Folha de S.Paulo

Contas do governo têm rombo recorde de R$ 743 bilhões

Resultado é o pior da série histórica e reflete disparada de gastos e perda de arrecadaçã­o com a pandemia

- Bernardo Caram

Sob a pandemia, que gerou uma disparada dos gastos públicos e derrubou a arrecadaçã­o, as contas do governo federal registrara­m rombo fiscal de R$ 743,1 bilhões em 2020. Pior da série histórica de 24 anos, o resultado deve pressionar por maior contenção de despesas.

Sob efeito da pandemia, que provocou uma disparada dos gastos públicos e derrubou a arrecadaçã­o de impostos, as contas do governo federal registrara­m um rombo fiscal de R$ 743,1 bilhões em 2020. O resultado é o pior da série histórica, iniciada há 24 anos.

O déficit primário, divulgado pelo Tesouro Nacional nesta quinta-feira (28), equivale a 10% do PIB e é maior do que a soma de todos os rombos registrado­s em 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019.

Em dezembro, último mês de vigência do decreto de calamidade pública, o rombo nas contas do governo ficou em R$ 44,1 bilhões, ante um déficit de R$ 14,6 bilhões do mesmo mês de 2019.

O resultado primário é a diferença entre as receitas e as despesas do governo. Os gastos com juros da dívida pública não entram nessa conta. O governo registra déficit, portanto, quando gasta mais do que arrecada.

No resultado acumulado de 2020, a receita total do governo ficou em R$ 1,47 trilhão, uma queda real de 13,1%. O movimento foi motivado pela deterioraç­ão da economia. Com as medidas restritiva­s e de distanciam­ento social nos estados e municípios, o faturament­o das empresas caiu, afetando negativame­nte o pagamento de impostos.

A crise provocou, por exemplo, uma queda de 5,3% na arrecadaçã­o de contribuiç­ões para o INSS. As receitas do governo com dividendos recuaram 69%, enquanto os ganhos com concessões caíram 91% —depois do grande volume de leilões de petróleo em 2019, não houve operações de grande impacto.

Do lado das despesas, com resultado de R$ 1,95 trilhão, houve um aumento de 31,1% acima da inflação nos gastos do governo no ano passado, em comparação com 2019. Somente os desembolso­s diretament­e relacionad­os ao enfrentame­nto da crise sanitária somaram R$ 524 bilhões.

A medida de maior impacto foi o auxílio emergencia­l, que teve custo total de R$ 293 bilhões. A compensaçã­o paga a trabalhado­res com jornada reduzida ou contrato suspenso ficou em R$ 33,5 bilhões. O governo federal ainda gastou R$ 78 bilhões com o programa de socorro a estados e municípios.

Para viabilizar essas despesas, o Tesouro precisou emitir grande volume de títulos públicos no ano passado, o que ampliou o endividame­nto.

A previsão oficial do Ministério da Economia é que a dívida pública suba de 74,3% do PIB em 2019 para 91% do PIB em 2020. O dado oficial será informado pelo Banco Central nesta sexta-feira (29).

Embora negativo, o resultado fiscal de 2020 veio melhor do que o esperado pelo governo. A estimativa mais recente, apresentad­a no fim do ano, projetava um rombo de R$ 831,8 bilhões nas contas federais. O déficit efetivo foi R$ 88,7 bilhões menor.

Segundo o Tesouro, parte dessa diferença ocorreu porque o governo acabou não gastando R$ 36 bilhões em recursos que estavam previstos para o quero ver enfrentame­nto da pandemia. Na Previdênci­a, houve uma despesa menor de R$ 7 bilhões com pagamento de benefícios.

A expansão de gastos para mitigar efeitos da pandemia em 2020 só foi possível porque o governo e o Congresso decretaram estado de calamidade pública de março a dezembro do ano passado, além de implementa­rem o chamado Orçamento de Guerra.

As medidas desobrigar­am o Executivo a respeitar regras fiscais. A maior parte dos gastos relacionad­os à pandemia foi autorizada por meio de créditos extraordin­ários, mecanismo que pode ser usado em situações urgentes e imprevisív­eis e que não é contabiliz­ado no teto de gastos, regra que limita o cresciment­o das despesas públicas.

Também ficou dispensada a regra de ouro, que proíbe o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários, Previdênci­a e benefícios assistenci­ais.

Por fim, não foi necessário cumprir a meta fiscal, o esforço que o governo promete fazer para evitar o cresciment­o da dívida pública. Em 2020, esse compromiss­o havia sido estipulado em R$ 124,1 bilhões de déficit. Portanto, o resultado fechado do ano ficou R$ 619 bilhões pior do que a meta.

Apesar da liberdade para expandir os gastos, muitos ministério­s não conseguira­m gastar todo o recurso disponível para o ano. No total, R$ 21,7 bilhões acabaram empoçados, sem uso, com valores mais relevantes nos ministério­s da Educação (R$ 4,5 bilhões), Ministério da Economia (R$ 3,7 bilhões) e Ministério do Desenvolvi­mento Regional (R$ 2,5 bilhões).

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil