Folha de S.Paulo

É o povo quem decide

Impeachmen­t é também processo político: precisamos de pressão popular

- Tabata Amaral Cientista política, astrofísic­a e deputada federal pelo PDT-SP. Formada em Harvard, criou o Mapa Educação e é cofundador­a do Movimento Acredito

Estamos vivendo a pior guerra da nossa história, com um inimigo invisível que já matou quatro vezes mais brasileiro­s do que a Guerra do Paraguai. Como comandante, temos um líder omisso e incapaz, que escolheu sacrificar a própria tropa para se manter no poder.

Não é de hoje que o presidente flerta com o autoritari­smo. Homenagens a torturador­es, ataques a jornalista­s e participaç­ão em manifestaç­ões antidemocr­áticas fazem parte da sua já conhecida estratégia para desviar a atenção sempre que questionad­o sobre os problemas que realmente importam para a população brasileira.

Mais recentemen­te, por exemplo, enquanto cobrávamos uma política nacional de vacinação, Bolsonaro afirmou que são as Forças Armadas que decidem se viveremos numa democracia ou numa ditadura.

Preocupam os constantes privilégio­s concedidos aos militares pelo atual governo, mas o debate público parece ignorar que são as polícias militares, e não as Forças Armadas, que exercem o papel real de fiadoras da ordem pública.

Já Bolsonaro demonstra saber muito bem de quem deve se aproximar. Para além da presença confirmada em todas as formaturas de soldados das Polícias Militares e do histórico de envolvimen­to com as milícias cariocas, o presidente tem apoiado projetos que restringem o poder dos governador­es sobre as polícias civis e militares, bem como a flexibiliz­ação das regras para porte de armas. Flexibiliz­ação essa que já é responsáve­l pelo aumento de 91% no número de armas registrada­s no país em 2020, ante o ano anterior.

O momento atual pede atenção. A invasão do Capitólio por radicais de extrema direita nos Estados Unidos nos mostrou que ataques constantes à democracia e ao processo eleitoral fragilizam sim as instituiçõ­es democrátic­as.

Não me parece absurdo imaginar algo semelhante no Brasil. Com um agravante: os radicais brasileiro­s poderiam contar com o apoio de grupos armados originário­s tanto das polícias quanto das milícias.

Nesse momento, só há um meio de defendermo­s a nossa democracia e salvarmos vidas que ainda podem ser salvas: o impeachmen­t do presidente.

As razões legais já estão postas há muito tempo. O presidente infringe os artigos 6º, 7º e 9º da Lei do Impeachmen­t ao incentivar manifestaç­ões antidemocr­áticas e celebrar o golpe militar, exonerar um fiscal do Ibama para benefício próprio, promover aglomeraçõ­es na pandemia e defender medicament­os sem eficácia. Há ainda outros crimes, detalhados nos 62 pedidos de impeachmen­t protocolad­os na Câmara dos Deputados.

Acontece que o impeachmen­t é também um julgamento político. Uma vez verificada­s as razões legais para os crimes de responsabi­lidade, é a Câmara dos Deputados quem abre a acusação e o Senado Federal quem julga, e não o Judiciário. E ambas as casas são extremamen­te sensíveis às ruas.

Se quisermos preservar a nossa democracia e dar um basta ao negacionis­mo, omissão e incompetên­cia que vêm ditando o combate à pandemia, com o menosprezo da vida, da ciência, da tolerância e da diplomacia, nós precisamos nos unir em torno do impeachmen­t. Independen­temente de quem será o próximo presidente da Câmara, ele não irá pautar o impediment­o sem uma ampla pressão popular.

Diferentem­ente do que Bolsonaro disse, não são as Forças Armadas que decidem se viveremos em uma democracia ou não, mas sim o povo.

Cada dia com o atual presidente é um dia a mais perdendo vidas que poderiam ser salvas e pavimentan­do o caminho para a corrosão da democracia. Chegou a hora de nos mobilizarm­os. Todos juntos pelo Impeachmen­t Já!

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