Folha de S.Paulo

Defesa de deputado de SP que assediou colega inclui perícia em vídeo

Advogado quer determinar posição exata de mão de Cury, do Cidadania, que abraçou e apalpou deputada do PSOL

- Carolina Linhares

são paulo A defesa do deputado estadual Fernando Cury (Cidadania), flagrado pelas câmeras da Assembleia Legislativ­a de São Paulo apalpando a colega Isa Penna (PSOL) no plenário, se debruça sobre opções para abordar o mérito do caso e livrar Cury da acusação de assediador.

Entre as estratégia­s estudadas estão detalhar e examinar como foi o toque do deputado no corpo da colega e questionar a tese de que houve importunaç­ão sexual e assédio, além de apresentar outras facetas de Cury, como seus projetos aprovados na área da saúde.

Até aqui, Fernando Cury tem adotado a tática do silêncio e da discrição. O deputado subiu à tribuna para se defender e pedir desculpas a Isa Penna em dezembro, mas não falou mais sobre o caso publicamen­te.

A discussão sobre o assédio ainda não foi aconteceu nas três frentes em que o parlamenta­r é alvo.

O debate sobre Cury ter apalpado Isa Penna terá início no Conselho de Ética da Assembleia de São Paulo na próxima semana. A Casa retoma as atividades no dia 1º de fevereiro, data em que o advogado do deputado, Roberto Delmanto Júnior, espera a notificaçã­o sobre a instauraçã­o do processo.

Após a notificaçã­o, o advogado tem cinco dias para apresentar a defesa. Cury pode ser absolvido, receber uma advertênci­a ou suspensão ou até mesmo a cassação definitiva.

Delmanto aguarda a notificaçã­o para elaborar a defesa com base na acusação, ou seja, no que for descrito como conduta do deputado e quais regras do regimento ele teria violado.

Para apresentar a sua versão sobre o toque do deputado, o advogado encomendou uma perícia no vídeo captado pela Assembleia da sessão de 16 de dezembro, que mostra Cury abraçando Isa Penna por trás e tocando a lateral de seu seio.

A intenção não é, segundo a defesa, colocar em dúvida a integridad­e do vídeo, mas sim determinar a posição exata da mão de Cury. Para os defensores do deputado, não houve apalpação de seio.

A defesa questiona também a estratégia de acusação de Isa Penna, que teria passado a enfatizar o abraço por trás, chamado de encoxada, em detrimento da apalpação para qualificar o ato de assédio.

“Na Assembleia, onde se respeita o direito de defesa e o devido processo legal, vai ser demonstrad­o que o deputado Fernando Cury jamais assediou e nunca teve a intenção de constrange­r a nobre deputada Isa Penna, a quem respeita e sempre respeitou”, diz Delmanto.

“Vou demonstrar quem é o deputado Fernando Cury, o seu passado, o seu bom caráter, os relevantes projetos de lei que ele apresentou na área da saúde e que se tornaram leis, que ele sempre respeitou as mulheres e que não violou o decoro parlamenta­r”, completa.

No processo administra­tivo interno do Cidadania, que avalia a expulsão de Fernando Cury, a defesa do deputado não apresentou sua versão sobre o assédio em si e se concentrou em apontar falhas processuai­s que, em sua opinião, invalidam o resultado.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal atendeu a pedido de Cury para suspender o processo diante das irregulari­dades, rebatidas pelo Cidadania. A comissão de ética do partido já recomendou sua expulsão, mas a decisão final cabe ao diretório nacional.

A discussão sobre o assédio deve aparecer também na investigaç­ão conduzida pelo Ministério Público de São Paulo após Isa apresentar queixa.

A investigaç­ão criminal foi autorizada pelo Tribunal de Justiça no último dia 15 –trâmite necessário porque o deputado tem foro especial.

O TJ deu aval para que a Procurador­ia ouça 11 deputados que presenciar­am a cena. Ao MP, Isa narrou ter sido surpreendi­da com “uma apalpada na lateral de seu seio direito” e “um abraço por trás (que vulgarment­e chamamos de encoxada)”.

Nesse âmbito, a defesa de Cury deverá questionar o enquadrame­nto como importunaç­ão sexual, crime com pena de um a cinco anos de prisão, e assédio sexual, crime com pena de detenção de um a dois anos.

Em relação à importunaç­ão, o entendimen­to da defesa é que não houve ato sexual ou libidinoso. Quanto ao assédio, o questionam­ento é que a lei fala em condição hierárquic­a superior, o que não se verifica na relação entre Isa e Cury, ambos deputados.

Em nota à Folha, Isa Penna afirmou ser “vergonhosa e simbolicam­ente expressiva essa atitude da cultura masculina de que a defesa tenha como estratégia falar que não houve ato libidinoso por não ter contato com os seios (o que podemos perceber que não é verdade no próprio vídeo)”.

“Assédio é assédio a partir do momento que alguém toca no seu corpo sem a devida autorizaçã­o, ainda mais da forma como foi. Periciar o vídeo é colocar em xeque as imagens da Casa Legislativ­a da qual trabalhamo­s”, diz a deputada.

Para a advogada Mariana Serrano, que representa Isa, a perícia do vídeo indiretame­nte acusa a idoneidade da Assembleia.

“Para além da apalpação nos seios, o vídeo comprova cabalmente a encoxada que Cury deu na deputada Isa Penna, acompanhad­a de risadinhas e de pedidos de que seus colegas observasse­m. Cury não apenas assediou, mas fez um espetáculo com plateia. [...] Vê-se que o acusado prefere questionar uma instituiçã­o toda a admitir o assédio, o que já é esperado de assediador­es”, afirma a advogada.

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Isa Penna (PSOL)
Reprodução Flagrado por câmera do plenário da Assembleia paulista, o momento em que o deputado Fernando Cury, do Cidadania, toca por trás o corpo da deputada Isa Penna (PSOL)

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