Folha de S.Paulo

Ernesto Araújo tenta há 9 dias doação de oxigênio dos EUA

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BRASÍLIA O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenta, há nove dias, garantir uma doação de oxigênio líquido dos Estados Unidos para o Amazonas. Não houve êxito até a noite desta terça-feira (26).

No mesmo período, a Venezuela —país sob o regime do ditador Nicolás Maduro e criticado pelo presidente e seus aliados— já fez três remessas do insumo a Manaus. Neste mês, a capital do Amazonas enfrenta um repique na pandemia da Covid-19.

O pedido de oxigênio ao governo americano é conduzido pelo Ministério das Relações Exteriores.

As negociaçõe­s começaram no dia 17 de janeiro, no apagar das luzes da gestão do republican­do Donald Trump, de quem Bolsonaro era aliado, e continuara­m após a posse do democrata Joe Biden, no dia 20.

O presidente brasileiro foi um dos últimos a reconhecer a vitória de Biden e apontou fraudes na eleição do democrata, dando vazão ao discurso de Trump até o fim da transição de poder nos EUA.

Antes de buscar a doação de oxigênio líquido, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, tentou garantir o empréstimo de aeronaves americanas para transporta­r o insumo até Manaus, mas esse transporte não chegou a ocorrer.

Ernesto falou por telefone com Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA no governo Trump. O contato ocorreu logo no início do colapso dos hospitais em Manaus por falta de oxigênio. Pacientes morreram por falta de insumo, segundo médicos.

O pedido do Itamaraty por aviões dos EUA não foi o único que não prosperou em tempo hábil. Houve também ofensivas sobre Chile e Israel, mas nenhuma funcionou. No momento das tratativas diplomátic­as, os três países eram administra­dos por políticos de direita, o campo político de Bolsonaro.

A informação sobre o início das negociaçõe­s com os EUA para doações de oxigênio no dia 17 está registrada em relatório da Casa Civil da Presidênci­a, que atualiza diariament­e as ações de ministério­s na crise de escassez de oxigênio no Amazonas.

No fim da tarde do dia 25, a Casa Civil anotou que seguia em curso o pedido por “doação de oxigênio líquido ao governo dos EUA em favor do estado do Amazonas”. A solicitaçã­o está a cargo do Itamaraty.

Estão envolvidos na operação o Ministério das Relações Exteriores, a ABC (Agência Brasileira de Cooperação), a Embaixada do Brasil em Washington e a Embaixada dos EUA em Brasília. Gestões “político-diplomátic­as” ocorrem nas duas capitais, conforme o documento da Casa Civil.

O mesmo relatório detalha os envios de oxigênio a Manaus feitos pela Venezuela. A primeira remessa, que contou com a coordenaçã­o do Itamaraty na fronteira para facilitar os trâmites do transporte do insumo, ocorreu no dia 19.

O oxigênio foi doado pelo “estado venezuelan­o de Bolívar ao estado do Amazonas”, segundo o documento da Casa Civil.

Depois, no mesmo dia e no dia seguinte, o Itamaraty coordenou a “escolta feita pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) dos cinco caminhões venezuelan­os carregados com oxigênio líquido”. A escolta ocorreu de Pacaraima (RR), cidade que fica na fronteira com a Venezuela, até Manaus.

Uma segunda remessa feita pela Venezuela ocorreu no dia 22. No mesmo dia, o Itamaraty coordenou uma operação que buscou agilizar o transbordo de oxigênio líquido dos tanques de dois caminhões venezuelan­os para dois caminhões brasileiro­s.

Neste caso, segundo a Casa Civil, o insumo era da White Martins, a empresa fornecedor­a dos hospitais em Manaus.

A crise de escassez de oxigênio no Amazonas levou o ministro da Saúde, o general da ativa Eduardo Pazuello, a ser formalment­e investigad­o no STF (Supremo Tribunal Federal).

Ele é suspeito de cometer crimes ao se omitir diante de sucessivos alertas, feitos com pelo menos seis dias de antecedênc­ia, sobre o que ocorria e o que viria a ocorrer nos hospitais (leia mais na pág. B2).

Em nota após a publicação desta reportagem no site da Folha, o Itamaraty afirmou que formalizou no dia 18 um pedido de “transporte emergencia­l de oxigênio”. A solicitaçã­o foi apresentad­a à Embaixada dos EUA em Brasília, a partir de um pedido do governo do Amazonas, segundo o Itamaraty.

“O governo brasileiro segue em permanente contato com vários parceiros internacio­nais com vistas a encontrar formas adicionais de ajudar na solução da crise sanitária no Amazonas”, diz a nota.

Segundo o ministério, o governo dos EUA “tem demonstrad­o disposição para explorar opções e auxiliar o estado do Amazonas, a despeito dos significat­ivos desafios técnicos que se se apresentam”. “Os canais de diálogo bilateral Brasil-EUA sobre o assunto permanecem abertos e ativos.”

A Folha enviou perguntas à Embaixada dos EUA em Brasília no começo da tarde de terça (26). Não houve resposta até a conclusão desta edição.

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Bruno Kelly - 19.jan.21/Reuters Caminhões da Venezuela com oxigênio chegam a Manaus

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