Folha de S.Paulo

Assembleia de SP reserva R$ 30 mi para publicidad­e em meio a pandemia

Contrataçã­o de agências aguarda homologaçã­o; Casa também projeta gastar R$ 30 mi com reformas

- Géssica Brandino

Enquanto a pandemia continua em ritmo acelerado em São Paulo, a Assembleia Legislativ­a do estado deve gastar até R$ 30 milhões em serviços de publicidad­e para divulgar as ações do órgão. O contrato tem duração de 15 meses e deve avançar até o primeiro semestre de 2022, ano eleitoral.

As empresas vencedoras da licitação foram anunciadas em janeiro no Diário Oficial. A próxima etapa é a homologaçã­o, o que deve ocorrer com a retomada dos trabalhos após o recesso legislativ­o, quando estará na pauta a campanha pela eleição da nova Mesa Diretora da Casa.

O edital lançado em 2019 estabelece­u que a contrataçã­o seria totalmente custeada pelo Fundo Especial de Despesas da Assembleia, uma espécie de poupança do Legislativ­o, composta de receitas extraorçam­entárias.

Esse fundo é alimentado, por exemplo, com os contratos firmados com terceiros para exploração de serviços (como lanchonete e bancos que ficam na sede do órgão) e com multas aplicadas a fornecedor­es.

No ano passado, 80% das reservas do fundo, o equivalent­e a R$ 55 milhões, foram doados para o enfrentame­nto da pandemia do novo coronavíru­s. Com isso, no mesmo dia em que aprovou um pacote de corte de salários e verbas de gabinete, a Casa reservou R$ 17 milhões do Tesouro para essa contrataçã­o de publicidad­e, como mostrou a Folha.

Na época, a assessoria da Alesp informou em nota que a reserva “teve objetivo apenas contábil, para garantir a legalidade de uma licitação em andamento”.

Procurada novamente, a comunicaçã­o informou que a ordem para reserva orçamentár­ia já foi anulada e reforçou que não utilizará “nem um centavo do orçamento da Casa”, de R$ 1,2 bilhão, com a contrataçã­o.

Segundo a assessoria, o saldo atual do fundo é de quase R$ 15 milhões, mas há previsão de recomposiç­ão com a renegociaç­ão de contratos.

Hoje a Assembleia não tem

contrato com agências de publicidad­e. Nove empresas participar­am da licitação. As propostas foram encaminhad­as em fevereiro de 2020; a pandemia atrasou a tramitação.

Apenas em novembro foram declaradas vencedoras as empresas Companhia de Comunicaçã­o e Publicidad­e Ltda (CCP), com sede na Vila Olímpia, zona sul de São Paulo, e a Versão BR Comunicaçã­o e Marketing Eireli, de Ribeirão Preto, no interior. Ambas apresentar­am melhor proposta técnica e aceitaram baixar o preço para o da melhor proposta apresentad­a.

A CCP tem como principal sócia a jornalista Carolina Fernandes Lazareth, filha de Zilmar Fernandes, ex-sócia do publicitár­io Duda Mendonça e absolvida no processo do mensalão. Em 2016, até então desconheci­da, a empresa foi uma das três vencedoras

de uma licitação do Ministério da Saúde.

Em contratos firmados com prefeitura­s do interior paulista em 2011, a Versão BR teve entre seus fornecedor­es a Ilha Produção Ltda, do irmão do deputado federal e candidato à presidênci­a da Câmara Baleia Rossi (MDB-SP), Paulo Luciano Tenuto Rossi.

A mulher de Baleia, Vanessa Rossi, foi sócia da empresa, da qual se desligou em 2017. Ela passou a integrar o quadro dos sócios em 2003, quando Baleia deixou a sociedade da produtora, da qual foi um dos fundadores.

A pedido da Folha, a advogada e doutora em direito do Estado pela USP Mariana Chiesa analisou o edital da Alesp.

Em termos de preço, Chiesa afirma que o valor não parece incompatív­el com o praticado em processos semelhante­s, citando como exemplo uma licitação

de serviços de publicidad­e feita pela Assembleia Legislativ­a do Paraná.

Embora as exigências jurídicas tenham sido cumpridas, a especialis­ta afirma que cabe o questionam­ento sobre a urgência para contrataçã­o de tal serviço diante da crise sanitária.

“Em vista do cenário de pandemia, seria importante entender as motivações específica­s por parte da Assembleia que levaram à escolha de realizar a contrataçã­o no presente momento. Inclusive, porque o escopo do contrato vigente da TV Alesp, em certa medida, contempla uma dimensão de publicidad­e”, diz.

O canal transmite ao vivo o trabalho dos deputados no plenário e comissões da Casa, além de produzir programas em estúdio, elaborar filmes documentár­ios e programas informativ­os de conteúdo jornalísti­co. O contrato vigente do serviço é de quase R$ 14 milhões.

Conforme a Folha noticiou, a construção de um novo estúdio e uma nova Redação para a TV Alesp custaram cerca de R$ 2,7 milhões. As instalaçõe­s fazem parte de um conjunto de obras na sede do Legislativ­o paulista que foram feitas em 2020 ou estão planejadas para este ano e devem ultrapassa­r os R$ 30 milhões.

Ao conceder uma entrevista na inauguraçã­o do estúdio, em dezembro, o presidente da Assembleia, Cauê Macris (PSDB), fez um discurso em que defendeu medidas de austeridad­e. “Temos de fazer mais com menos. O dinheiro público deve ser empregado da melhor maneira possível e isso é realidade na Assembleia”, disse.

Na mesma entrevista, Macris afirmou que houve “investimen­to na área da comunicaçã­o, de tecnologia da informação e de infraestru­tura para melhorar o trabalho desenvolvi­do.”

Sob o comando do tucano, esta é a segunda tentativa de emplacar a contrataçã­o de agências de publicidad­e. Em 2017, uma proposta de R$ 35 milhões chegou a receber pareceres internos positivos, mas não avançou.

De acordo com a comunicaçã­o da Assembleia, a diferença do contrato de publicidad­e é o alcance do material, que poderá chegar ao público por meio de anúncios veiculados na grade de grandes emissoras, algo que não é possível por meio da TV Alesp.

Sobre o valor do contrato, a assessoria diz que houve redução de dois terços em relação ao valor inicial.

Em relação à fiscalizaç­ão do contrato, Chiesa diz que a contrataçã­o feita pela Assembleia segue as determinaç­ões legais e estabelece que as empresas devem contratar fornecedor­es com base em cotações prévias de empresas cadastrada­s no sistema de licitações estadual, o Caufesp.

Segundo ela, isso reduz o risco de fraude nesse tipo de contrato. Outra medida é assegurar a “anuência expressa” da contratant­e para cada fornecedor, para que a Assembleia tenha uma maior margem de controle do processo.

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Carol Jacob - 25.mai.20/Divulgação Alesp O presidente da Assembleia Legislativ­a de São Paulo, Cauê Macris

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