Plano para substituir forçastarefas esbarra em estrutura
Para Gaecos, que assumirão ações no modelo que PGR quer, há falta de condições
Principal aposta da PGR (Procuradoria-Geral da República) para assumir investigações de forças-tarefas como as da Lava Jato, os Gaecos (grupos de atuação de combate ao crime organizado) não estão estruturados para demandas dessa complexidade, segundo três dos cinco coordenadores desses grupos no MPF (Ministério Público Federal).
Os Gaecos são referência em combate ao crime organizado nos Ministérios Públicos estaduais e tiveram a sua criação possibilitada no MPF por resolução de 2013. O primeiro Gaeco de investigações federais só começou a atuar no início de 2020, em Minas Gerais.
Entre 2013 e 2020, foram as forças-tarefas como as da Lava Jato e da Greenfield que se destacaram com grandes investigações sobre suspeitas de organizações criminosas.
O formato de força-tarefa, porém, é temporário, precisa de renovação constante e é considerado institucionalmente precário pela PGR, atualmente comandada por Augusto Aras. Por isso, há uma transição de investigações desse modelo para os Gaecos, que são permanentes e com integrantes designados para mandatos de dois anos, renováveis.
Desde 2020, a PGR instalou Gaecos nas Procuradorias da República em cinco estados: Paraíba, Amazonas, Pará e Paraná, além de Minas.
Neles, os coordenadores normalmente são eleitos e selecionam para acompanh´´alos um grupo de procuradores locais, que passam por aprovação dos superiores. Os Gaecos dão suporte a outros procuradores do MPF nos estados que precisarem de reforços em apurações de combate ao crime organizado.
O problema que os coordenadores e também a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) aponta é que, ao contrário de boa parte dos Gaecos estaduais, os do MPF não têm estrutura para investigações mais complexas e aprofundadas, como as da Lava Jato.
Os procuradores também não têm, hoje, exclusividade para atuar nos Gaecos e precisam acumular funções. A exclusividade de integrantes das forças-tarefa sempre foi apontada como um dos motivos para o sucesso da Lava Jato.
“Somos seis colegas, ninguém tem dedicação exclusiva, não tem um contador específico para o Gaeco ou um agente da Polícia Federal específico para o Gaeco, que é o que acontece no MP do Amazonas”, diz o coordenador do Gaeco do MPF no Amazonas, Henrique de Sá Valadão Lopes.
“Eles [MP estadual] têm núcleo de inteligência, têm núcleo de diligência, têm núcleo para guardar material apreendido em busca e apreensão. Eles funcionam como um núcleo de investigação mesmo.”
Segundo ele, o trabalho demandado de um Gaeco não é serviço rotineiro. Em grandes investigações, são necessários dedicação e tempo, inclusive para reuniões com outros órgãos, como Receita Federal, PF e Procuradoria da Fazenda.
Para ele, migrar do modelo de força-tarefa para o de Gaeco só dará certo se houver ao menos estrutura similar à disposição das equipes, com servidores e equipamentos como softwares de análises de dados, além da exclusividade.
Na Paraíba, o coordenador do Gaeco do MPF, procurador Tiago Misael, tem as mesmas queixas. O grupo de seis procuradores vai completar um ano e conseguiu viabilizar apenas recentemente, junto à chefia local, um servidor para trabalhar para eles.
“Os Gaecos do MPF ainda estão em processo de sedimentação institucional e conquista de forças para desenvolvermos as expectativas depositadas em nós”, diz Misael.
“Sem estrutura e sem exclusividade, o trabalho vai ser pífio. Ninguém é super-homem”, acrescenta.
Em Minas, o primeiro Gaeco do MPF do país também tem seis integrantes, nenhum deles exclusivo. O coordenador do grupo, procurador Lucas de Morais Gualtieri, diz acreditar que essa formatação é um modelo transitório.
Com a intenção de descentralizar as decisões, a PGR tem apontado que as chefias do MPF nos estados é que devem decidir se darão exclusividade para os integrantes dos Gaecos.
No entanto, nos estados com um número pequeno de procuradores, como Amazonas e Paraíba, os coordenadores acham veem dificuldades na possibilidade de construir um consenso dentro da própria unidade.
Para o presidente da ANPR, Fábio George Cruz da Nóbrega, mesmo que haja mudança no modelo utilizado no MPF, de forças-tarefas para Gaeco, “há pilares que, necessariamente, precisam ser observados para garantir a eficiência dos trabalhos”.
Procurada, a PGR diz em nota que como a criação dos Gaecos é um processo recente, está realizando estudos para a realocação de recursos “considerando os limites orçamentários do MPF, para dar estrutura a esses grupos”.
“Os estudos envolvem levantamento para oferecer aos Gaecos funções comissionadas (servidores exclusivos) e possibilidade de pagamento de Geco (Gratificação por Exercício Cumulativo de Ofício) para os integrantes. Hoje, os recursos disponíveis estão com forças-tarefas”, diz o órgão.
A PGR afirma ainda que o órgão técnico-científico do MPF, a Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise, dará apoio aos Gaecos.
Em relação à exclusividade, diz que ela “fica a cargo da respectiva unidade do MPF, que deve analisar a complexidade dos casos, a necessidade, entre outros fatores”.
“A PGR não nega exclusividade a nenhum membro do MPF, desde que sua unidade tenha concordado em desonerá-lo de suas funções. Toda vez que há uma desoneração, há custos para o MPF —com remanejamento de membros para cobrir as funções deixadas“, afirma.
A PGR diz ainda que o órgão não pode admitir novos membros ilimitadamente devido ao teto de gastos.