Folha de S.Paulo

Covid e presidente não freiam a Lei Rouanet, que teve ano estável em 2020

Secretário diz que R$ 700 milhões foram barrados, mas o total arrecadado de R$ 1,4 bilhão foi quase o mesmo de 2019

- Eduardo Moura e João Perassolo

belo horizonte e são paulo Ao longo desta semana, o secretário especial da Cultura, Mario Frias, vem comemorand­o em suas redes sociais uma decisão da Justiça que teria barrado a liberação de “R$ 700 milhões da Lei Rouanet”. A série de postagens dá a entender que esse valor teria sido economizad­o pelos cofres públicos, em referência ao mecanismo de captação de recursos pelo setor artístico vindos de renúncia fiscal.

Seguidores de Frias no Instagram respondera­m à postagem, falando que artistas estariam “acostumado­s com mordomia, só querem moleza” e chamando a classe de “urubus de plantão”.

No ano de 2020, porém, o valor total captado via Lei de Incentivo à Cultura, o novo nome da Rouanet, foi praticamen­te o mesmo do ano anterior, de cerca de R$ 1,4 bilhão, de acordo com dados do governo, o que invalida esse argumento de uma suposta diminuição de gastos.

A postagem do secretário se refere a uma decisão da Justiça que negou um mandado de segurança coletivo impetrado pelo conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil e por entidades da sociedade civil. Eles pediam que cerca de 450 projetos parados na secretaria fossem publicados no Diário Oficial da União para que pudessem iniciara captação do dinheiro.

No pedido, a OAB afirma que a previsão do total de recursos captados via Rouanet no país seria de cerca de R$ 1,2 bilhão.

A Lei Orçamentár­ia Anual estimou R$ 1,2 bilhão em 2020 para Programa Nacional de Ap oi oà Cultura, oPronac, sem especific arse o valor sere feresóà isenção fiscal ou também engloba o Fundo Nacional de Cultura, outro mecanismo de incentivo.

Segundo a OAB, todos esses projetos estavam “regularmen­te habilitado­s, já superada a fase de admissibil­idade”, ou seja, a instituiçã­o nega que os 450 projetos poderiam estar parados por problemas na documentaç­ão ou outros requisitos burocrátic­os para a aprovação. Procurada, a Secretaria Especial da Cultura não respondeu.

Segundo o pedido da OAB, no momento em que entrou com o mandado de segurança, em dezembro, só haviam sido captados via Rouanet R$ 500 milhões para projetos, o que indicaria que mais R$ 700 milhões ainda poderiam ser captados via renúncia fiscal.

Coma negativado juiz, os 450 projetos ficaram sem poder receber o dinheiro, mas todo o montante disponível para captação foi arrecadado —totalizand­o o valor de R$ 1,4 bilhão, maior do que o previsto.

Em números absolutos, o valor captado via Rouanet em 2020 foi apenas 1,8% menor que o de 2019 –R$ 1,45 bilhão no ano passado, em relação à R$ 1,48 bilhão no ano anterior, de acordo com dados do Salicnet, o site do governo que monitora a lei. Atualizand­o pela inflação, o montante incentivad­o em 2020 foi 7,1% menor do que no ano anterior.

Em nota, a OAB afirma que “em nenhum momento, o mandado sugere a liberação de qualquer valor de recursos, tampouco R$ 700 milhões, mas apenas a publicação dos projetos que já cumpriram a etapa de admissibil­idade”. Na prática, contudo, a publicação no DOU precisava ser acelerada para que os projetos conseguiss­em receber o dinheiro antes do final do ano passado.

Em dezembro, havia um clima de medo entre produtores culturais pelo fato de a Secretaria Especial da Cultura segurar a publicação no Diário Oficial de centenas de projetos.

Diversos produtores, contudo, relataram lentidão excessiva da Secretaria Especial da Cultura no último ano e precisaram recorrer à Justiça para receber o patrocínio pela lei.

Foi o caso da Feira Preta, um evento de cultura e empreended­orismo negro que entrou com um mandado de segurança contra o governo federal e só no último dia do prazo conseguiu receber o valor de R$ 1 milhão acertado com o grupo Pão de Açúcar para poder realizar a edição deste ano do evento.

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