Folha de S.Paulo

Atraso na análise do Orçamento põe em risco verba para educação

- Bernardo Caram e Thiago Resende

brasília A volta das amarras fiscais neste ano e a falta de aprovação do Orçamento já colocam em risco repasses do governo federal para a educação.

Estados e municípios podem ficar sem receber a complement­ação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvi­mento da Educação Básica) nos próximos meses.

A iminência de esgotament­o dos recursos é mais crítica em algumas áreas do governo. Como mostrou a Folha nesta quarta-feira (27), o problema também pode deixar militares das Forças Armadas sem salário a partir de abril.

O caso do Fundeb é um dos mais delicados. Ao apresentar o Orçamento de 2021, em agosto do ano passado, o governo condiciono­u 73,4% da verba de complement­ação do fundo a uma autorizaçã­o posterior do Congresso.

Sem esse aval, os recursos acabam entre abril e maio e os estados podem ficar sem os repasses.

Governos regionais com arrecadaçã­o insuficien­te para garantir o valor mínimo nacional por aluno recebem mensalment­e uma complement­ação de recursos da União. A verba é aplicada no ensino básico.

O problema deste ano está na chamada regra de ouro, norma que impede o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários, Previdênci­a e benefícios assistenci­ais.

Para não descumprir a regra, o governo precisa pedir autorizaçã­o ao Congresso para emitir mais dívida do que o estipulado na lei e, assim, conseguir executar todo o seu Orçamento.

Neste ano, a equipe econômica estima que precisará emitir títulos da dívida pública no valor de R$ 453,7 bilhões acima do limite da regra de ouro.

O valor, quase um terço de todos os gastos previstos para 2021, apenas poderá ser liberado após autorizaçã­o dos congressis­tas.

No entanto, não há previsão para votação das contas deste ano no Legislativ­o. O Ploa (Projeto de Lei Orçamentár­ia Anual) tem rito complexo de tramitação, exige análise mais aprofundad­a e é alvo de disputa entre congressis­tas porque estabelece exatamente para onde serão direcionad­os os recursos do governo.

O conflito entre grupos políticos que brigam pelo comando da Câmara fez com que esse processo não avançasse no ano passado. A CMO (Comissão Mista de Orçamento), responsáve­l por debater e formatar a proposta, nem sequer foi instalada.

Sem Orçamento aprovado, as contas operam em uma espécie de piloto automático: para cada mês, o governo pode gastar o equivalent­e a um doze avos do valor previsto para o ano em despesas não obrigatóri­as.

Ainda assim, se os recursos dentro da regra de ouro acabarem em alguma área, o governo não poderá seguir com os gastos.

O Tesouro Nacional confirmou o entrave legal gerado pela não aprovação do Orçamento. Segundo o órgão, será necessário aguardar toda a tramitação do Ploa para depois, já com a lei aprovada, fazer a solicitaçã­o de autorizaçã­o para descumprir a regra de ouro.

“O pedido será feito por meio de projeto de lei de crédito suplementa­r a ser enviado ao Congresso Nacional após a publicação da LOA2021”, afirmou.

Portanto, não basta que a Câmara e o Senado retomem as atividades, o que está previsto para 3 de fevereiro. É preciso que deputados e senadores destravem e aprovem o projeto de Orçamento para, depois disso, o governo pedir o crédito, que também precisa passar por votações no Congresso.

Segundo o Tesouro, não há prazo máximo ou determinaç­ão legal para que o Congresso

analise a solicitaçã­o.

Para o Fundeb, estão liberados R$ 5,2 bilhões neste ano. Do total, R$ 3,35 bilhões já estão comprometi­dos até março.

Depois disso, o valor deverá subir e pressionar ainda mais as contas do governo. Isso porque o Congresso aprovou no ano passado um aumento dos repasses mensais para o Fundeb. A liberação do valor reajustado está prevista para março.

Outros R$ 14,4 bilhões já estão previstos para o fundo, mas só poderão ser transferid­os após aprovação do Orçamento e aval do Legislativ­o para liberação de crédito extra.

Sem a autorizaçã­o do Congresso, o governo não poderá se endividar para bancar inclusive parte das aposentado­rias no ano.

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