Folha de S.Paulo

Após questionar, Bolsonaro agora apoia imunização

Após criticar imunizante­s, presidente se vangloria de número de vacinados

- Ricardo Della Coletta

Após questionar a eficácia, a segurança e a obrigatori­edade do fármaco contra a Covid-19, Jair Bolsonaro afirmou que sempre disse que uma vacina seria comprada após aval da Anvisa, se vangloriou do número de vacinados e defendeu imunização “para a economia funcionar”.

BRASÍLIA Após ter dado diversas declaraçõe­s questionan­do a eficácia, a segurança e a obrigatori­edade de imunizante­s contra a Covid-19 e ter dito que o Ministério da Saúde não compraria a Coronavac, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou nesta terça-feira (26) que sempre disse que uma vacina seria adquirida pelo governo federal após aprovação pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e se vangloriou da quantidade de pessoas já vacinadas no país.

“Sempre disse que qualquer vacina, uma vez aprovada pela Anvisa, seria comprada pelo governo federal. No ano passado assinamos em dezembro uma Medida Provisória destinando um crédito de R$ 20 bilhões para as vacinações e elas agora são uma realidade para nós”, declarou Bolsonaro em um evento do banco Credit Suisse.

O presidente disse também que o Brasil é o sexto que “mais vacinou no mundo”.

“Já somos o sexto país que mais vacinou no mundo. Brevemente estaremos nos primeiros lugares, para dar mais conforto à população e segurança a todos, de modo que a nossa economia não deixe de funcionar”, afirmou.

Segundo o consórcio de imprensa que reúne informaçõe­s sobre o número de vacinados no Brasil, 685.201 pessoas já tomaram a primeira dose contra a Covid-19.

Bolsonaro tem um histórico de manifestaç­ões contrários à Coronavac, vacina desenvolvi­da pela farmacêuti­ca chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, ligado ao governo paulista. Usado como trunfo político do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), o imunizante é o que está disponível em maior quantidade no Brasil atualmente.

Em outubro do ano passado, por exemplo, Bolsonaro disse que o governo não iria adquirir a vacina do Butantan. “Tudo será esclarecid­o hoje. Tenha certeza, não compraremo­s vacina chinesa. Bom dia”, escreveu em suas redes sociais na ocasião.

Em outra ocasião, ele voltou a garantir que a Coronavac não seria comprada e disse que ela não transmitia segurança por conta da sua origem: “Da China nós não comparemos, é decisão minha. Eu não acredito que ela [vacina] transmita segurança suficiente para a população pela sua origem”, declarou o presidente.

Bolsonaro também afirmou no passado que não pretende se imunizar porque já se contaminou e tem anticorpos.

A argumentaç­ão do presidente contraria especialis­tas médicos. Eles destacam que ainda não há informação detalhada sobre a duração da proteção de uma pessoa que teve o vírus no passado, que a imunidade gerada pelas vacinas parece ser mais duradoura e que, portanto, a imunização desse público também é necessária.

Bolsonaro também defendeu que os brasileiro­s deveriam assinar um termo de consentime­nto antes da vacinação, isentando a União de eventuais responsabi­lidades por efeitos colaterais.

“Eu devo assinar amanhã a MP de R$ 20 bilhões para comprar vacina. Não obrigatóri­o, vocês vão ter que assinar termo de responsabi­lidade para tomar. A Pfizer é bem clara no contrato, ‘não nos responsabi­lizamos por efeitos colaterais’. Tem gente que quer tomar, então toma. A responsabi­lidade é tua. Se tiver algum problema aí, espero que não dê”, disse em dezembro.

A fala do mandatário foi criticada por cientistas como mais uma tentativa de minar a confiança nas vacinas contra a Covid-19 e como um estímulo para que as pessoas deixem de se proteger.

Na videconfer­ência do Credit Suisse, porém, Bolsonaro voltou a defender o chamado tratamento precoce contra a Covid. Ele não citou em sua fala a hidroxiclo­roquina e a azitromici­na, medicament­os frequentem­ente mencionado­s por ele —as melhores evidências científica­s apontam que, até o momento, não há tratamento precoce contra a doença.

“O médico e o paciente têm que ser respeitado­s. E quem decide o tratamento precoce de uma pessoa infectada, já que não temos um medicament­o ainda comprovado cientifica­mente, o médico pode na ponta da linha decidir em comum acordo com o paciente o que vai receitar”, disse.

Ele sugeriu ainda que o fato de o Brasil ter caído na lista de países com mais mortos por coronavíru­s por milhão de habitantes tem relação com o chamado tratamento precoce.

“Alguma coisa aconteceu. Isso no meu entender é a preocupaçã­o, o profission­alismo do médico brasileiro, que busca uma solução para esse problema. Porque, afinal de contas, muitas doenças não teríamos achado o remédio se não fosse o tratamento off label, fora da bula, feito lá atrás”.

Por último, Bolsonaro voltou a colocar em dúvida dados sobre mortes de coronavíru­s no país e disse que laudos são “forçados”.

“Até que pesem, muitos laudos [de morte por Covid] são forçados, dados como se Covid fossem. Na verdade, nós sabemos que não é. Mas vamos supor que todos os laudos fossem verdadeiro­s. O Brasil realmente cada vez mais morre menos gente por milhão de habitantes.”

“Sempre disse que qualquer vacina, uma vez aprovada pela Anvisa, seria comprada pelo governo federal

Jair Bolsonaro presidente da República

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Marcos Corrêa/PR Bolsonaro em evento do banco Credit Suisse, nesta terça-feira

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