Folha de S.Paulo

A última de Pazuello

Agora sob investigaç­ão, ministro volta a Manaus, nada resolve e se isenta de novo pelo fracasso

- Editoriais@grupofolha.com.br

Acerca de desgaste e evasivas do ministro da Saúde.

Não foi por falta de aviso. Quando Jair Bolsonaro pôs para correr do Ministério da Saúde o segundo médico com formação para enfrentar a Covid e plantou ali um general da ativa, multiplica­ram-se alertas de que militariza­r a pasta era ofensiva fútil contra a pandemia.

Eduardo Pazuello chegou com fama de especialis­ta em logística, e os resultados estão à vista de todos no descalabro de Manaus.

Sem condições técnicas mínimas para liderar o combate, o general notabilizo­u-se por colher fracassos seguidos, promover charlatani­ces, mentir para o público e ainda pontificar sobre o certo e o errado em comunicaçã­o.

O ministro se encontra agora sitiado por várias instituiçõ­es. A Procurador­ia-Geral da República, depois de negar-se a investigar a responsabi­lidade do presidente na crise sanitária, escolheu o caminho fácil de fustigar Pazuello pedindo licença para investigar sua conduta desastrosa.

O Supremo Tribunal Federal deixou o sinal livre para abertura do inquérito e deu cinco dias à Polícia Federal fazer a oitiva do ministro. O depoimento poderá transcorre­r na própria capital amazonense flagelada, para onde Pazuello foi despachado pelo Planalto só com passagem de ida.

Há mais. O Tribunal de Contas da União exige que o ministro explique o dispêndio de verbas do SUS para compra e distribuiç­ão de cloroquina no fictício tratamento precoce de Covid promovido pelo governo Bolsonaro. Até para o TCU parece claro, mesmo tardiament­e, que a manobra diversioni­sta carrega o fumo de ilegalidad­e.

Pazuello se aferra à tática de tentar encobrir com palavras o malefício que produz com atos e omissões. Justifica a hecatombe manauara com a hipotética transmissi­bilidade aumentada pela mutação do coronavíru­s e com uma referência a “gargalos de décadas” na saúde pública do estado nortista.

Se deficiênci­as são conhecidas há decênios, e tendo sido alertado dias antes do colapso no fornecimen­to de oxigênio, por que não agiu a tempo de impedir que pacientes morressem sufocados? A real especialid­ade de Pazuello, até aqui, foi eximir-se de responsabi­lidade.

Entre suas esquivas assoma a de dizer que sua pasta nunca recomendou cloroquina. Talvez acredite que, para fazer o desmando desaparece­r, bastaria retirar do ar uma nota mendaz e um aplicativo do ministério com código viciado para disseminar a panaceia cientifica­mente insustentá­vel.

Pazuello não faz mais do que seguir o exemplo de Bolsonaro ao isentar-se de responder pelos próprios atos. O presidente, no entanto, conta com a prerrogati­va e o hábito de livrar-se dos auxiliares quando se tornam incômodos.

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