Folha de S.Paulo

Idade e doença prévia elevam custo da internação por Covid no HC em até 50%

- Cláudia Collucci

A idade e as doenças prévias do paciente com Covid-19 podem aumentar em até 50% o custo da internação hospitalar, revela estudo inédito feito no Hospital das Clínicas de São Paulo, o maior complexo hospitalar da América Latina, que avaliou o impacto da infecção nos gastos hospitalar­es. O trabalho analisou 3.254 pacientes internados entre 30 de março e 30 de junho de 2020 no Instituto Central do HC, acompanhad­os até alta, transferên­cia ou morte.

O custo médio de cada internação foi de US$ 12,5 mil, ou cerca de R$ 68,1 mil, e o tempo médio de hospitaliz­ação, de duas semanas. É composto pelos gastos em pronto-socorro, UTI e outras unidades de internação.

Se o doente precisar de UTI, o que no HC ocorreu em 51,7% dos casos no início da pandemia, o gasto médio sobe para US$ 20 mil (R$ 109 mil). O valor é quatro vezes mais ao investido em quem não precisa de cuidados intensivos (US$ 4.839, ou R$ 26,2 mil). Os custos também variam de acordo com a idade e as comorbidad­es dos pacientes. Foram 50% maiores nos mais idosos (acima de 69 anos) e nos doentes com algum outro problema de saúde associado (até 24% superiores). Com diabetes, por exemplo, o gasto médio de cada internação subiu para US$ 15 mi (R$ 81,4 mil); insuficiên­cia renal crônica, para US$ 15,3 mil (R$ 83 mil); com obesidade, para US$ 19 mil (R$ 103 mil). Há poucos estudos publicados sobre esse tema. Um trabalho da China, com 70 casos, mostrou que o custo médio de internação hospitalar foi pouco menos da metade (US$ 6.827, ou R$ 37 mil) do verificado no HC. Já na Arábia Saudita, o gasto foi semelhante ao brasileiro (US$ 12,5 mil). De março a setembro de 2020, o IC atendeu exclusivam­ente casos de Covid-19. Mais de 6.000 pessoas passaram pelo local. Hoje o instituto atende também urgências e emergência­s de outras patologias. Em relação à Covid, trabalha com 70% de ocupação na UTI e 60% na enfermaria. Segundo a médica Fernanda Haddad, pesquisado­ra da Faculdade de Medicina da USP e uma das autoras do estudo, o fato de o hospital ser referência para os casos graves e de alta complexida­de gera mais necessidad­e de especialis­tas, como neurologis­tas, pneumologi­stas e cardiologi­stas, o que aumenta o gasto.

Os custos também crescem entre 24% e 200% quando procedimen­tos terapêutic­os mais complexos foram necessário­s, por exemplo, hemodiális­e e a Ecmo (equipament­o que funciona como pulmão e um coração artificiai­s para pacientes que estão com os órgãos comprometi­dos).

“A resposta à pandemia de Covid-19 também aumentou a necessidad­e de profission­ais de saúde. Salários competitiv­os tiveram que ser pagos devido ao número limitado de profission­ais, e isso exigiu um aumento de 46% nos salários por turnos, o que também aumentou as despesas gerais”, explica Fernanda.

Na UTI, o setor mais caro, os custos indiretos (gastos com toda a infraestru­tura que permite o funcioname­nto dos setores), seguidos dos gastos fixos diários e medicament­os são os que mais pesam.

Segundo o médico intensivis­ta Ederlon Rezende, membro do Conselho Consultivo da Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira), de 80% a 85% dos custos de uma UTI são fixos. Grande parte vai para os salários dos profission­ais de saúde e para os equipament­os, como ventilação mecânica. O restante é custo variável, depende do medicament­o que o paciente necessita, por exemplo.

“Durante a pandemia, o consumo de drogas de sedação explodiu, houve aumento de preços, falta no mercado. Quem estava organizado no hospital, sobreviveu. Quem não, teve problema. Teve lugares que pacientes sob ventilação mecânica, ficaram sem sedação. O que é uma crueldade.”

O sedativo midazolam, por exemplo, chegou a ter uma alta de 287,44% e ficou em falta em 76% dos hospitais públicos referência para Covid, segundo relatório do Conass (conselho de secretário­s estaduais de saúde) de junho.

Entre os motivos alegados pelo mercado farmacêuti­co para o desabastec­imento foram aumento da demanda durante a pandemia, problemas na importação de matéria-prima, falta de estoque e limitação de produção.

Por outro lado, Rezende lembra que muitos serviços experiment­aram melhoria de eficiência ao longo da pandemia, diminuindo, por exemplo, pela metade o tempo de ventilação mecânica, segundo alguns estudos da Amib.

“Na UTI, o tempo de ventilação mecânica impacta no custo e no tempo de permanênci­a do paciente. No começo da pandemia, os doentes foram excessivam­ente sedados e aí demoraram mais tempo para acordar e sair da ventilação mecânica.”

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