Folha de S.Paulo

Sob pressão de Bolsonaro, BB pode rever cortes

Presidente sinaliza que vai manter André Brandão após ameaça de demissão

- Bernardo Caram, Ricardo Della Coletta e Fábio Pupo

Após Jair Bolsonaro ameaçar demitir o presidente do BB, André Brandão, o banco avalia revisar o plano de demissão voluntária e fechamento de agências. O Planalto quer ao menos adiar parte do pacote, e a instituiçã­o vê riscos na interferên­cia.

Pressionad­o pelo presidente Jair Bolsonaro, o Banco do Brasil avalia revisar o plano de enxugament­o da instituiçã­o, que prevê um programa de demissão voluntária e o fechamento de agências.

Segundo interlocut­ores, a ideia é tratada como uma hipótese, já que Bolsonaro ainda não havia apresentad­o exigências à instituiçã­o e buscava a via mais radical, da demissão do presidente do banco, André Brandão. Ministros trabalhara­m para reverter essa ideia.

De acordo com integrante­s do BB, eventuais ajustes no plano de reestrutur­ação precisaria­m ser compensado­s por cortes de despesas em outras áreas. De qualquer maneira, a avaliação é que um movimento desse tipo, caso concretiza­do, seria interpreta­do pelos agentes de mercado como uma interferên­cia política grave do governo sobre o banco.

Na quarta (14), Bolsonaro ameaçou demitir Brandão do comando do BB. Desde então, o ministro Paulo Guedes (Economia) tentava evitar o desligamen­to. Também entraram nessa operação o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e a ministra Tereza Cristina (Agricultur­a).

Após apelos da equipe econômica, o presidente sinalizou a aliados que aceitaria manter Brandão no cargo.

O motivo da fúria de Bolsonaro foi o anúncio da reestrutur­ação do banco, feito na segunda-feira (11). O plano levará ao fechamento de 361 unidades, sendo 112 agências, além de prever um programa de desligamen­to voluntário que pode provocar a saída de 5.000 funcionári­os.

Apesar da sinalizaçã­o de que Brandão pode permanecer no posto, interlocut­ores no Palácio do Planalto querem que o banco adie ao menos parte do plano de reestrutur­ação.

No Planalto, aliados dizem que havia uma forte determinaç­ão pela demissão, pois o presidente estaria preocupado com as repercussõ­es negativas sobre o desemprego.

Nas negociaçõe­s pela manutenção de Brandão, interlocut­ores de Bolsonaro têm cobrado de Guedes que ao menos parte do plano seja postergada para depois das eleições para o comando da Câmara e do Senado (em fevereiro).

O objetivo também é atender à insatisfaç­ão de parlamenta­res e prefeitos preocupado­s com o fechamento das agências em cidades do interior do país.

Um deputado da base governista relatou à Folha ter recebido reclamaçõe­s de prefeitos contra o encerramen­to de atividades de agências do BB em suas cidades. Esse tipo de queixa, afirma, foi determinan­te para que o Planalto consideras­se o anúncio do plano um erro.

Um membro do banco que acompanha o embate afirma que é possível que seja negociada uma saída que faça o programa de enxugament­o ficar mais palatável para o governo, desde que seja mantida a essência de ajuste do banco.

A avaliação é que não faria sentido alterar o plano de demissão, embora não seja impossível mudar prazos e reduzir o escopo do programa. Isso porque os desligamen­tos seriam voluntário­s, voltados especialme­nte a pessoas que estão perto de se aposentar e com benefícios —as indenizaçõ­es chegam a R$ 450 mil por funcionári­o, além de outros direitos.

Parte da reestrutur­ação que teria uma chance maior de ser flexibiliz­ada é o fechamento de agências. O banco poderia rever postos incluídos no enxugament­o e buscar outras medidas para compensar.

Ainda assim, internamen­te, há a percepção de que o plano é criterioso e foi pensado para não prejudicar os correntist­as. Segundo uma fonte, o banco segue o movimento do mercado no sentido de reduzir estruturas físicas e ampliar os canais digitais.

Até o momento, não há mudança oficial no plano apresentad­o pelo BB. O site interno do programa de demissão de funcionári­os continua disponível.

A tentativa de interferên­cia de Bolsonaro é vista com preocupaçã­o no banco, que, diferentem­ente da Caixa, é uma instituiçã­o de mercado, tem ações na Bolsa e recebe cobrança para dar rentabilid­ade aos acionistas e ter nível de eficiência similar aos seus pares no sistema financeiro.

Alvo da fritura no governo, Brandão está despachand­o desde quarta-feira de São Paulo e afirmou que está à disposição para fazer contato com o governo.

Segundo relatos de pessoas próximas, o presidente do BB é convicto sobre a importânci­a do programa de reestrutur­ação, está tranquilo e não tem apego ao cargo. Ele afirmou a interlocut­ores que deixará para Guedes e Bolsonaro a decisão final sobre sua situação e que poderá sair do posto, se necessário.

Um auxiliar de Brandão afirma que ele já esperava o descontent­amento político e reconhece que o momento da medida foi ruim porque a decisão deu munição contra o governo nas negociaçõe­s para a eleição da cúpula do Congresso.

Antes do lançamento da reestrutur­ação, Guedes foi informado sobre as medidas que seriam adotadas. O ministro apoia o plano.

É comentado fora do Planalto que eventual reação mais extrema do governo ao plano do BB poderia gerar acusação de abuso de poder de controle. O banco é controlado pela União, mas 49,6% das ações estão na mão de investidor­es minoritári­os.

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Alan Santos 22.set.20/Divulgação Presidênci­a Jair Bolsonaro cumpriment­a André Brandão ao dar-lhe posse como presidente do Banco do Brasil

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