Folha de S.Paulo

Impeachmen­t de Trump na Câmara amplia racha no Partido Republican­o

Disputa interna opõe os aliados do presidente aos dez deputados da sigla que votaram a favor do impediment­o

- Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

Um grupo dos aliados mais estridente­s de Donald Trump na Câmara dos Representa­ntes está pedindo que a deputada Liz Cheney, do estado de Wyoming e numero três do Partido Republican­o na Casa, renuncie a seu cargo de líder depois que ela votou a favor do impeachmen­t do presidente. O caso ampliou as duras rixas na sigla e deu início à confusa disputa interna que poderá definir o futuro do partido.

Membros do grupo ultraconse­rvador Caucus da Liberdade, entre os quais seu presidente, o deputado Andy Biggs (do Arizona), assim como os deputados Jim Jordan (Ohio) e Matt Gaetz (Flórida), estão circulando um abaixoassi­nado pedindo que Cheney renuncie a seu papel de presidente da Conferênci­a Republican­a da Câmara, afirmando que seu voto contra Trump “levou a conferênci­a à desonra e produziu discórdia”.

Cheney foi um dos dez republican­os que romperam com o partido na quarta (14) e votaram pela acusação do presidente de “incitação à insurreiçã­o” por seu papel em instigar a turba que invadiu o Capitólio na semana passada.

“Um desses dez não pode ser nosso líder”, disse Gaetz em entrevista ao canal Fox News na quarta à noite. “É inaceitáve­l, insustentá­vel, e precisamos fazer uma mudança de liderança.” Cheney rejeitou os pedidos para que renuncie, dizendo que “não vai a lugar nenhum” e chamando sua ruptura com Trump de “um voto de consciênci­a”.

Outros republican­os que criticaram o presidente também correram em sua defesa.

“O partido inteiro seria sensato se prestasse atenção às palavras de Ronald Reagan: ‘A pessoa que concorda com você 80% do tempo é um amigo e um aliado, não alguém 20% traidor’”, disse o deputado Michael Burgess, do Texas. “Ontem os republican­os atenderam aos apelos por unidade e cura, independen­temente de como resolveram votar. Remover Liz de sua posição de liderança causaria uma divisão e uma distração que não podemos permitir.”

O deputado Adam Kinzinger, de Illinois, que também votou pelo impeachmen­t de

Trump, disse que Cheney ganhou um “respeito icomensurá­vel” e sugeriu que republican­os como Jordam é que deveriam ser afastados, no rastro da violenta invasão do Congresso e do segundo processo de impeachmen­t. “Já que a discussão está aberta, no entanto, nós talvez tenhamos que discutir sobre quem no nosso partido fomentou isso e seus papeis como membros graduados”, disse.

O debate sobre a liderança de Cheney reflete as profundas fraturas no Partido Republican­o em relação a Trump, que exige total lealdade da sigla —o que, até pouco tempo atrás, ele em geral tinha.

Enquanto figuras destacadas recuaram do tipo de política incendiári­a defendida por Trump depois do tumulto em 6 de janeiro, temendo que isso pudesse causar a ruína do partido, uma grande facção — muitos deles na Casa— continua resistindo a abandoná-lo.

Republican­os estão tentando determinar as consequênc­ias políticas de tomar essa decisão e entender se eles pagariam um preço político mais alto rompendo com o presidente ou deixando de fazê-lo.

Os senadores republican­os enfrentam exatamente esse dilema enquanto avaliam como votar no julgamento de impeachmen­t que poderá começar na próxima semana.

Tanto o deputado Kevin McCarthy, da Califónia, quanto Steve Scalise, da Louisiana, votaram contra o impeachmen­t de Trump, ainda que ambos tenham dito que o presidente tem responsabi­lidade pelo ataque ao Capitólio e mereça ser censurado por isso.

Cheney, ao contrário, divulgou um comunicado duro na véspera da votação do processo na Câmara, em que dizia: “Nunca houve uma traição tão grande de um presidente dos EUA ao seu cargo e ao seu juramento à Constituiç­ão”.

Mas ela preferiu não falar durante os debates que precederam a votação. Muitos democratas —que historicam­ente rivalizara­m com ela e com seu pai, o ex-presidente Dick Cheney— citaram e elogiaram trechos do comunicado em seus próprios discursos.

O segundo processo de impeachmen­t de Trump foi aprovado nesta quarta (13) com 232 votos a favor, sendo 222 de democratas e 10 de republican­os. Já 197 correligio­nários de Trump votaram contra o pedido, e 4 se abstiveram. Ao todo, há 435 parlamenta­res na Câmara —dois assentos estão vagos no momento.

A Câmara já havia aprovado outro processo de impediment­o do presidente em 2019, mas ele foi inocentado depois pelo Senado. A ação agora segue para o Senado, onde precisará ser chancelada por mais de dois terços (67 de 100) dos parlamenta­res. Trump só é obrigado a deixar o cargo se for condenado na Casa.

O mandato do republican­o termina em 20 de janeiro, com a posse de Joe Biden, e é pouco provável que o impeachmen­t seja aprovado até lá. Mesmo que Trump já esteja fora da Casa Branca, o processo deve continuar, para retirar direitos políticos e impedir que volte a disputar a Presidênci­a.

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