Doria fala em priorizar doses a estados e cidades
Fala vem após Butantan sugerir exportar doses que União não confirma querer
Após o Instituto Butantan ameaçar exportar vacinas, o governador João Doria afirmou que estados e municípios devem ser priorizados para a compra de 54 milhões de doses da Coronavac caso o Ministério da Saúde não exerça a opção de adquiri-las.
Após o Instituto Butantan ameaçar exportar vacinas, o governador João Doria (PSDB-SP) afirmou nesta quinta (28) que os estados e municípios devem ser priorizados para a compra de 54 milhões de doses da Coronavac.
Segundo a Folha ouviu de pessoas ligadas à negociação, ao menos 13 estados confirmaram a Doria que querem comprar diretamente a vacina caso o Ministério da Saúde não exerça a opção por essas 54 milhões de doses no contrato em que já adquiriu 46 milhões de unidades do órgão paulista.
Nesta quinta, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, o Fórum de Governadores e a Comissão Externa da Covid-19 da Câmara dos Deputados enviaram ofícios ao ministro Eduardo Pazuello (Saúde) pedindo confirmação da compra total de 100 milhões de doses da Coronavac.
Além disso, o partido Rede entrou com um pedido para que o ministro Ricardo Lewandowski, que relata temas da pandemia no Supremo Tribunal Federal, determine que Pazuello confirme o negócio, alegando risco à vacinação no país.
Se estados fizerem compras e depois o ministério decidir que quer as doses, teoricamente elas podem ser incorporadas ao Programa Nacional de Imunização e a conta, repassada para a União.
A dúvida que fica é como seria feita a distribuição entre entes federativos, já que nem todos terão condições de comprar vacinas.
Isso tem levado à pressão sobre Pazuello.
Na quarta, o diretor do fabricante nacional do imunizante chinês contra Covid-19, Dimas Covas, havia dito que precisava saber se o Ministério da Saúde iria comprar o lote. “So Brasil declinar desses 54 milhões, vamos priorizar os demais países com quem temos acordo”, disse.
O Butantan negocia até 40 milhões de doses para países da América Latina, como a Argentina e o Uruguai.
A frase de Covas visava pressionar a Saúde, que diz que pode tomar sua decisão somente em maio, como permite o contrato, mas saiu pela culatra do ponto de vista político.
“Caso o Ministério da Saúde não confirme a compra das 54 milhões de doses adicionais da vacina do Butantan, determinei ao instituto que forneça estas vacinas prioritariamente aos Estados e Municípios do Brasil. O País tem pressa em salvar vidas. E nós em vacinarmos os brasileiros”, escreveu Doria no Twitter.
Segundo aliados de Doria, o tucano ficou preocupado com a reação em redes sociais à frase de Covas.
Basicamente, internautas e também políticos se questionaram por que a vacina iria para exterior quando há escassez no Brasil, ainda que sejam contratos diferentes.
Se por um lado isso evidencia a falta de planejamento do governo Jair Bolsonaro, por outro abriria questionamento sobre o Butantan. E a vacina é o maior ativo eleitoral construído por Doria, que pretende enfrentar o presidente na eleição de 2022.
O instituto depois consertou a fala do diretor, afirmando que os 40 milhões para exportação eram complementares aos 54 milhões, mas o estrago estava feito.
De acordo com os ofícios de governadores e deputados, o Brasil precisa melhorar seu planejamento justamente para garantir que os insumos para a fabricação dessas doses, que vêm da China até que o Butantan tenha capacidade no segundo semestres de produção própria, cheguem ao país.
Como já se viu no próprio caso paulista, os chineses atrasaram a entrega de insumos —até aqui, o Butantan havia recebido 6 milhões de doses prontas e de insumos para formular a vacina. O próximo carregamento chegará no dia 3, para mais 8,6 milhões de doses que ficam prontas em 15 ou 20 dias.
A situação é ainda mais grave para o Fiocruz, órgão federal que fará envase e depois produção da vacina da AstraZeneca/Universidade de Oxford, que assim como a Coronavac já tem seu uso emergencial autorizado. Os insumos chineses para 50 milhões de dose até abril nem começaram a chegar ao Rio.
Até aqui, os 2 milhões de doses da vacina de Oxford no Brasil foram importados diretamente do sócio indiano na produção do imunizante, numa operação que causou grande embaraço diplomático.
Segundo o Butantan, foi enviado o ofício à Saúde “para que possa planejar logisticamente a sua produção com a devida antecedência”.
“A prioridade do Butantan é e sempre foi atender à demanda brasileira pela vacina contra o novo coronavírus”, afirmou o texto.
Caso tem ‘maldade’ e ‘desinformação’, diz secretário de Pazuello
Secretários estaduais e municipais da Saúde questionaram o ministério sobre a compra de mais 54 milhões de doses de vacinas do Butantan. Eles participaram de encontro com o assessor especial do Ministério da Saúde, Ridauto Fernandes, nesta quinta-feira (28).
A cobrança veio após o presidente da Fundação Butantan ter enviado ofício ao ministério apontando risco de desabastecimento caso haja resposta apenas em maio– prazo definido no contrato.
O secretário-executivo da pasta, Elcio Franco, disse ver “maldade” e “desinformação” em torno do caso.
“O que estava no contrato é que o ministério teria 30 dias após a entrega do último lote para se manifestar se faria a opção de compra de mais 56 [54] milhões de doses. Isso está no contrato, o Butantan aceitou, e na oportunidade não manifestou possibilidade de atraso no cronograma, desabastecimento, nada.”
Ele não respondeu se a pasta deve prorrogar ou não o contrato e disse que o ministério negocia com mais empresas.
“Continuamos negociando com outros laboratórios. Conseguindo vacinas o quanto antes, melhor. Essas do Butantan são a partir de maio. Se puder entregar mais num período menor, melhor para o Brasil, se não puder, vai ser uma pena, mas faz parte da contingências de produção de IFA [insumo farmacêutico usado para produzir vacinas]”.
Franco disse ainda que a negociação de mais 10 milhões de doses da vacina de Oxford com o instituto Serum, da Índia, está “bastante adiantada”, mas não deu datas para essa liberação.