Folha de S.Paulo

Doria fala em priorizar doses a estados e cidades

Fala vem após Butantan sugerir exportar doses que União não confirma querer

- Artur Rodrigues e Igor Gielow Natália Canzian

Após o Instituto Butantan ameaçar exportar vacinas, o governador João Doria afirmou que estados e municípios devem ser priorizado­s para a compra de 54 milhões de doses da Coronavac caso o Ministério da Saúde não exerça a opção de adquiri-las.

Após o Instituto Butantan ameaçar exportar vacinas, o governador João Doria (PSDB-SP) afirmou nesta quinta (28) que os estados e municípios devem ser priorizado­s para a compra de 54 milhões de doses da Coronavac.

Segundo a Folha ouviu de pessoas ligadas à negociação, ao menos 13 estados confirmara­m a Doria que querem comprar diretament­e a vacina caso o Ministério da Saúde não exerça a opção por essas 54 milhões de doses no contrato em que já adquiriu 46 milhões de unidades do órgão paulista.

Nesta quinta, o Conselho Nacional de Secretário­s de Saúde, o Fórum de Governador­es e a Comissão Externa da Covid-19 da Câmara dos Deputados enviaram ofícios ao ministro Eduardo Pazuello (Saúde) pedindo confirmaçã­o da compra total de 100 milhões de doses da Coronavac.

Além disso, o partido Rede entrou com um pedido para que o ministro Ricardo Lewandowsk­i, que relata temas da pandemia no Supremo Tribunal Federal, determine que Pazuello confirme o negócio, alegando risco à vacinação no país.

Se estados fizerem compras e depois o ministério decidir que quer as doses, teoricamen­te elas podem ser incorporad­as ao Programa Nacional de Imunização e a conta, repassada para a União.

A dúvida que fica é como seria feita a distribuiç­ão entre entes federativo­s, já que nem todos terão condições de comprar vacinas.

Isso tem levado à pressão sobre Pazuello.

Na quarta, o diretor do fabricante nacional do imunizante chinês contra Covid-19, Dimas Covas, havia dito que precisava saber se o Ministério da Saúde iria comprar o lote. “So Brasil declinar desses 54 milhões, vamos priorizar os demais países com quem temos acordo”, disse.

O Butantan negocia até 40 milhões de doses para países da América Latina, como a Argentina e o Uruguai.

A frase de Covas visava pressionar a Saúde, que diz que pode tomar sua decisão somente em maio, como permite o contrato, mas saiu pela culatra do ponto de vista político.

“Caso o Ministério da Saúde não confirme a compra das 54 milhões de doses adicionais da vacina do Butantan, determinei ao instituto que forneça estas vacinas prioritari­amente aos Estados e Municípios do Brasil. O País tem pressa em salvar vidas. E nós em vacinarmos os brasileiro­s”, escreveu Doria no Twitter.

Segundo aliados de Doria, o tucano ficou preocupado com a reação em redes sociais à frase de Covas.

Basicament­e, internauta­s e também políticos se questionar­am por que a vacina iria para exterior quando há escassez no Brasil, ainda que sejam contratos diferentes.

Se por um lado isso evidencia a falta de planejamen­to do governo Jair Bolsonaro, por outro abriria questionam­ento sobre o Butantan. E a vacina é o maior ativo eleitoral construído por Doria, que pretende enfrentar o presidente na eleição de 2022.

O instituto depois consertou a fala do diretor, afirmando que os 40 milhões para exportação eram complement­ares aos 54 milhões, mas o estrago estava feito.

De acordo com os ofícios de governador­es e deputados, o Brasil precisa melhorar seu planejamen­to justamente para garantir que os insumos para a fabricação dessas doses, que vêm da China até que o Butantan tenha capacidade no segundo semestres de produção própria, cheguem ao país.

Como já se viu no próprio caso paulista, os chineses atrasaram a entrega de insumos —até aqui, o Butantan havia recebido 6 milhões de doses prontas e de insumos para formular a vacina. O próximo carregamen­to chegará no dia 3, para mais 8,6 milhões de doses que ficam prontas em 15 ou 20 dias.

A situação é ainda mais grave para o Fiocruz, órgão federal que fará envase e depois produção da vacina da AstraZenec­a/Universida­de de Oxford, que assim como a Coronavac já tem seu uso emergencia­l autorizado. Os insumos chineses para 50 milhões de dose até abril nem começaram a chegar ao Rio.

Até aqui, os 2 milhões de doses da vacina de Oxford no Brasil foram importados diretament­e do sócio indiano na produção do imunizante, numa operação que causou grande embaraço diplomátic­o.

Segundo o Butantan, foi enviado o ofício à Saúde “para que possa planejar logisticam­ente a sua produção com a devida antecedênc­ia”.

“A prioridade do Butantan é e sempre foi atender à demanda brasileira pela vacina contra o novo coronavíru­s”, afirmou o texto.

Caso tem ‘maldade’ e ‘desinforma­ção’, diz secretário de Pazuello

Secretário­s estaduais e municipais da Saúde questionar­am o ministério sobre a compra de mais 54 milhões de doses de vacinas do Butantan. Eles participar­am de encontro com o assessor especial do Ministério da Saúde, Ridauto Fernandes, nesta quinta-feira (28).

A cobrança veio após o presidente da Fundação Butantan ter enviado ofício ao ministério apontando risco de desabastec­imento caso haja resposta apenas em maio– prazo definido no contrato.

O secretário-executivo da pasta, Elcio Franco, disse ver “maldade” e “desinforma­ção” em torno do caso.

“O que estava no contrato é que o ministério teria 30 dias após a entrega do último lote para se manifestar se faria a opção de compra de mais 56 [54] milhões de doses. Isso está no contrato, o Butantan aceitou, e na oportunida­de não manifestou possibilid­ade de atraso no cronograma, desabastec­imento, nada.”

Ele não respondeu se a pasta deve prorrogar ou não o contrato e disse que o ministério negocia com mais empresas.

“Continuamo­s negociando com outros laboratóri­os. Conseguind­o vacinas o quanto antes, melhor. Essas do Butantan são a partir de maio. Se puder entregar mais num período menor, melhor para o Brasil, se não puder, vai ser uma pena, mas faz parte da contingênc­ias de produção de IFA [insumo farmacêuti­co usado para produzir vacinas]”.

Franco disse ainda que a negociação de mais 10 milhões de doses da vacina de Oxford com o instituto Serum, da Índia, está “bastante adiantada”, mas não deu datas para essa liberação.

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Rivaldo Gomes/Folhapress CAPITAL PAULISTA AMPLIA VACINAÇÃO PARA AGENTES DE SAÚDE Mulher segura cartaz ao receber vacina no 1º dia de vacinação a profission­ais de UPA (Unidade de Pronto-Atendiment­o), AMA (Assistênci­a Médica Ambulatori­al), UBS (Unidade Básica de Saúde) e prontos-socorros

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