Folha de S.Paulo

Indignação domingueir­a

- Alvaro Costa e Silva

rio de janeiro Para ser ministro da Justiça no atual governo, é preciso ter uma única e bastante ambição pessoal: entrar para o STF. Foi assim com o ex-Super-Homem, Sergio Moro, hoje caído em desgraça entre os adoradores do mito e abertament­e na oposição. No mesmo figurino carreirist­a enquadra-se André Mendonça, que é “terrivelme­nte evangélico” e está de olho na vaga do ministro Marco Aurélio Mello, cuja aposentado­ria compulsóri­a tem data para ocorrer: julho de 2021.

Para chegar ao Supremo, vale tudo. Mas acima de tudo e do Brasil —e talvez acima de Deus— é necessário fazer o que o chefe e seus filhos mandarem. Em pleno domingo, dia dedicado ao descanso e ao culto religioso, vimos Mendonça, dedinhos nervosos, correr para o Twitter e ameaçar abrir um inquérito contra um colunista de opinião que ousou fazer seu trabalho: expressar sua opinião.

Mendonça confirmou que o Ministério da Justiça está acompanhan­do dois projetos de lei, de autoria de deputados bolsonaris­tas e em tramitação na Câmara, que restringem o poder dos governador­es sobre o comando das polícias militares e do Corpo de Bombeiros. A manobra do Planalto aprofunda a crise federativa em que estamos mergulhado­s desde o início da pandemia de coronavíru­s.

Transforma­r a PM numa força armada independen­te, com generais de duas, três e quatro estrelas, é o sonho macabro daqueles que querem um ataque ao Capitólio no Brasil.

Pastor da Igreja Presbiteri­ana Esperança, Mendonça sabe que a esperança de vestir a capa do Batman é a última que morre. Em sua mensagem no Twitter, ele cometeu um lugar-comum: “fundo do poço”. Era a única coisa que fazia sentido. Sobre um dos maiores problemas de segurança do país, a farra criminosa das milícias que agem à solta, não só no Rio como em outros estados, o ministro não dá um pio. É um tema que não merece a indignação dos domingos.

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