários para a infraestrutura
Nós temos várias oportunidades, mas também muitos riscos. Não adianta ser simplesmente atrativo, a gente precisa ser competitivo” Ricardo Arten, CEO da BTP (Brasil Terminal Portuário) e conselheiro nacional do Brasil Export Mesmo diante da pandemia, o Brasil demonstra elevado potencial e grande interesse na abertura ao capital estrangeiro para garantir a competitividade” Roberto Escoto, gerente de investimentos da Apex-Brasil O Brasil é estratégico perante os países árabes, sendo considerado como um grande player no setor” Fernanda Baltazar, gerente de Relações Institucionais da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira Os desafios a gente conhece. As oportunidades também são muitas. A gente precisa surfar essa onda.” Fábio Siccherino, diretor da DP World Santos e conselheiro nacional do Brasil Export Nós temos condição e capacidade de abastecer o mundo. O celeiro do mundo está aqui.” José Augusto de Castro, presidente-executivo da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil)
Insegurança jurídica, liberdade econômica, burocracia e regulação excessivas são os quatro pontos de preocupação do setor portuário, nas palavras de Ricardo Arten, CEO da BTP (Brasil Terminal Portuário) e conselheiro nacional do Brasil Export. As queixas são recorrentes, uma vez que esses problemas afetam a competitividade do país e, consequentemente, a atração de investimentos. O tema foi discutido no painel “Capital Estrangeiro em Infraestrutura e a Realidade Pós-Pandemia de Covid-19”, promovido pelo Fórum Brasil Export 2020 na terça-feira (24), em Brasília.
“A gente precisa de estabilidade e previsibilidade” para trazer o investimento estrangeiro, disse Fábio Siccherino, diretor da DP World Santos, também conselheiro do Brasil Export. É o ambiente regulatório que traz a segurança jurídica, apontou Siccherino, que mencionou o exemplo da cobrança da taxa de SSE (Serviço de Segregação e Entrega). O tema passa por discussão na Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), que avalia sobre a necessidade de estabelecer limites sobre essa cobrança.
“Quando você começa a fazer interferência e exigir que serviços sejam oferecidos de graça, o investidor estrangeiro olha isso com muito cuidado”, observou o diretor da DP World, que aproveitou para se posicionar também pela manutenção do Reporto, regime tributário de incentivo a investimentos portuários.
A conclusão, segundo Siccherino, é de que é preciso focar na estabilidade jurídica, na previsibilidade da regulação e em um ambiente atrativo. Esses aspectos parecem ser consenso entre o setor. O gerente de Investimentos da Apex-Brasil, Roberto Escoto, ressaltou essa mesma preocupação por parte do investidor.
“Há muito a fazer no Brasil para melhorar o ambiente regulatório e isso vai ter um impacto muito grande na atração de investimentos”, afirmou, em participação online.
Ainda assim, Escoto destacou as novas perspectivas de investimentos trazidas pelo novo marco regulatório do setor portuário e afirmou que o Brasil tem “a maior carteira de concessões e privatizações do mundo”.
A avaliação é de que o país tem muitas qualidades a oferecer, “um mercado interno pujante, riquezas naturais abundantes e um agronegócio fantástico”, como exemplificou o conselheiro do Brasil Export Mário Povia, diretor de Gestão Portuária da CDRJ (Companhia Docas do Rio de Janeiro), que fez a mediação do painel.
O crescimento contínuo da exportação de commodities mostra que o país tem condições e capacidade de abastecer o mundo, conforme observou o presidente-executivo da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), José Augusto de Castro, também presente ao encontro via online.
Nesse sentido, Fernanda Baltazar, gerente de Relações Institucionais da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, lembrou o potencial do Brasil com a sua experiência e know-how na produção de alimentos halal, ou seja, que cumprem regras específicas para atender à comunidade muçulmana. Além de o Brasil ser considerado um grande player pelo mundo árabe, onde se localizam grandes fundos soberanos, com mais de US$ 2 trilhões em recursos, o país também é o terceiro destino das exportações daquela região.
O papel do Ministério da Infraestrutura e do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) também foi lembrado e elogiado por participantes do painel. Segundo Siccherino, os investimentos estão acontecendo e o país já está se tornando mais competitivo, conforme mostra pesquisa relacionada ao ranking global de competitividade do Fórum Econômico Mundial.
“A grande quantidade de projetos trazidos pelo PPI e pelo Ministério da Infraestrutura é mais um fator de atratividade para o capital estrangeiro”, disse.
Outra oportunidade a ser explorada é “a nossa famosa BR do Mar”, lembrou Eduardo Diogo. Em participação online, o diretor de Administração e Finanças do Sebrae chamou a atenção para o potencial da navegação de cabotagem frente ao fato de que, com uma malha rodoviária correspondente a apenas 20% da norte-americana, o Brasil concentra o seu tráfego predominantemente no serviço rodoviário. Diogo observa que a estrutura para a navegação de cabotagem já vem pronta, “entregue por Deus”, para ser utilizada.
O sentimento geral do painel foi de otimismo. Segundo Povia, os resultados reportados, mesmo em um ambiente tão adverso, foram bastante positivos, assim como os resultados da infraestrutura dentro do Custo Brasil.
Entre os desafios à frente, aponta para a necessidade de reformas estruturais e as mudanças que o Brasil terá que fazer para entrar na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o que também se coloca como uma nova oportunidade ao país para aumentar sua competitividade. Sobre esse ponto, segundo José Augusto de Castro, não é a OCDE que vai mudar para receber o Brasil. Pelo contrário, é o país que mudará para entrar na organização.
Ricardo Arten resumiu a discussão, ao encerrar o debate, com a seguinte mensagem: “Nós temos várias oportunidades, mas também muitos riscos”. De acordo com o apresentador do painel, não basta ser apenas atrativo, é preciso ser competitivo, e para isso é preciso ter uma política de Estado definida. “A gente quer esse capital, precisamos desse capital estrangeiro. Afinal de contas, o governo não tem dinheiro para investir, ponto final.”