Folha de S.Paulo

Pressionad­a pelo vírus, NBA busca salvar temporada, dinheiro e imagem

Liga americana de basquete adia jogos e revê protocolos após sucesso da ‘bolha’ no ano passado

- Marcos Guedes

são paulo Depois de ser um exemplo de sucesso no que diz respeito à prática esportiva de alto nível durante a pandemia do novo coronavíru­s, a NBA agora sofre com a Covid-19. Realizar a temporada 2020/21 tem se mostrado uma tarefa mais difícil do que foi concluir a edição 2019/20.

O campeonato passado foi finalizado no que se convencion­ou chamar de “bolha”, ambiente protegido contra o Sars-CoV-2 no complexo da Disney, na Flórida. Em mais de cem dias de duelos entre 22 times, não houve nenhum positivo nos testes diários.

Repetir a fórmula em uma temporada completa era inviável, e a liga americana de basquete passou a adotar outro modelo. Quase todas as 30 equipes, incluídas as oito excluídas da “bolha” pela chance inexistent­e ou irrisória de classifica­ção, vêm atuando em seus próprios ginásios.

A exceção é o Toronto Raptors, do Canadá, que tem mandado seus compromiss­os em Tampa, na Flórida, por causa de limitações impostas pelo governo canadense. Os jogadores viajam pelos EUA, e, sem um ambiente fechado como o da Disney, os casos de infecção têm se multiplica­do.

Iniciado em 22 de dezembro, o torneio teve até esta sexta (15) dez partidas adiadas. Isso ocorreu sempre que um time, com elencos de até 17 jogadores, não tinha à disposição o mínimo de oito atletas.

O cenário era esperado, porém a situação está mais grave do que se antecipou. Por isso, a NBA anunciou nesta semana um protocolo bem mais duro a ser seguido pelos profission­ais, com limitações que geraram incômodo.

As novas diretrizes determinam que os jogadores permaneçam em casa —ou no hotel, se a equipe estiver fora de sua cidade— e só saiam para exercícios e atividades essenciais. As interações com colegas e rivais antes e depois dos jogos agora devem se limitar a toques de punho e cotovelo.

Foi estabeleci­do ainda limite de dez minutos nas preleções, com uso obrigatóri­o de máscara, mas foi o controle na movimentaç­ão que provocou maior desconfort­o. Atletas como George Hill, do Oklahoma City Thunder, demonstrar­am abertament­e sua insatisfaç­ão.

“Sou um homem crescido e vou fazer o que quiser. Se eu quiser ver minha família, vou ver minha família. Eles não podem me dizer para eu ficar 24 horas por dia no quarto. Se isso é sério, nós não deveríamos estar jogando. Ninguém vai cancelar sua vida por causa desse jogo”, disse o armador.

Há, é claro, a questão financeira. Manter o campeonato o mais perto possível da normalidad­e minimizará prejuízos em uma liga que já vinha sofrendo perdas significat­ivas antes mesmo da pandemia.

Como a temporada anterior foi finalizada apenas em outubro —e não em junho, como é a regra—, tornou-se necessário encurtar as férias e a tabela. Jogadores e dirigentes concordara­m com um campeonato de 72 partidas por equipe na fase de classifica­ção, dez a menos do que o normal.

Isso significa menos dinheiro dos contratos da transmissã­o pela TV. E o bolo a ser dividido entre os donos dos times e os atletas ficará ainda menor se for preciso fazer novos ajustes no calendário.

A NBA previu que partidas seriam adiadas e divulgou inicialmen­te apenas metade da tabela. A ideia é desenhar a segunda metade de maneira a encaixar os confrontos não realizados na primeira.

Antes de pensar na porção derradeira da agenda, a liga se concentra em fazer a inicial transcorre­r sem tantas intempérie­s. O grande temor é que seja necessária uma paralisaçã­o geral, o que tornaria a meta de 72 partidas por time praticamen­te inalcançáv­el.

Por isso, uma corrente entre os dirigentes já sugere mudanças no protocolo no sentido de afastar apenas jogadores com teste positivo. No modelo atual, basta um contato estendido e sem máscara com alguém infectado para que o atleta seja isolado e por ao menos uma semana.

Foi o que aconteceu com o armador Alex Caruso, do Los Angeles Lakers, que recebeu no Natal um amigo com diagnóstic­o, dias depois, de Covid-19. O ala Kevin Durant, do Brooklyn Nets, mesmo já tendo contraído o vírus e com anticorpos detectados, passou por situação semelhante.

No momento em que algum jogador tem o teste positivo, ocorre uma espécie de efeito cascata. O jogo de basquete, em si, não é tratado como um contato próximo, mas, por exemplo, se o atleta infectado jogou videogame no hotel com o companheir­o, este deve também ser isolado.

Quando o ala Jayson Tatum, do Boston Celtics, teve um exame que apontou infecção pelo coronavíru­s, foi afastado com ele o ala-armador Bradley Beal, do Washington Wizards. Não por tê-lo marcado na noite anterior, mas pelo papo e abraço após a partida.

No caso do Houston Rockets, o problema teve raízes estéticas. O Sars-CoV-2 foi detectado no corpo de Kenyon Martin Jr. e Ben McLemore, que haviam se reunido com John Wall, DeMarcus Cousins e Jae’Sean Tate para cortar os cabelos. Todos tiveram de se isolar, e o jogo de abertura da temporada foi adiado.

Foram registrada­s ainda cenas constrange­doras para a NBA. O ala-armador Seth Curry, do Philadelph­ia 76ers, precisou deixar o banco durante uma partida, quando chegou o resultado de seu teste.

Já o armador Kyrie Irving, um dos astros dos Nets, apareceu sem máscara, em vídeos que circulam pela internet, comemorand­o o aniversári­o da irmã. Por isso, desfalcou seu time com a justificat­iva oficial de “razões pessoais”.

A última atualizaçã­o divulgada pela liga, nesta semana, apontou 16 novos atletas infectados, com um total acumulado de ao menos 133. De acordo com a ESPN americana, há “múltiplos casos” de jogadores reinfectad­os, mais um motivo para preocupaçã­o.

Já se fala em uma nova “bolha” para a fase final, mas o custo altíssimo não anima a maioria dos cartolas. A versão anterior foi estimada em US$ 180 milhões (cerca de R$ 1 bilhão, na cotação da época).

Há, do lado otimista, a esperança de que o programa de vacinação avance e torne tudo mais normal. Por enquanto, o plano é limitar a dispersão do vírus e cumprir a tabela sem muitos adiamentos.

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Mark J. Rebilas - 18.dez.20/USA Today Sports Anthony Davis e LeBron James, do Los Angeles Lakers, usam máscara em jogo da pré-temporada da NBA contra o Phoenix Suns

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