Folha de S.Paulo

São Paulo sofre ataque de torcedores, empata e completa 5 jogos sem vencer

A goleada do Inter no São Paulo não é causa, mas consequênc­ia de erros políticos

- Juca Kfouri Jornalista e autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP

Seria muito fácil imputar a perda da liderança tricolor ao humilhante 5 a 1 do Inter no Morumbi.

O São Paulo errou demais em campo, Fernando Diniz perdeu o vestiário no choque com Tchê Tchê, Daniel Alves desaparece­u de repente e pronto! Está tudo explicado à vista de todos.

Mas o que mudou mesmo no clube neste ano de 2021?

Mudou o presidente. O novo se chama Julio Casares, executivo bem-sucedido no mundo da mídia, conhecedor das coisas tricolores, mas, com sede demais, quebrou o pote.

Ora, o anterior, o Leco, não ganhou nada, saiu o seis entrou o meia-dúzia, dirá o observador distante.

Por dessas ironias do futebol, não é bem assim. Quem não ganhou nada deixou o time com confortáve­l folga no topo da tabela do campeonato. Com Raí e sua equipe, enfim, caminhando rumo à taça pretendida há 12 anos.

Chegou o novo presidente, manteve Raí, que errou ao aceitar permanecer com os desfalques feitos em sua equipe, e trouxe Muricy Ramalho, símbolo do que houve de melhor no passado recente do tricolor, mas garantia nenhuma de estabilida­de no presente e de visão para o futuro.

De quebra, Daniel Alves, o comandante dentro do gramado, começou a ouvir que sua contrataçã­o foi um equívoco, que custa muito caro, que isso e que aquilo e o futebol dele sumiu, a liderança dele se encolheu, os garotos para os quais dava confiança se intimidara­m e os resultados vieram: eliminação da Copa do Brasil sem incomodar o Grêmio no jogo de volta, goleada do Bragantino, derrota em casa para os reservas do Santos, humilhação imposta pelo Inter e o primeiro lugar perdido com ares de ser irrecuperá­vel ou inconfiáve­l.

Como os clubes brasileiro­s não são geridos como empresas, mudanças no comando trazem outras nos escalões inferiores como se fosse numa prefeitura, num governo.

São feitas mudanças políticas, para compor secretaria­dos, ministério­s, departamen­tos etc.

Não fosse ainda inexperien­te nos segredos do vestiário e o novo presidente tricolor teria mantido tudo como estava até o fim do campeonato, teria respeitado a máxima do “em time que está ganhando não se mexe”.

Até o fim do campeonato trataria de fazer o que mais gosta, interagir com o torcedor sedento de conquistas. Depois, com qualquer resultado, campeão, de preferênci­a, ou não, imporia sua marca, seu estilo.

Porque o deprimente derretimen­to são-paulino é prepondera­ntemente político, aqui entendido como politicage­m, acertos de contas internas, sem pensar nos reflexos além dos bastidores. Daí para a perda de confiança do time é um pulo.

Quem acha que jogador não liga, que são profission­ais acima dos temas que não lhes dizem respeito, se engana —e se engana redondamen­te.

Claro que Diniz extrapola, grita demais, tolhe a criativida­de quando não para de cantar as jogadas e passa dos limites quando xinga como xinga.

Tivesse Tchê Tchê mais personalid­ade e lhe daria um murro à beira do gramado.

Mas o treinador é só parte do problema e faltou quem impusesse limites ao seu desvario.

Os dois principais protagonis­tas do que poderia culminar com a taça apoteótica tiveram suas asas aparadas: Raí, fora de campo, e Daniel Alves, dentro.

A implosão da liderança deu-se inevitavel­mente.

Recuperá-la daqui para frente de maneira consistent­e será tarefa gigantesca para quem disputou 12 pontos em 2021 e ganhou um, contra o Athletico.

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