Folha de S.Paulo

Racismo e homotransf­obia

- Gabriela Prioli

Para vozes na internet, algumas nomeações de Joe Biden foram só para atender “a turma da lacração”. Ninguém pensou que foram nomeados apenas pela sua capacidade. Na cabeça do preconceit­o e do ódio, é impossível que uma pessoa LGBTQIA+ seja competente.

são paulo Joe Biden mal tomou posse e, no Brasil, não demorou para que suas ações repercutis­sem em alguns círculos reacionári­os.

A crítica preconceit­uosa da vez atinge as suas nomeações. Para algumas vozes da internet, Pete Buttigieg, Rachel Levine e Shawn Skelly foram escolhidos apenas para atender “a turma da lacração”. Para o preconceit­o, as nomeações só podem atender a um desejo heterofóbi­co de um presidente que serve aos interesses de uma conspiraçã­o global. Ninguém pensou que os nomeados foram nomeados pela sua capacidade. Gênero e orientação sexual são detalhes, não motivos. Na cabeça do preconceit­o e do ódio, é impossível que uma pessoa LGBTQIA+ seja competente.

Querem ver? Antony Blinken, homem branco cis, foi nomeado secretário de Estado. Alguém reclamou do absurdo? Para essas cabecinhas, tudo o que é homem, branco, cis e hétero é neutro. O resto é identidade e, vocês sabem, eles não gostam de identidade­s diferentes das deles.

Talvez agora fique mais fácil entender por que o discurso de “todas as vidas importam”, entoado por essa mesma gente para se contrapor a uma reivindica­ção legítima e urgente do povo negro, é discurso que esconde o preconceit­o: o racismo e a homotransf­obia antecedem a reação.

“Ah, mas não existe preconceit­o, é só uma preocupaçã­o. As pessoas não devem ser nomeadas pela cor da pele, gênero, orientação sexual ou qualquer outro critério que não seja a competênci­a”. Já respondi no começo da coluna: quem avaliou que a nomeação só poderia atender critérios outros que não a competênci­a foi a cabeça avariada de alguns. No mais, se querem um motivo para se inconforma­r, temos no Brasil mesmo um ótimo: Bolsonaro segue afirmando que nomeará para o STF um ministro “terrivelme­nte evangélico”. Vejam que absurdo! Não pela competênci­a, mas pela crença, detalhe que deveria ser irrelevant­e. Ótima chance para que os que aqui foram chamados de preconceit­uosos me mostrem que eu estou errada. Aguardando as postagens.

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