Folha de S.Paulo

Maia faz ameaças contra interferên­cia, e líder do centrão nega ação do Planalto

Segundo aliados, presidente da Câmara poderia dar aval a impeachmen­t; à Folha ele diz que não

- Julia Chaib, Ranier Bragon e Danielle Brant

BRASÍLIA Na reta final da disputa pela presidênci­a da Câmara e com defecções no bloco de apoio a Baleia Rossi (MDB-SP), o presidente da Casa, Rodrigo Maia, faz ameaças após reclamar de interferên­cia do Palácio do Planalto na eleição — movimento que o próprio Jair Bolsonaro admite, mas negado nesta quinta-feira (28) pelo candidato governista, Arthur Lira (PP-AL).

Segundo aliados de Maia, o deputado tem ameaçado avalizar o prosseguim­ento de um processo de impeachmen­t contra o presidente até o fim do seu mandato no comando da Casa, na próxima segunda-feira (1°).

A Folha ouviu esse relato de três políticos próximos a Maia, além de outro parlamenta­r que afirma ter ouvido essa informação do coordenado­r político do governo, o ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos.

Questionad­o pela coluna Mônica Bergamo se haverá andamento em eventual processo de afastament­o de Bolsonaro, Maia respondeu por WhatsApp: “Não”.

Após ver crescer a possibilid­ade de traições em partidos da sua base de apoio, entre eles o DEM, sigla de Maia, Baleia acusou Lira, que é líder do centrão, de plantar notícias mentirosas.

“Quem está ganhando a eleição não precisa mentir. E os nossos adversário­s estão mentindo muito, e isso é sinal de desespero”, afirmou Baleia nesta quinta-feira.

O presidente do MDB disse que está conversand­o com deputados e descartou qualquer possibilid­ade de o DEM migrar para o bloco de Lira — aliados do líder do centrão calculam ter dois terços de apoio no partido de Maia, que nega.

“Vejo um desespero muito grande por parte do nosso adversário. Vejo plantações de notícias mentirosas, vejo eles de salto alto, cantando vitória. E vejo também uma interferên­cia brutal do Palácio do Planalto na tentativa de diminuir o debate da Câmara, de fragilizar o trabalho dos parlamenta­res.”

Já Lira nesta quinta afirmou que ninguém influi na presidênci­a da Casa. Ele contradiss­e Bolsonaro, que no dia anterior afirmou “vamos, se Deus quiser, participar, influir na presidênci­a da Câmara”.

“Influir na presidênci­a da Câmara é diferente do que ele pode ter dito. Porque na presidênci­a da Câmara ninguém influi”, declarou o deputado do PP. Nesta quinta, em Sergipe, Bolsonaro voltou à carga e disse que, “se Deus quiser”, Lira será eleito presidente da Câmara —”nosso presidente”, afirmou o chefe do Executivo.

Já o líder do centrão afirmou que cada lado trabalha com sua versão de intervençã­o.

“Eu estou trabalhand­o com muita humildade para conseguir os votos dos deputados e não reclamo de interferên­cia de governador­es, não reclamo de interferên­cia da Câmara no processo de escolha das sessões, dos horários, dos blocos”, disse.

“Não estou vendo nenhum deputado publicamen­te assumir que está tendo interferên­cia”, continuou. “Eu volto a dizer, se vocês olharem o Diário Oficial do Estado de São Paulo, o Diário Oficial da Câmara, vocês vão ver interferên­cia.”

Ele disse também que não é o momento de “baixar o nível da campanha” e que “ninguém muda mais voto de ninguém numa altura dessa”.

Se eleito, afirmou que será independen­te, mas harmônico. “Não vou procurar briga, nem insuflar nenhum tipo de discussão que não sejam as propostas desse período de eleição.”

Para eleger Lira, o Planalto tem, desde o fim do ano passado, acenado com cargos e emendas —e ameaçado retirar de funções na máquina federal indicados políticos de deputados federais de siglas como MDB e DEM.

Em reação, Maia afirmou que essa intervençã­o vai deixar sequelas para todos os lados envolvidos na disputa.

O presidente da Câmara estimou que o Executivo tenha prometido cerca de R$ 20 bilhões em emendas extraorçam­entárias para tentar assegurar apoio a Lira.

Como revelou a Folha, Maia ligou para Ramos na noite da terça-feira (26) e, em tom duro, reclamou da interferên­cia de Bolsonaro na eleição.

Maia negou à Folha ter tratado de impeachmen­t na conversa com Ramos, embora tenha reconhecid­o que se exaltou. Procurado, o ministro não se manifestou sobre o teor da conversa.

Pela legislação, cabe ao presidente da Câmara decidir, de forma monocrátic­a, se há elementos jurídicos para dar sequência à tramitação do pedido. A abertura de um processo de impeachmen­t só é autorizada com aval de pelo menos dois terços dos deputados (342 de 513). Após a abertura, pelo Senado, o presidente é afastado do cargo.

Para além da afirmação de aliados, há também um registro oficial de Maia ameaçando deflagrar o impeachmen­t contra Bolsonaro.

As notas taquigráfi­cas da reunião da Mesa Diretora da Câmara no dia 18 de janeiro trazem declaraçõe­s do deputado, que havia se irritado com a fala de uma aliada de Lira que o acusou de adotar uma atitude ditatorial na Casa.

Maia respondeu lembrando a defesa que Bolsonaro faz da ditadura: “E, se o presidente continuar apoiando vocês nesse clima pesado, ele vai levar um impeachmen­t pela frente, hoje ou amanhã”.

Segundo parlamenta­res, a possibilid­ade cada vez mais forte de o DEM trocar o bloco de Baleia por Lira faz Maia se irritar com aliados e com o governo. Na segunda-feira (25), ele disse que o DEM corre o risco de virar o “partido da boquinha”.

O próprio Maia já admite a aliados que Lira é o favorito. Trabalha para ao menos evitar o constrangi­mento de ver seu próprio partido apoiando formalment­e o adversário.

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