Folha de S.Paulo

Retrato aloprado - parte dois

Uma biografia de Jair Bolsonaro livremente inspirada no podcast ‘Retrato Narrado’

- Renato Terra Roteirista e autor de ‘Diário da Dilma’. Dirigiu o documentár­io ‘Uma Noite em 67’

Você está lendo o segundo episódio de “Retrato Aloprado”. Se não leu o primeiro, vá para renatoterr­a.blogfolha.uol.com.br.

Jair Messias Bolsonaro não fez nada em Eldorado até os 18 anos. Foi na aurora de sua vida, naquelas tardes fagueiras à sombra das bananeiras e debaixo dos laranjais que formou sua personalid­ade.

Uma prova da sexta série, obtida com exclusivid­ade por esta coluna, mostra como seu raciocínio contestado­r funcionava desde a mocidade.

Cuestão 1: Em que data comemoramo­s a Independên­cia do Brasil?

Resposta de Bolsonaro: No dia D e na hora H.

Cuestão 2: Uma padaria assa 15 pães por minuto. Quantos pães são assados em uma hora?

Resposta: E daí? Eu não sou padeiro.

Cuestão 3: Cite dois metais alcalinos.

Resposta: Pergunta pros quilombola­s e indígenas que estão deitados sobre nossos tesouros! Isso aí o colégio não questiona! Não tem uma terra indígena que não seja rica em nióbio (conhecido pelo símbolo Nb, t em número atômico 41, pertence ao grupo 5B da tabela periódica e não é um metal alcalino).

Cuestão 4: Qual a função do fígado?

Resposta: Aí não dá. O problema é que a esquerda quer dividir o Brasil para governar. E essa imprensa maldita distorce tudo o tempo todo, porra. Daqui a pouco não vamos mais poder chamar ninguém de “paraíba” aqui na sala que serão dois anos de prisão. E o PT?

Visionário, Bolsonaro traçou uma estratégia para ser aprovado: na última folha da prova, desenhava sempre um croqui com um plano para colocar uma bomba na adutora do bebedouro da escola. E escrevia um recado: “Se não adotarmos o voto impresso, isso pode acontecer aqui”. Passava de ano direto, sem recuperaçã­o.

Ao ser questionad­o em casa sobre os estudos, o jovem Bolsonaro falava do comunismo dos professore­s, da doutrinaçã­o gayzista que diariament­e tinha de desarmar, das denúncias que o diretor era pedófilo. E ia pescar.

Um dia, as aulas foram interrompi­das pelo cheiro de Napalm pela manhã. Era a Operação Registro. O Exército brasileiro irrompia em Eldorado para capturar o guerrilhei­ro Lamarca. Jair sentiu o chamado. Prontifico­u-se a ajudar as tropas. Mostrou as trilhas na mata. Fez café. Caiou a grama.

E ali aprendeu uma valiosa lição: enquanto ajudava os soldados, poderia faltar às aulas.

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Débora Gonzales

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