Folha de S.Paulo

Prédio em SP terá 1 ª fachada do país com realidade aumentada

Parede lateral de edifício no centro vem sendo pintada por artista; imagens poderão ser vistas com uso de celular

- Ivan Finotti

são paulo Subir a 30 metros de altura em uma plataforma elevatória articulada é trabalho natural para engenheiro­s ou construtor­es civis, mas uma nova categoria profission­al tem despontado na área: os artistas visuais, também conhecidos como grafiteiro­s.

É a primeira vez que EDMX (pronuncia-se Edemas), nome artístico de Henrique Montanari, se aventura com um desses. E a razão para tal é pintar a fachada de um edifício residencia­l de oito andares na avenida Nove de Julho, 959, região central de São Paulo.

“Max e Rosa”, nome de seus filhos de 13 e 10 anos, será a primeira fachada com realidade aumentada do Brasil, ou seja, a pintura esconderá uma mensagem secreta que só pode ser vista pela câmera de um celular apontado para a obra.

Por meio de um QR Code desenhado num dos cantos, a pessoa será direcionad­a à conta do artista no Instagram, onde o desenho vai adquirir vida e movimento.

“Max e Rosa”, diz EDMX, é um presente para a cidade de São Paulo, que completa 467 anos de idade nesta segundafei­ra (25).

É a primeira vez, também, que este repórter é elevado a 30 metros do solo, e a sensação está mais para um brinquedo do finado Playcenter, com trancos que adicionam diversão ao ato, do que para uma perigosa missão nas alturas.

No domingo (17), nem havia vento que assustasse, apesar das ameaçadora­s nuvens de verão. Por outro lado, moradores de edifícios próximos e passantes pelas ruas do centro se animavam em fazer tchauzinho­s e jóinhas.

A obra de EDMX, 47, retrata os seus filhos abrindo uma cortina estampada com sua personagem mais conhecida, uma mocinha que luta como uma mulher chamada Invasora.

“Me chamou a atenção como meus filhos estavam em pânico com a pandemia. Quando eu ia vê-los, pois moram com a mãe, era só de máscaras, e eu não podia chegar perto para abraçá-los.”

“A pintura representa o despertar do eu interior descobrind­o um novo mundo. A paz vem de você mesmo, não procure à sua volta”, diz ele, citando uma frase do seminal psiquiatra suíço Carl Jung (18751961) que o ajudou na inspiração: “Quem olha para fora sonha; quem olha para dentro desperta”.

Naquele dia, a pintura da empena ainda estava incompleta. Empena é o nome técnico da engenharia civil para a parede lateral de um edifício que não tenha janelas ou outras aberturas, podendo, assim, receber outro edifício colado nela.

A pintura foi programada para ser completada no período de dez dias.

Primeiro, EDMX traçou o desenho com a utilização de um projetor, instalado no lava-rápido, antigo posto de gasolina, que ocupa o terreno vizinho ao predinho sem nome.

Em seguida, passou a cobrir os cerca de 800 metros quadrados com tinta látex preta, branca e cinza, em cima da cor de tijolo esmaecida que perdurava havia 25 anos na fachada.

O último passo, realizado ao longo da última semana, foi usar 130 latas de spray para dar os contornos precisos e uma demão final nas áreas maiores.

“Vai ficar como se fosse uma foto”, disse ele naquele domingo.

“É minha escola de pintura, o realismo spraycioni­sta”, brinca o artista, enquanto pilota a plataforma, com meia dúzia de botões, ouvindo reggae alternado com punk hardcore.

A previsão de gastos é de cerca de R$ 15 mil, sendo que um terço foi para as tintas e dois terços para o aluguel da máquina elevatória. Não houve patrocínio.

A primeira fase do mural está entregue à cidade neste dia de aniversári­o. EDMX salienta a escolha da avenida Nove de Julho, cujo nome se refere ao início do levante armado paulista contra o governo federal em 1932.

“A Revolução Constituci­onalista contra a ditadura de Getúlio Vargas faz parte da história de nossa cidade e de nosso estado.”

A escolha do edifício foi feito pelo produtor Renê Muniz, que há dois anos abriu a empresa Legacy Walls especialme­nte para garimpar empenas pela cidade e produzir grafites como o de EDMX. “Pesquiso pelo Google Street View ou andando por aí”, ele conta.

“Na primeira olhada já dá para saber se vai ser preciso andaime, cadeirinha ou plataforma elevatória. Aí você tem que tocar a campainha do prédio. Fala com o porteiro, depois com o zelador. Em seguida, o síndico ou a administra­dora do imóvel. Nesta fase, a gente manda o projeto com o desenho, e os moradores decidem numa assembleia se topam.”

Muita gente acha que os condomínio­s recebem algo pela cessão de sua parede, ou que ainda teriam descontos no IPTU, mas nada disso acontece.

“O que oferecemos é uma obra de arte no lugar de um paredão sem graça que está, muitas vezes, com a pintura vencida.”

A cidade, aos 467 anos, só tem a agradecer.

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Fotos Zanone Fraissat/Folhapress O artista visual EDMX (Henrique Montanari), que está desenhando um grafite em realidade aumentada em uma fachada de prédio no Bixiga, em São Paulo
 ??  ?? Visão panorâmica da fachada do prédio na avenida 9 de Julho que está sendo desenhada pelo grafiteiro EDMX
Visão panorâmica da fachada do prédio na avenida 9 de Julho que está sendo desenhada pelo grafiteiro EDMX
 ??  ?? Aparelho usado pelo grafiteiro para subir a 30 m de altura
Aparelho usado pelo grafiteiro para subir a 30 m de altura
 ??  ?? Artista opera aparelho que o eleva para pintar o edifício
Artista opera aparelho que o eleva para pintar o edifício

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